19. Prazer triplo

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Camila Cabello's point of view.

Eu não queria soltar um "como assim?" ou "o quê?", só para ter certeza do que estava ouvindo. Eu entendi, e entendi muito bem, só tinha ficado vagamente surpresa, mas tomo todo o cuidado do mundo para não transparecer nenhuma expressão que a faça desistir de me contar. Que a faça achar que eu pensei algo ruim sobre aquilo, quando na verdade, não pensei.

— Posso perguntar o motivo? – Pergunto, tomando o mesmo cuidado com as palavras. Lauren assente. Seu semblante estava tranquilo, mas o olhar e o leve sorriso triste ainda eram presentes, e estavam me marcando.

— No inicio desse ano eu conheci uma garota, em uma exposição de artes. Ashley estava cobrindo o evento e eu fui para dar apoio moral, e porque ela me convidou – ela começa a contar. – Keana estava apresentando seus quadros nessa exposição, e eu me encantei em um deles sem nem saber que era dela. No fim, fomos apresentadas, e eu já convidei ela para jantar. Passou um mês, Keana e eu já estávamos namorando. No terceiro mês, decidimos morar juntas. Eu não gosto muito de perder tempo, se eu gosto de você, eu vou querer aproveitar para avançarmos as etapas que derem enquanto ainda sentimos essa paixão intensa. Tempo não é um problema pra mim, e como pra ela também não era, fomos morar juntas, no meu apartamento. Eu amava arte. Eu amo, então não via problema de ela transformar minha casa em um grande ateliê para pintar, e ela não via problemas em conviver com meus rascunhos espalhados por todo lugar. A gente se dava super bem, Keana era super legal, a eu dividia praticamente todas as minhas ideias com ela, e ela me dava conselhos e opiniões ótimas. Teve uma época que eu até pensei que iríamos casar – Lauren solta uma risada amarga, que estraçalha mais pedaços de mim. – Enfim, toda a diversão acabou três meses depois, em julho.

Tenho noção de que a parte ruim vai começar, então, abro mão te explorar mais a cicatriz de Lauren para pegar na sua mão. Estava gelada. Muito gelada. Mas ela a aperta, e eu aperto de volta, para demonstrar apoio.

— Keana me traiu – ela revela. – E não digo sobre ela ficar com outra pessoa, porque não aconteceu. Ou não que eu saiba. Ela me traiu por completo. Eu confiava nela cegamente, a amava tanto que chegava a doer só de pensar em perdê-la, mas aconteceu. E doeu bem mais do que eu imaginava. Keana fez o que fez, e saiu fisicamente da minha vida, mas sua presença continuou nas noites que precisei de remédio para dormir, nos dias em que passava sem me alimentar, nas semanas afundada na cama, tendo nojo de até mesmo me olhar no espelho. Continuou e continua em todas as vezes que eu tentei tocar em outro alguém e não consegui. Nas lágrimas... enfim! Alguém que eu confiava simplesmente arrancou minha vida de mim, e deixou só a carcaça ali. Eu fiquei destruída. Tão destruída que tinha certeza que a dor nunca iria passar. E ela não passou, até hoje. A sinto com menos intensidade, as crises que isso me trouxe estão vagamente mais controladas com ajuda de remédios, mas ainda continua aqui, e ela vem com tudo toda vez que assemelho algo a Keana ou ao que aconteceu. Mas bem, teve um dia em específico, durante esses três meses que foram os piores da minha vida, que eu não aguentei mais.

Por um momento, eu me sinto péssima por ter insinuado questões sexuais com ela, porque imagino como ela se sente quando alguém faz isso, mas, ao mesmo tempo, me forço a lembrar que eu não sabia, e que esse é o motivo dessa revelação. Eu saber mais sobre ela.

— Eu estava no meio de uma crise, e eu... – ela para, como se as palavras tivessem morrido antes de chegar na garganta, e desvia o olhar marejado. Sinto vontade de a abraçar, e dizer que ela não precisa falar mais nada, mas Lauren engole as lágrimas e prossegue; – Eu quis testar isso de transformar a dor emocional em física. Eu precisava canalizar aquela dor. Não queria cortar os pulsos, mas na barriga eu poderia fazer um corte grande, e sem um perigo tão grande de morte. Eu fiz, e senti alívio. Foi como se um pouco da minha dor, por mínima que fosse, tivesse escorrido junto com o sangue. Durante um dia todo, eu pude chorar perto de todo mundo, mostrar como eu realmente estava, e jogar a culpa disso naquele corte, afinal, estava "doendo", e todo mundo que me perguntasse o motivo das lágrimas, quando visse o machucado iria entender. Depois disso eu me machuquei outras vezes, mas não tão visíveis assim, e que as cicatrizes já desapareceram. Mas essa aqui, na barriga, foi a porta para as outras dezenas de vezes que tentei me machucar para canalizar a dor, até chegar em um ápice.

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