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Luna Oliveira

O clima estava tenso, afinal, amanhã era o dia da invasão que o Russo tinha marcado, e estávamos sob toque de recolher desde então, ninguém entrava ou saía do morro nesse período.

As festas foram proibidas por enquanto, a cada esquina tinha um olheiro de olho na movimentação, e todos os vapores estavam andando com fuzis na mão, aguardando o pior. Era angustiante ter aquele sentimento, de que algo ruim aconteceria a qualquer momento.

— Você está tão estranha, aconteceu alguma coisa? — Laura perguntou, avaliando-me com os olhos.

Fiquei um pouco desconfortável e me remexi no sofá.

— Não, só estou com... um pouco de medo. — Sussurrei. E era verdade, depois da invasão tudo seria diferente.

— Do quê? Da invasão? — Após pensar um pouco, eu assenti. — Relaxa, o Russo jamais te forçaria a participar.

— Eu não duvido de mais nada vindo do seu primo. — Encolhi o corpo, abraçando minhas pernas. — Quando a gente se decepciona tanto com uma pessoa, vamos parando de criar expectativas em cima dela. Já não sinto mais nada por ele, nem raiva.

— Ele é um cuzão, né? — Laura suspirou desanimada e veio me abraçar de lado, beijando o topo da minha cabeça.

— É... muito. Tentei ver coisas boas nele, mas infelizmente não tem. — Minha irmã estava trancada no quarto, não conseguiu nem levantar da cama para ir à escola. Justo agora que ela estava melhorando e se abrindo mais, o Russo vinha e estragava tudo. — O pior é ele fazer as coisas e depois fingir que nada aconteceu, isso me mata.

— Que pena, Lua, queria tanto que ele ficasse com uma garota incrível como você, seria o ponto de equilíbrio naquela personalidade ruim dele. — Laura me olhou com tristeza.

— Se tem uma coisa que eu aprendi nesse tempo foi que não podemos mudar as pessoas, Laura. Da mesma forma que não consigo enxergar um futuro em nós dois, ainda mais depois de tudo.

— Tudo o quê? — Ela me olhou curiosa.

— Tudo... — Dei de ombros. Nós nunca seríamos capazes de perdoar os erros um do outro, assim como a mágoa entre a gente sempre falaria mais alto.

Me levantei quando bateram na porta de casa. Quando abri, praticamente fui engolida pelo furacão Gabriela, que pulou no meu colo e me abraçou tão forte que alguns dos meus ossos estalaram com a força.

— Eu passei, Luna! — Ela gritou, rindo igual uma maluca. — Eu fui aceita na faculdade!

Fiquei de boca aberta por alguns segundos e quando menos percebi estava contagiada com a sua alegria, gritando e comemorando juntamente com ela. Nós pulamos pela casa inteira, Laura só ria da bobeira de nós duas.

— Eu não acredito que consegui minha bolsa! — Ela falou ofegante e de repente começou a chorar. Puxei-a para um abraço e entendi perfeitamente o seu sentimento. Era tão difícil para uma mulher preta e favelada sair daqui para conseguir uma bolsa de estudos em uma faculdade tão conceituada como a UFRJ.

— Parabéns, Gabi. — Laura veio abraçá-la e eu me afastei ainda com lágrimas nos olhos. Estava tão orgulhosa da minha amiga, ela seria a primeira pessoa da sua família a conseguir um diploma de ensino superior. — Quero dizer... Doutora Gabriela Fernandes! — Brincou, gargalhando.

— Já sabe qual é o seu campus? — Falei ansiosa. Por ser uma bolsa integral, ela não pôde escolher onde estudaria.

— Não, eu só... li o e-mail e corri para cá. Queria que você fosse a primeira pessoa a ficar sabendo, sempre me ajudou muito e me fez estudar. — Ela disse, me olhando de um jeito fofo.

Sombras do Amor [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora