Uma decisão sem volta

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Blayr/15

Entrei no castelo e atravessei o saguão em passos pesados, tentando parecer mais equibribrada do que eu realmente estava, tenho certeza que na visão dos guardas ali eu perecia majestosa, quando na verdade estava usando tudo de mim para não parecer uma gazela manca. Subi as escadas e segui o corredor até a porta do meu quarto, mas por algum motivo não consegui entrar imediatamente, fiquei presa analisando os detalhes das portas como um todo, em como o branco nela tinha um tom brilhante, em como as maçanetas de cristal refletiam a luz formando pequenos arco-íris no chão e em como os vitrais davam uma visão limpa para a penteadeira, percebi também que algum guarda pode ter me visto muitas vezes transitando só de toalha pelo quarto por eu não ter notado aqueles vitrais durante os meses que estive aqui e ri do fato. Quando realmente consegui entrar no quarto fui diretamente ao banheiro, eu estava toda grudenta e brilhando e me recusava a falar com papai daquele jeito.

Após sair do banho me arrumei e pedi a um dos guardas para avisarem meu pai que eu queria falar com ele urgentemente e em pouco tempo depois a minha entrada foi liberada.

Entrei no escritório e vi meu pai sentado em uma poltrona atrás de pilhas de papelada tão altas que por pouco não lhe cobriam o rosto, ele parecia cansado mas mesmo assim sorriu quando me encarou nos olhos.

- Filha, que surpresa em ve-la aqui.

- Eu estava com saudades pai, o senhor não aparece muito nos jantares e eu mal te vejo durante o dia. - Eu não estava mentindo, realmente tinha sentido falta dele nos últimos dias, e me doía saber que provavelmente eu era um dos motivos para isso.

- Eu... eu tenho estado meio ocupado ultimamente, muitas coisas andam acontecendo no castelo e no reino. -Meu pai deu um riso forçado que só me deu certeza que os "problemas do reino" tinham haver comigo.

- Eu sei pai, sei que eles estão se preparando para vir até mim e por isso você tem estado tão ocupado!

Meu pai empalideceu no instante que terminei a frase, dava para ver o sangue sendo drenado de seus lábios antes rosados e sua pele naturalmente bronzeada num tom chocolate virando acizentada. Ele respirou fundo, passando a mão nos cabelos negros como os meus e disse por fim:

- Não queria que soubesse assim Blayr, eu vou dar um jeito nisso, vou reforçar as patrulhas, ninguém sai ou entra aqui sem antes ser liberado por mim, você está segura minha menininha.

- Pai, eu te amo mais que tudo mas não posso deixar isso nas suas costas, todos sabem que eu estou aqui, eu sou uma bomba relógio para o reino e para vocês. Você sabe que eles não vão sossegar até me encontrar e eu não vou permitir que prejudiquem o nosso povo para conseguir.

Seus olhos amêndoa se encheram de lágrimas mas claramente ele fazia força para impedi-las de escorrer. - O que faremos então filha?

- Eu vou pro terreno vampiro e o senhor vai cuidar de tudo aqui, proteja nossa família pai, se eles pegarem vocês não sou responsável por meus atos.

Meu pai se levantou e me envolveu num abraço forte, o mesmo abraço que ele me dava quando eu era só uma garotinha com medo do escuro, um abraço protetor e singelo que tinha me ensinado o que era afeto.

- Eu sempre soube que você seria uma mulher forte,imponente e decidida, mas nunca achei que se tornaria ela tão rápido, ainda mais se tratando disso.

- Eu vou ficar bem pai, Théo é meu companheiro, não ousaria me fazer mal já que ele sofreria também.

- Espero que esteja certa, não confio nele, então estou aceitando sua decisão confiando totalmente em você, querida.

- Vou ficar bem, prometo. Nos falaremos sempre, isso não é uma despedida.

- Não mesmo, você pretende ir que dia?

- Provavelmente amanhã na parte da tarde.

- Tudo bem, avise sua mãe, ela ficaria magoada se não se despedisse.

Sorri e finalmente nos afastamos, meu pai já tinha se rendido ás lágrimas e eu não estava muito longe disso, ele foi atrás da escrivaninha, procurou algo entre as gavetas e por fim me entregou um papel. E assim foi feito eu acabara de tomar uma decisão perigosa. Caminhei até a porta e saí do escritório sem olhar para trás, não queria correr o risco de mudar de ideia.

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A tarde passou voando e logo o crepúsculo reinou, trazendo os últimos raios de sol do dia e durante esse tempo explorei o castelo, observando e guardando no íntimo da minha memória aquele lugar que em poucos meses eu tinha aprendido a chamar de lar, implorando silenciosamente à qualquer divindade que me ouvisse que protegesse aquele lugar, aquele povo e aquela família.

O jantar chegou e com ele a ansiedade de falar para todos a minha escolha, sentamos todos a mesa nos lugares habituais e quando todos já estavam servidos e o silêncio das bocas cheias reinou eu decidi agir.

- Estou partindo amanhã, para o palácio vampiro, é minha última refeição com vocês por tempo indeterminado. - Disse ainda olhando para o prato diante de mim e me certificando que minha voz saísse firme o suficiente para não ter que repetir.

O burburinho do mastigar parou e me obriguei a erguer o rosto, me deparando com o olhar fulminante de Aziel que se mantinha em guarda na saída de frente para mim. Desviei dos olhos dele para focar a atenção em minha mãe e prima que me olhavam igualmente chocadas.

- Quando ia nos contar? - Protestou minha mãe com raiva nos olhos.

- Neste exato momento, afinal, fui eu quem contei.

- Você não pode ir!

- E foi por esse motivo que decidi falar o mais tarde possível, para não poderem me impedir.

Minha mãe começou a chorar, e aquilo me partiu por dentro. - Não chore por favor mãe, você sabe que é o melhor para todos nós.

- Não estou com raiva, só... só não entendo o motivo.

- Ficar aqui seria oferecer perigo para todos vocês, e para mim mesma também.

Silêncio pairou e minha prima ainda se mantinha quieta, mas dava para ver a compreensão rodeando seu rosto me levantei, disse alto e em bom tom que iria partir por volta das 4 da tarde e olhei novamente para o meu amigo que instantaneamente virou o rosto não deixando dúvida que estava cem por cento contra minha decisão.

Saí da sala de jantar já com o celular na mão, aquela seria a pior parte, eu teria que falar com ele.

Criei coragem e comecei a digitar o número escrito no papel que meu pai me dera, logo uma voz grave estranhamente semelhante a de Théo soou.

- Escritório do rei vampiro, pois não?

- Quero falar com o rei, Theodoro Reed.

- E a senhora é...?

- Meu nome é Blayr Ahmed. Eu sou a parceira dele.

Sem nem mais um segundo a chamada foi transferida e logo a voz irritantemente sexy de Théo soou no outro lado da linha.

- Eu me perguntava quando você ligaria.

- Não tenho tempo para as suas brincadeiras Théo, venha me buscar amanhã a tarde.

- Acho que está me confundindo, você não me dá ordens.

- Veremos.

- Falando desse jeito parece que é você a rainha.

- Não sou rainha, só sou superior a você, sendo você rei ou não!

A risada em escárnio de Théo tomou conta da linha e quando ele parou de rir disparei antes de sua resposta.

- Não me faça esperar Théo. - Protestei e em fim desliguei a chamada.

A última filha de LilithOnde histórias criam vida. Descubra agora