Capitulo 21: A Torre Vermelha

1.3K 133 3
                                    

A torre vermelha era um local afastado do grande salão e da entrada principal. Não era uma prisão nem uma masmorra.
Era um lugar deslocado e sombrio  cheio de histórias infelizes e macabras. A torre era chamada assim, porque nos tempos do reinado do avô do rei Ozzil, ela era usada para prender e decapitar seus inimigos.
Reza a lenda que ela é chamada assim, por causa da quantidade de sangue que havia naquele lugar.
Os criados mais antigos juravam ouvir vozes e julgavam se tratar das almas penadas dos "sem cabeça" como eram chamados as pessoas que haviam morrido naquele lugar.
Desde os tempos de Ozzil, a Torre Vermelha era usada como um lugar "reservado", um lugar usado para  as pessoas colocarem a "cabeça em ordem", mas sem maltratos.
Mas ser convidada para passar uns dias na torre não era nada bom. Os nobres que moravam no castelo ficaram escandalizados com a atitude do rei de mandar prender a rainha.
Mas estava feito.  O fato era comentado em todas as rodas, desde os duques aos criados. Mas ninguém, ousou comentar sobre o assunto na presença do rei, que parecia um animal selvagem.
Nas primeiras horas da manhã,  Robbyn juntamente com uma comitiva militar levaram a rainha  até a Torre.
Arved os acompanhava levando no alforje, alguns pães assados por Eda.
Sabia que era errado. Que poderia ser castigado por isso. Mas não deixaria a pobre rainha passando por infortúnios naquele lugar mal assombrado.
Beatrice acordou confusa e não compreendeu de imediato o que estava acontecendo.
Primeiramente, pensou que iria a algum lugar destinada a estar sozinha com o rei, ou mesmo um passeio ao ar livre, antes que a nevasca caísse, mas logo depois, quanto mais se afastavam do castelo, ela  começou a entender que estava sendo levada para a Torre Vermelha.
O lugar dos castigados. Seu coração ficou apreensivo.
Assim que chegou, Robbyn  fez uma reverência e timidamente falou:
—Perdão Vossa Majestade. Estou cumprindo ordens do rei.
Beatrice perdeu a cor do rosto. Estava lívida e em sua cabeça só lhe ocorreu, que não ficaria ali sozinha.
Aja o que houvesse, não se importava mais com nada.
-Eu entendo Sir Robbyn, não guardarei  mágoa do milorde. Quanto a você Arved, diga ao rei, que não ficarei aqui sozinha. Peço que traga  Agnes para minha companhia.
Não. Jamais ela ficaria sozinha naquele lugar.
O velho criado não sabia o que fazer. Mas acatou a ordem da rainha e foi imediatamente relatar ao rei o ocorrido.
Ao ouvir o pedido de Beatrice, Cornell sentiu raiva, mas depois, sentiu uma vontade imensa de rir, porém se controlou.
-Ela não desistia! Impertinente!
- Faça o que vossa majestade lhe pediu.
Arved pareceu satisfeito.
Quando chegou ao quarto, encontrou Agnes chorando, mas assim que foi informada que iria para a Torre, imediatamente se alegrou e praticamente correu até lá.
Antes de ir embora, Arved  entregou  os pães embrulhados num guardanapo de linho para  Agnes e  com uma pequena reverência, as trancou pelo lado de fora, deixando uma das chaves com os dois cavaleiros armados que fariam  guarda na porta.
Cabisbaixo, Arved pensava porque as pessoas escolhiam as atitudes mais difíceis para si e para os outros?
...
O burburinho da ida da Rainha para a Torre Vermelha estava causando uma verdadeira comoção no castelo e na vila.
Os nobres que  viviam no castelo, ainda não acreditavam no que estava acontecendo. Aquilo não era um bom presságio. A rainha deveria estar preocupada em gerar um filho para o rei, mas na verdade, estava somente lhe trazendo preocupações e aborrecimentos. Afastar uma rainha de seu cargo e de suas funções de esposa era uma atitude extremamente radical. Quem sabe não seria melhor pedir a separação junto ao papa e se casar com uma rainha mais  dócil e submissa?
...
Heloise estava de saída e Cornell a acompanhou até sua carruagem. Heloise entrou e se acomodou, e antes que suas damas de companhia fizessem o mesmo, ela pegou as mãos do filho e falou:
-Tire-a de lá. Você vai quebrar espírito dela.
Cornell ficou em silêncio.
Não estava disposto discutir suas decisões pessoais próximo a outras pessoas com os ouvidos ávidos por fofocas. Já bastava o que Dragomir havia lhe relatado sobre as conversas e boatos que estavam acontecendo depois do ocorrido.
Cornell fez uma reverência.
-Milady, faça uma boa viagem de retorno e saude meu pai por mim.
Heloise o olhou tristemente.
-Eu te abençoo, meu rei.
...
Ato contínuo, quando o séquito de sua mãe saia, outro esperava na estrada para entrar no pátio do castelo.
Ao ver a bandeira, Cornell ficou profundamente irritado.
Era só o que lhe faltava!
Ursulla!
...
Do alto da torre, Beatrice ouviu  as carruagens partindo levando com elas, a Duquesac Heloise e sua comitiva maravilhosamente culta, alegre e gentil.
Uma tristeza se abateu sobre ela. Gostaria de ter se despedido de todos. Principalmente de Heloise. Ela havia sido tão boa para ela!
Mas isso não iria ficar assim!
Ela precisava ter alguma estratégia para sair dali.
O Rei não cansava de humilha- la publicamente. Esperava do fundo do seu coração que o motivo dela estar ali não fosse de conhecimento geral.
Aquilo era um insulto! Ser  levada a cela de uma torre como castigo  simplesmente porque queria manter uma relação próxima com o próprio marido, foi um verdadeiro exagero da parte dele.
Realmente, os homens eram muito difíceis de serem compreendidos.
Mas a cela não  era de todo desconfortável .
Certamente o rei havia feito algumas alterações no ambiente para poder recebê-la.O lugar estava limpa e possuía  uma pequena  cama e  dependências para se aliviar. Era simples, sem luxo, mas isso não importava a Beatrice.
Tudo o que ela mais queria era sair dali e continuar sua vida como devia ser: a rainha daquele lugar! E não uma prisioneira! Uma refém das atitudes frias e impensadas do seu marido.
Ele a privava da sua liberdade por exigir que ele a tomasse como sua mulher? Ou simplesmente não a queria por perto?
Beatrice se comprometeu  desde a noite anterior, que mudaria completamente o seu jeito de agir.
Seria uma esposa dócil. Não falaria mais nada que o pudesse ofender ou aborrecer. Faria tudo o que esperavam dela. Não era assim que tinha que ser? Então faria do jeito certo.
Enquanto pensava sobre isso, ouviu que um outro séquito de carruagens se aproximava. De longe, ouviu o arauto anunciar as bandeiras: Hakón.
-Céus!
Beatrice gritou.
Agnes que estava distraída arrumando as mantas da cana e correu para junto de Beatrice.
-O que aconteceu vossa majestade? O que ouviu? Uma alma penada?
Beatrice andou de um lado para outro.
-Alguém do reino de Hakón está chegando no castelo.
Agnes  não entendeu.
-Sim, mas qual é o problema vossa majestade?
Beatrice suspirou fundo.
-Deve ser alguém do passado do rei. Alguém do reino da sua esposa morta. Alguém que vai chegar para continuar o pesadelo que ele vive.
Agnes se benzeu.
-Deus nos livre e guarde Vossa majestade. Não quer rezar para que isso não aconteça?
Beatrice continuava prescrutando as paredes tentando ouvir algo, mas não conseguia. As paredes eram grossas e intransponíveis .
Quem seria?
-Majestade, Vamos rezar para que as almas penadas não perturbem nosso sono esta noite.
Beatrice riu.
-Ah Agnes só você para me fazer rir nesse pesadelo que tenho vivido.Gostaria muito de te agradecer por não ter ficado zangada por tê-la convocado para minha companhia.
Agnes sorriu:
-Se não fizesse isso, eu não a perdoaria milady.
De repente , Beatrice teve uma ideia, e Agnes revirou os olhos. Estava pronta para negar o que fosse sair daquela boca real.
-Agnes, você poderia  descer e ver quem chegou? Vá lá e descubra quem é.
Agnes colocou a mão no coração e se abanou como se estivesse com falta de ar.
-Não posso deixar minha rainha sozinha, neste...neste... mausoléu assombrado.
Beatrice a empurrou pelas costas até a porta.
-Pode e vai. descubra tudo e venha me contar.
Agnes se recusava a deixar Beatrice ali.
-Estar aqui com vossa Majestade, não me torna prisioneira também?
Beatrice pensou um pouco.
-Não.
Então Beatrice gritou:
-Sir Robbyn, eu o convoco.
Imediatamente o cavaleiro abriu a porta e fé uma reverência para Beatrice.
-Minha dama de companhia, precisa sair pois está sufocada e quase morrendo. Ela precisa de ar fresco.
Agnes fingiu estar sem ar. Robbyn olhou para as  duas e não sabia que decisão tomar. Vendo a indecisão do cavaleiro, Beatrice continuou.
-Ainda sou a rainha apesar de estar nesse lugar. Minha dama não é prisioneira, é apenas minha companhia. E milorde como um cavaleiro jurou ajudar donzelas em perigo. No caso, Agnes.
Robbyn fez uma reverência para a rainha e deixou Agnes sair.
Beatrice sorriu satisfeita.
Depois que Agnes saiu, ela  sentou-se na pequena cama.
Ela precisava saber quem chegou.
Essa visita poderia melhorar ou piorar dinda mais a sua vida.

...
Quando a carruagem se Ursulla parou, Cornell foi ao seu encontro, caminhando displicentemente.
-Que bons ventos a trazem a Dalibor, Ursulla?
Ela ainda era uma mulher bonita e sedutora. Apesar da idade mantinha uma boa forma e sua elegância era lendária.
Duquesa de Grannus, a mãe de Joanne.
Ursulla fez uma grande reverência e lhe estendeu a mão para que ele as beijasse.
-Vossa Majestade. Gostaria de uma audiência reservada, se for possível.
Cornell assentiu. Não que quisesse falar com Ursulla. Mas precisava saber porque ela estava ali, depois de tantos anos. Entraram e passaram pelo grande salão com Cornell andando alguns passos adiante da mulher.
Ele foi até a sala do trono e sentou -se deixando a duquesa em pé na sua frente.
Não iria facilitar para ela.
Ao invés de parecer desconcertada, Ursulla estava indignada.
Ele iria deixá-la em pé? Como uma simples camponesa, pedindo um favor?
Este homem era terrível e sem educação!
Mas, dissimulada como era, disfarçou a sua indignação com um sorriso.
-Não sei bem por onde começar vossa majestade. -Disse ela com voz calma e sussurrante.
Cornell a olhou cinicamente.
-Talvez do começo, Ursulla. O que a traz aqui?

O REI SEM CORAÇÃO concluído Onde histórias criam vida. Descubra agora