Rafaella

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Bruna “escondeu” a aliança na gaveta de calcinhas. Quer dizer, sem contar o clichê da coisa, ela não é capaz de levar em conta nem que quem lava as roupas sou eu? E não só lavo, mas seco e guardo. Claro que eu ia encontrar a maldita aliança. Mas no fim não faz diferença. Não faz diferença se Bruna estava torcendo para eu encontrar a aliança, no que seria a proposta de casamento menos romântica de todos os tempos, ou se ela é apenas distraída. No fim, a caixinha vermelha foi o alerta de que eu precisava. Não só de que não posso casar com Bruna, porque disso já sei há um tempão. Mas a caixinha me fez perceber uma coisa ainda mais perturbadora: Estou usando Bruna.

Deito ao seu lado todas as noites, tentando me lembrar de como era ser apaixonada por ela,  quando na verdade cada pensamento e cada sonho meu envolvem outra pessoa.
É claro que não revelo essa última parte quando termino tudo com ela. Só peço para se sentar comigo quando chega em casa do trabalho e com toda a tranquilidade e gentileza digo que as coisas não estão dando certo.

A ironia da situação fica bem clara. Não era minha intenção, mas dei um pé na bunda dela no mesmo local em que levei um alguns meses antes. E sou obrigada a reconhecer que ela lida com a rejeição com muito mais dignidade que eu. Nem ao menos parece surpresa. Como a conheço muito bem — quase tanto quanto conheço
Bianca —, estreito os olhos.

“Bruna.”

Ela ergue os olhos.

“Você    não    parece    exatamente    arrasada”,    digo    com    um    sorriso    leve.    “Em    especial considerando que encontrei uma certa aliança na gaveta da sua cômoda…”

Ela solta um grunhido e se inclina até encostar a testa no balcão da cozinha.

“Sou uma idiota.”

“Porque ia me pedir em casamento quando acabamos de voltar? Sem nem ter transado ainda?”

Ela bufa. “Eu sei. Ia devolver a aliança. É que…”

Apoio o cotovelo na mesa e o queixo na mão.

“É que…”

“Eu pensei que comprando a aliança… me comprometendo com você, ia conseguir esquecer…”

Ajeito minha postura na hora.

“Ai, meu Deus. Você ainda é a fim da tal Laurel.”

“Não!” Ela senta direito. “Não, eu… Sei lá. Faz tempo que a gente não se vê, mas ainda penso nela. Fico me perguntando…”

Então eu sorrio, ainda que seja um sorriso agridoce, e fico de pé. Me inclino para a frente e dou um beijo na testa dela.

“Você deveria conversar com Laurel.”

“Ela tem namorada.”

Dou de ombros. “Mesmo assim. Acho que nós duas sabemos que é possível namorar uma pessoa pensando em outra.”

Ela me olha com cuidado.

“Bianca?”

Engulo em seco. E assinto.

Bruna solta o ar com força.

“Eu sabia. Aquela música no karaokê… foi pra ela,  não foi?”

Meus olhos se enchem de lágrimas quando lembro. O mais estranho é que foi ontem à noite. Parece que tive uma vida inteira para pensar a respeito. Não consigo parar de pensar no que senti despejando meu coração e minha alma ao cantar aquela música linda, de cortar o coração. Ainda estou sob o impacto da agonia de ter contado a Bianca como me sinto sem que ela soubesse que eu estava fazendo isso. Meu coração acelera quando penso a respeito. E se Bianca sabe? Se Bruna percebeu, por que não ela? Ai, Deus. E se foi por isso que ela foi embora do nada ontem à noite? Todo mundo achou que tivesse conhecido alguma garota no bar, uma hipótese que me irritou, mas essa outra é ainda pior. E se Bianca percebeu o que eu estava tentando fazer e deu no pé?

Bruna fica de pé e me acompanha até a porta. Pego a mala que deixei perto da porta para este momento, quando deixaria a garota com quem um dia pensei que fosse casar.

“Tchau, Bruna.”

Ela se inclina para a frente e me dá um beijo no rosto.

“Tchau, Rafaella.”

E, de repente, está tudo acabado. Acabou, e tudo bem por mim. Talvez não “bem”. Porque tem um buraco enorme no meu peito, o qual não está relacionado com a garota com quem acabei de terminar.

A melhor escolha seria ir para a casa dos meus pais. Ou de Manu. Ou de Marcela. Ou até um hotel. Preciso pensar a respeito. Bolar um plano.

Entro no carro e vou até meus pais. Chegando lá, não consigo sair. Dou a partida de novo. Faço o caminho de volta, mas não pra casa de Bruna. Vou pra minha casa.

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Será que finalmente vem aí?

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