A intenção nunca fora me matar.

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Blayr/ 31

Chegando na praça avistei Camillie de longe, ela usava um vestido branco que contrastava perfeitamente com sua pele negra e seus cabelos estavam volumosos e cheios, ela parecia uma modelo. Me desprendi dos meninos e abracei minha amiga que estava igualmente animada em me ver.

- Minha deusa, quanto tempo. - Falou minha amiga entre os apertos do abraço.

- Senti tanto sua falta, tentei mandar mensagens mas nem você nem Ayla respondiam.

- Acabamos perdendo nossos celulares na correria do ataque, mas estamos bem agora.

- Onde Ayla está? - Perguntei assim que percebi que Ayla não estava ali, estranhei já que as duas não se separam.

- Está resolvendo algumas coisas, estamos em um apartamento perto do castelo.

- Vou ir ver vocês um dia desses, prometo.

- Se conhecem? - Cris e Théo disseram ao mesmo tempo.

- Ela é minha melhor amiga. - Disse sorrindo e Camillie assentiu.

- Precisamos ir. - Disse Théo meio receoso de interromper nosso reencontro.

- Tudo bem. - Disse me afastando de minha amiga e voltando para perto deles.

"Boa sorte" sibilou minha amiga e abriu o portal, névoa roxa saia dos dedos dela, assim que o círculo tomou tamanho suficiente para nós três passarmos devolvi um "obrigada" sem som e então passamos.

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Saímos alguns passos de distância do castelo, ou o que sobrou dele, as pedras do castelo estavam jogadas pelo terreno, a maior parte do castelo conseguiu resistir, mas o exterior, o jardim onde eu costumava treinar, a sala principal... não tiveram a mesma sorte, era como se tivessem atacado pelo ar, dava para enxergar visivelmente onde eles atacaram com mais intensidade. Assim que cheguei perto e entrei no que sobrou do castelo me senti estranha, era horrível ver o caos instalado ali, sangue manchava as paredes, vasos e enfeites quebrados, espadas e restos de armaduras caídos no chão e um forte cheiro de enxofre pairava no ar, aquilo era puro caos e destruição, dor e sofrimento, tudo impregnado no castelo da minha família, não consegui não me sentir culpada por tudo aquilo, afinal, se eu não fosse fraca o suficiente para fugir e largar meus pais para trás, nada daquilo teria acontecido.

Sou retirada dos meus pensamentos assim que os irmãos se aproximam de mim. - Precisamos achar algo que pertencesse a ela, para estabelecer uma ligação. - Cris diz gentilmente, ele provavelmente sabe que vir aqui depois de tudo está sendo difícil para mim.
Aceno levemente, respiro fundo e digo friamente. - Podemos ir até o quarto dela, pelo que vi lá de fora não fora destruído. - Sem esperar respostas subo as escadas, cruzo um ou dois corredores e lá está, o quarto de Katrina, estava revirado, a cama e o armário completamente destruídos e as paredes também sujas de sangue, não pude deixar de torcer para que não fosse dela.

- É o quarto dela, pode usar qualquer coisa daqui. - Falei ainda sem encarar a situação, tentava não me focar nos detalhes, não queria ver a gravidade daquela tragédia.

Théo fala alguma coisa baixinho com o irmão que na mesma hora sai do quarto de fininho.

- Quer, você sabe, conversar? - Théo diz enquanto eu olhava para o nada.

- Não, obrigada. - Respondo sem olhá-lo.

- Tem certeza?

- Sim, só faça sua mágica aí e me deixe sozinha. - Sei que fui grossa e que ele só tentou ajudar, mas esse era meu mecanismo de defesa, eu sou grossa propositalmente quando estou prestes a ficar vulnerável.

Saí do quarto esbarrando com Cris no caminho - Devia ir atrás de seu irmão, afinal, ele vai precisar de ajuda. - Falei rapidamente antes voltar a andar e sumir em dos milhares de corredores parcialmente demolidos que a pouco mais de um mês atrás eu chamei de lar. Vaguei pelos corredores, queria ir até meu antigo quarto, queria procurar qualquer coisa que eu pudesse levar comigo, que eu pudesse usar para lembrar do grandioso castelo que esse lugar havia sido, o grandioso castelo que eu passara horas observando e que agora tinha se tornado um lugar triste marcado de guerra e destruição. Adentrei o quarto e por mais estranho que pareça, nada estava destruído, nada revirado, nada quebrado, tudo exatamente como eu deixei, mas uma coisa estava diferente, eu me sentia observada, olhada de perto, como se alguém estivesse observando cada passo meu, tentei ignorar, já que podia ser só coisa da minha cabeça e voltei a observar o jardim destruído pela janela. Estava na cara que o objetivo do ataque nunca foi me matar, e sim me levar do jeito menos traumático possível, era visível que evitaram atingir meu quarto, por medo de eu estar ali e acabar ferida, eu quase pude ver os passos, eles atingindo o castelo para causar tumulto enquanto um deles vinha furtivamente até meu quarto para me pegar, mas quando não me achou... aí sim começou a barbare.

Estar dentro do meu antigo quarto era como estar dentro da cabeça de um deles, era como estar no lugar certo, mas na hora errada, foi aí que eu me dei conta que tendo um plano assim tão bem bolado eles não seriam burros o suficiente para deixar o local sem supervisão, supervisão essa que eu estava sentindo desde mais cedo. Corri até o quarto de Katrina e encontrei os meninos ali, com os olhos arregalados olhando um ao outro com olhares cúmplices, mas eu não tinha tempo para reparar em nada, precisava falar com eles.

- Precisamos sair daqui. - Disse exasperada, provavelmente estava com o mesmo semblante assustado que eles.

- O que foi, você está bem? - Perguntou Théo enquanto se levantando e parando na minha frente. - Está ferida, se machucou? - Ele observava meu corpo procurando alguma ferida. Balancei suavemente o rosto em negativa com medo de Théo me achar louca, afinal, eu não tinha prova de nada.

- Então o que foi? - Perguntou Théo num tom de voz casual e íntimo enquanto segurava o meu rosto. Subi minha atenção até seus olhos, e minha deusa que olhos, seria fácil me perder naquela imensidão verde e a proximidade de suas mãos quase fazia meu pulmão falhar, odiei perceber o estado que um simples toque dele me deixava. - Vai me achar louca se eu disser que sinto ele aqui? Vigiando e observando?

Théo me observou por alguns segundos e seus ombros relaxaram um pouco mas suas mãos ainda não saíram do meu rosto. - Nunca te acharia louca, você é filha dele, se alguém pode detectar magia dele, é você, eu e Cris não achamos nada, mas se você está sentindo ele de alguma forma te observando, iremos embora agora mesmo. - Por fim Théo percebeu as próprias mãos e me soltou, recuando um passo visivelmente assustado pela nossa proximidade de segundos atrás.

- Então, já acabaram? - Perguntei assim que meus pulmões voltaram a funcionar e eu consegui respirar com dificuldade. Cris levantou um pouco desnorteado, como se ainda estivesse preso na cena de Théo e eu próximos, provavelmente não parecíamos nos odiar, muito menos só amigos. Puta merda, com certeza não parecia, vou sofrer com as piadinhas de Cris o resto da semana.

- Falamos disso assim que voltarmos, ok? - Assenti para meu amigo e puxei os dois até a saída do castelo, mesmo que eu não tenha certeza se ele está nos vigiando, não ficaria nem um segundo a mais naquele lugar.

- Agora que já estamos aqui fora, pode me dizer o motivo daqueles olhares assustados quando cheguei?

Cris olhou para o irmão, pedindo mentalmente permissão para falar, mas o mais velho negou e olhou para mim por fim.

- Quando eu rastreei sua prima, aconteceu uma coisa estranha. - Meu coração gelou, não pude deixar de pensar nas marcas de sangue respingado no quarto dela. - Eu sei que parece loucura, eu até fiz duas vezes para ter certeza, mas todas as duas deram cem por cento de certeza  que ela está em Izalins.

Fiz uma cara de incredulidade, Théo parecia tão confuso quanto eu e Cris mexia inquietamente nos grossos fios negros de sua cabeça.

- Vamos para casa. - Disse por fim, os olhos menta de Théo se iluminaram mas o cortei com um "não enche" habitual, Cris mandou uma rápida mensagem de texto e logo outro portal de magia roxa brilhante se abriu mais a frente.

A última filha de LilithOnde histórias criam vida. Descubra agora