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Luna Oliveira

Russo balbuciou algumas palavras ainda desacordado no sofá, e eu me aproximei dele lentamente, agachando-me ao seu lado para notar como as suas pálpebras se moviam insistentemente, como se estivesse prestes a acordar.

Sequei a lágrima que escorria no canto do meu olho e acariciei o seu rosto macio com a barba recém-feita.

Os tiros já tinham começado lá fora há algum tempo. O rádio dele chiava a todo instante com os vapores chamando, esperando pelas ordens que nunca vinham. Deviam estar perdidos. Perninha, em especial, parecia impaciente em saber onde Russo estava.

— Uh... — Os meus olhos se arregalaram quando o ouvi grunhir baixinho e, logo em seguida, abrir os olhos, ainda meio grogue pela bebida que lhe dei.

— Você está bem? — Perguntei com a voz trêmula e estiquei a mão para tocá-lo no rosto, mas mesmo fraco, Russo me impediu segurando o meu pulso.

— Que... que porra você colocou naquela água? — Russo resmungou e tentou se levantar, mas caiu no chão.

Me apressei para ajudá-lo a se sentar novamente, mesmo com ele contrariado.

— Você me drogou, caralho? — Ele me olhou com raiva.

— O morro está sendo invadido. — Desviei o assunto, pigarreando forte, e caminhei até a janela da sala. Ora ou outra, passava algum moleque correndo.

Russo franziu os olhos e tentou se levantar novamente, mas dessa vez ele conseguiu se manter firme em pé.

Acompanhei-o apreensiva quando ele pegou o radinho no chão e chamou pelo Perninha.

— Coé, porra, até que fim você deu sinal de vida! — Gritou, e no fundo era perceptível o barulho dos tiros sendo disparados. — É o cuzão do Mandela, veio com força máxima para cima de nós.

— Suave, botou a cara aqui agora eu amasso ele. — Russo falou com o olhar distante e pegou a arma em cima da mesa. — Estou descendo aí, fica de olho no movimento.

— Jaé.

Comecei a me desesperar quando vi que ele realmente iria sair, mesmo nitidamente não estando no seu normal. Ele sequer conseguia andar por muito tempo em linha reta, ficava cambaleando e tropeçando nas coisas.

— Fica aqui, você não pode sair desse jeito lá fora. — Segurei o seu braço quando ele ia passando por mim.

— Não sou moleque, porra! — Ele rosnou e se afastou como se eu tivesse a doença mais contagiosa do mundo. — Depois vou querer saber direitinho por que caralho você me drogou, sacou?

— Eu sei, mas por favor, não vai. Não vai, Russo. — Implorei chorando e me agarrei ao seu corpo, sentindo o cheiro do seu perfume. — Ele vai te matar.

— Vai nada, eu que vou matar aquele filho da puta! — Falou rude e me soltou.

Então ele abriu a porta no exato momento em que um relâmpago clareou o céu e saiu pisando duro. Meu peito apertou, e eu quis muito correr atrás dele.

— Russo! — Gritei com a porta da minha casa escancarada e chorei ainda mais quando o vi se afastar ao ponto de sumir das minhas vistas.

Eu sei que o que eu fiz foi errado, agi completamente sem pensar, e acho que acabei estragando tudo. Ele jamais iria querer olhar na minha cara de novo; na verdade, mandaria alguém me matar se ficasse sabendo do que eu acabei fazendo quando estava com raiva dele.

Coloquei a mão no rosto e desabei no chão, chorando desesperadamente.

Pensar que ele poderia morrer hoje me destruía por dentro, nunca quis que isso acontecesse, só queria que ele finalmente pagasse pelo que me fez.

Sombras do Amor [M]Onde histórias criam vida. Descubra agora