Faz um tempão que Rafaella e eu não jantamos assim. Quer dizer, a gente come juntas o tempo todo.
Almoços sem dia definido quando estamos livres, tacos às quintas-feiras com os amigos lá em casa, waffles aos domingos, já que é a única coisa que sei fazer.
Mas hoje é diferente.
Toalha de linho na mesa, uma visão belíssima da cidade, velas e champanhe. Claro. Por brevíssimos segundos, quando conversamos à mesa sobre quais entradas pedir, entro em pânico. Porque é como um encontro. E não só na aparência. Na sensação também.
Esqueço isso quase de imediato, porque encontros em geral envolvem mãos suadas, conversas forçadas e aquele estresse de não saber se vai ter algum outro programa depois. Mas nada disso tem a ver com Rafaella.
É só um jantar com sua melhor amiga , meu cérebro me acalma. Relaxa.
E, na maior parte do tempo, minha mente fica calma, a não ser por uma coisinha irritante que não sai da minha cabeça:
Rafaella pretende ligar para a garota do karaokê.Eu falei pra ela fazer isso. E precisava falar.
Fui sincera quando disse que ela precisava superar Bruna. Apesar de Rafaella não estar deprê, eu a conheço. Sei que ela não pode estar recuperada como finge que está. Não depois de tomar um pé na bunda do nada daquela imbecil. Mas me incomoda que esteja pensando em outras garotas enquanto ainda estamos… mandando ver.Quer dizer, não me incomoda. Incomoda meu ego. Porque, do meu lado da cama, e do chuveiro, e do sofá, e do balcão da cozinha, as coisas estão sensacionais. Tão sensacionais, na verdade, que nem olhei para nenhuma garota desde aquela primeira noite.
Opa.
Eu me recosto na cadeira ao me dar conta disso, ignorando o interrogatório a que Rafaella está submetendo a garçonete sobre o preparo do prato do dia, um peixe.
Faz duas semanas que só transo com uma garota. E não uma garota qualquer: Rafaella.
Humm.
Eu sei, eu sei, duas semanas nem é tanto tempo assim. Mas pra mim é. O último relacionamento que tive foi no segundo ano de faculdade e durou quatro meses infernais. Desde então estou feliz no time das solteiras.
É claro que transei com algumas garotas mais de uma vez, mas em geral vivo num esquema “uma noite e nada mais”.
Passo a mão no rosto e olho para Rafaella do outro lado da mesa. Ela está usando um vestido grosso azul-marinho que não deveria parecer sexy, já que tem gola alta e não revela quase nada — muito menos com as botas que vão até os joelhos —, mas o caimento é perfeito. Com os cabelos soltos, caindo nos ombros. Ela está bem… bonita. E essas velas idiotas acesas…
Mal espero a garçonete terminar o que está dizendo para perguntar: “Que uísque você tem aí?”.
Rafaella me lança um olhar intrigado, porque só bebo cerveja e vinho quando estou com ela. “Vou deixar a champanhe toda pra você.”
Só que não é essa a verdadeira razão para eu querer uísque. Preciso de algo mais forte que espumante para me ajudar a lidar com o fato de que estou no meio de uma enrascada sexual. Só que a sensação não é de enrascada, de forma nenhuma.
A garçonete se afasta e Rafaella se inclina para a frente. “Tudo bem? Parece que você está prestes a vomitar.”
Eu me inclino para a frente também, decidindo ser sincera com ela, porque Rafaella é minha melhor amiga e merece isso.
“Quando você inventou essa ideia de sermos amigas que transam, quanto tempo pensou que ia durar?”, pergunto.
Ela pisca algumas vezes. “Humm, sei lá. Na verdade não fiz um cronograma.”
Respiro bem fundo. “Percebeu que já faz quase duas semanas? Estamos transando há duas semanas .”
“Ah, é? E daí?”, ela pergunta, franzindo o nariz.
“Eu nunca…” Começo a esfregar a nuca. É melhor falar de uma vez. “Não fiquei com mais ninguém desde aquela primeira noite.”
Rafaella fica em silêncio por vários segundos, então cai na risada. “Ai, meu Deus. Você precisava ver a cara que fez agora.”
Abro um sorriso ressentido. “Não tem graça.” Mas sei que tem. Um pouco.
“Desculpa.” Ela tenta ficar séria, mas não consegue e dá uma risadinha dentro da taça. “Pensei que a gente já tivesse resolvido isso. Se uma de nós quiser dormir com outra pessoa, é só falar e…”
“Pois é”, eu me apresso em dizer. “Tipo você e a garota do bar…”
“Bárbara”, ela diz.
Cerro os punhos sob a mesa.
“Então você vai ligar pra essa Bárbara, e não vai ser esquisito se eu sair com outra garota?”
“De jeito nenhum.”
“Tá.”
“Tá”, ela repete.
“Tá.”
A garçonete volta com a carta de bebidas. Meus olhos continuam cravados em Rafaella. A mulher é esperta o bastante para saber que está interrompendo alguma coisa e se manda sem dizer nada.
“Ai, Deus”, Rafaella diz, com um toque de pânico na voz. “A coisa está ficando esquisita, né?”
Não. Sem chance que vou deixar isso acontecer.
“O que a gente vai fazer é o seguinte”, digo, abrindo a carta. “Amanhã é sexta. Você vai ligar pra essa Bárbara. E eu vou voltar à caça.”
“Não fala assim. É esquisito.”
Ignoro e sigo em frente. “Você vai transar com ela. E eu vou encontrar uma gostosa.”
Fecho a carta de bebidas depois de ver que eles têm minha marca favorita de uísque e volto a olhar para Rafaella. “Que tal?”
“Tá”, ela diz, com um sorrisinho. “A gente não quer se meter em confusão.”
“Exatamente”, respondo, sorrindo. “E não quero arruinar o sexo pra você pra sempre. Já que nunca vai conseguir encontrar alguém à altura e tal.”
Ela aponta para mim com a taça. “Não sei de onde você tirou que essa presunção toda é atraente…”
Eu me inclino para ela. “Não é?”
Minha voz sai mais áspera do que eu gostaria, e os olhos de Rafaella ficam meio opacos.
Ela lambe os lábios. “Esse lance de transar com outras pessoas… começa amanhã?”
“Isso”, respondo, olhando para a boca dela.
“E isso significa o fim pra gente. Dessa coisa de ir pra cama juntas, digo.”
Ignoro a pontada de decepção que me atinge ao ouvir essas palavras. É a coisa certa a fazer. Terminar logo antes que tudo fique… enrolado.
“E isso significa que hoje à noite”, ela continua, “você e eu… podemos ter uma última vez?”
Ela se interrompe e levanta as sobrancelhas em uma expressão questionadora. Sorrio.
“Com certeza.”🌺
Cês tão ouvindo? O barulho da merda vindo? 🥴
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Apenas amigas?
Fiksi PenggemarSerá que vale a pena arriscar uma grande amizade em troca de um amor inesquecível? Aos vinte e dois anos, a jovem Rafaella Kalimann leva a vida que sempre sonhou. Tem uma namorada inteligente e responsável, um emprego promissor e a companhia de sua...