10/10
Oito meses depois.
“Ah, já sei”, digo, apontando toda animada para o catálogo do karaokê. “A gente pode cantar essa da Disney.”
Bianca me olha com uma expressão enojada.
“Pode. E eu posso me enforcar com o fio do microfone…”
“Bom, então escolhe você uma música”, respondo, impaciente.
“Que tal relaxar um pouco?”, ela diz, folheando as trilhares de páginas do catálogo. “Tem, tipo, quatro pessoas na nossa frente ainda.”
“Não se a gente furar a fila.”
“Isso só funciona com você e Marcela, e se envolver um bando de tarados. Considerando que Marcela está com a língua na garganta da Mari, duvido que esteja interessada em cantar.”
“Nem acredito que ela vai casar no domingo”, comento, olhando para o local onde minha amiga está se agarrando com sua futura esposa.
Isso mesmo. Marcela vai casar com uma garota que conheceu há menos de um ano. Sou madrinha, assim como a irmã dela e, acredite se quiser, Flay.
A garota continua superesquisita, mas passou a ser uma das nossas companhias prediletas agora que a ensinamos a não dizer tudo o que passa por sua cabeça.
“Que tal essa?”, Bianca sugere, me cutucando.
Olho para o papel. “Hã, não. Aliás, para evitar problemas futuros, todas as vezes que você sugerir uma versão em dueto de ‘Baby Got Back’ vou dizer não. A resposta era não quando éramos só amigas, continuou sendo quando viramos amigas coloridas, e agora que…” Eu me interrompo, e ela ergue as sobrancelhas.
“Agora que o quê? Que somos amantes?”
Entorto o nariz pra ela.
“Eu ia dizer ‘namoradas’, mas parece inadequado, né?”
Ela me abraça e me puxa para junto de si. Solto um suspiro de alegria, porque sempre penso que não tenho como estar mais apaixonada, mas a cada dia que passa meu amor cresce, a ponto de perder o fôlego.
“Que tal ‘melhores amigas… apaixonadas’?”, ela diz.
Dou um beijo nela, toda feliz.
“Ridícula.”
“Aliás, isso incomoda você?”, ela pergunta, pensativa. “Passamos anos e anos dizendo que o mundo inteiro estava errado sobre pessoas que podem se relacionar amorosamente serem amigas, só pra descobrir que no fim estávamos erradas.”
“Incomoda você ?”, devolvo a pergunta.
Ela passa os lábios pelo meu pescoço, ignorando que estamos em um bar com karaokê lotado.
“Nem um pouco. Nunca fiquei mais feliz por estar errada.”
O beijo acaba sendo mais quente do que o pretendido, e um casal atrás de nós pigarreia alto.
“A gente queria ver o catálogo também”, o cara diz, incomodado.
Bianca o entrega sem desgrudar da minha boca. Quando enfim paramos para tomar fôlego, na fila do palco, meus olhos percorrem o salão. Localizo meus pais, que não só estão fazendo vistas grossas para Marcela e a namorada, que estão se agarrando na frente deles, como aproveitam para namorar um pouco também.
“Mal posso esperar pra ver minha mãe no palco”, comento.
“Acho que nunca a ouvi cantar. Ela é boa que nem você?”
“Não, é péssima. Totalmente desafinada. Mas é uma das coisas na lista dela, então…”
A mão de Bianca pousa nas minhas costas, suave, reconfortante, e deixo seu calor aliviar um pouco da tristeza. Minha mãe conseguiu passar pela barreira dos seis meses, o que é um bom sinal. Mas ainda está doente. E muito. O câncer continua devorando seu corpo por dentro.
Estamos experimentando novos tratamentos. Mais agressivos. E ela vai melhorar. Tenho certeza disso.“Não acredito que me fez sair à noite num dia de semana”, Bianca comenta com um bocejo.
“Ai, desculpa, vovó.”
Dou mais um beijo em seu rosto, porque estou orgulhosa dela. Bianca foi aceita em vários programas de pós-graduação em Seattle e em Portland. E escolheu um daqui. Onde é seu lugar.
“Ei, vai falar com aquelas garotas”, murmuro. “Vê se consegue passar a gente na frente.”
“Pode deixar.”
Ela se afasta, e volta em tempo recorde.
“Pronto. É nossa vez.”
“Muito bem”, digo, impressionada. “E nenhuma delas me olhou feio quando você apontou.”
“Por que elas olhariam feio pra você?”, ela pergunta, se fazendo de inocente.
Eu a encaro. “Você não falou que eu era só sua amiga, né? O que foi que disse sobre mim?”
“Só falei a verdade.”
Bianca estende a mão para me ajudar a subir no palco, então me abraça.
“Ah, é?”, pergunto. “E qual é a verdade?”
Ela me dá um beijo tão doce como sua resposta:
“Eu disse que você é minha melhor amiga.”
Dois anos depois.
🌺
E chegamos ao fim dessa história que apesar de ter seus pontos tristes, eu amei ler, amei trazer pro mundinho Rabia e amei compartilhar com vocês.
Até breve? Talvez.
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Apenas amigas?
FanfictionSerá que vale a pena arriscar uma grande amizade em troca de um amor inesquecível? Aos vinte e dois anos, a jovem Rafaella Kalimann leva a vida que sempre sonhou. Tem uma namorada inteligente e responsável, um emprego promissor e a companhia de sua...