~Somos humanos- 4~

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A casa ficou estranhamente silenciosa nos dias que se seguiram. Os únicos sons que ecoavam pelos corredores eram os dos pratos a serem lavados e das vassouras a varrer o chão. Não havia risos, nem conversas paralelas. O ambiente tornou-se extremamente silencioso e tenso.

"Confiança" era uma palavra riscada do vocabulário do nosso pai. 

Os treinos passaram a ser individuais, com o Helion a assistir. Quando não estávamos a treinar, estávamos a fazer tarefas, porque, segundo ele, se tivéssemos a cabeça ocupada, não pensaríamos em outras coisas.

O que não era verdade, já que a minha cabeça não parou nem por um segundo. Os meus olhos teimavam em virar-se na direção dos meus irmãos enquanto realizava as minhas tarefas, com o objetivo de verificar se eles não estavam chateados; de que não me culpavam por terem a liberdade arrancada sem que realmente tivessem culpa.

A Kim e o Davi foram os mais presentes durante os dias que se seguiram. Acompanhavam-me nas minhas tarefas, sussurrando algum comentário ou fofoca quando eu ficava demasiado calada. Só depois de alguns dias é que percebi que eles estavam a cumprir ordens do Hunter, para não me deixarem desanimar.

Enquanto isso, o meu gémeo, que sempre fora o meu confidente, agora evitava o meu olhar. E a Âmbar, com quem costumava partilhar segredos e sonhos, passava por mim como se fosse invisível. No início, achei que seria melhor, mas agora conseguia ver que o silêncio estava a fazer-me enlouquecer a cada segundo!

Do Lorenzo não tinha noticias há duas semanas. O Hunter achou melhor movê-lo para outra unidade na cidade, onde ele ficaria a receber cuidados médicos, e depois passaria lá mais alguns dias a trabalhar como "soldado", ou seja, a fazer o trabalho sujo do pior que pode haver. O único comentário que ouvi o meu pai fazer acerca desse assunto, é que "talvez não fosse uma má ideia deixá-lo lá por um longo tempo, para ver se ele aprende o seu lugar". Uma parte de mim agradeceu a distância enquanto a outra ficou preocupada... 

Claro Morgan, preocupa-te com aquele traidor! Arr... sou tão estúpida.

-Menina? -O Hunter entrou na cozinha.

Era suposto eu estar a limpar, já que hoje as tarefas de lavar os pratos e o chão tinham caído sobre mim. Só que na verdade, aproveitei o facto de estar sozinha -o que era algo raro- para ficar sentada numa cadeira a observar o jardim enquanto mordisco uma maçã.

-Hoje está uma tarde bonita ... -Murmurei com uma expressão de tédio. 

Eu sabia que o Hunter não iria repreender-me, então não tinha pelo que fingir que já tinha mexido alguma unha desde que ele me entregou a vassoura e decretou que eu poderia começar assim que terminasse de lavar os pratos. No máximo, ele faria um olhar de "devia estar a trabalhar".

-Quer ficar a sós com a visão do jardim? -O seu comentário sarcástico foi uma surpresa, no entanto. Suspirei pronta para ceder, mas ele voltou a surpreender-me. -Deixe, tenho algo para si.

-Mais trabalho? -A minha voz soou mais desesperada do que pretendia.

-Não quer uma missão? -Arregalei os olhos. Com as novas regras, as missões também tinham sido passadas para outros agentes, desse modo prendendo-nos em casa. Tornando este assim um verdadeiro castigo.

-Sério?

-Esta é importante. Além disso, eu e o seu pai concordamos que será uma boa forma de se vingar dos Blossom. -Pisquei os olhos confusa. -Um dos nossos informantes conseguiu descobrir que o Lord das Sombras pretende interceptar o nosso contentor durante o transporte para o porto. Ele planeia substituir as armas por réplicas falsas. Penso que entende os prejuízos de falhar.

Filhos da Máfia- Uma família fora do normal.Onde histórias criam vida. Descubra agora