Bianca

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7/10

Um mês depois.

Rafaella e eu estamos de volta ao normal.

Ela ainda está morando com Bruna, claro, então não dividimos mais a mesma casa. Mas de resto está tudo como antes de começarmos a transar.

As brincadeiras, as risadas, a conversa fácil.
As caronas. Ela vem me pegar toda manhã em seu carro hippie, me traz de volta no fim da tarde, e assunto nunca falta.

Como antes.

Os Kalimann me convidaram para passar o Natal com eles, e fiquei tentada a ir.
Principalmente considerando a situação de Genilda. Mas, no fim, acabei indo visitar minha família no Michigan. Foi meu primeiro Natal lá desde que me formei.
E foi importante. Um recomeço, não apenas para diminuir minha dependência de Rafaella e sua família, mas também para me reaproximar da minha família.

Acho que fiz alguns avanços. Durante as festas, fiz um esforço para me colocar de igual para igual em relação aos meus irmãos — fazer todos entenderem que, só porque decidi escolher outro caminho, não significa que não possa ser bem-sucedido.
Minha mãe ainda não conseguiu aceitar por inteiro minha decisão de não me tornar advogada apesar de “todo o sacrifício” que ela fez, mas consegui um belo avanço com meu pai e minha madrasta. O suficiente para ficar ansiosa pela visita que eles ficaram de me fazer em fevereiro.

Considerando tudo, minha vida está boa como não ficava fazia tempo — deixando de lado, claro, o fato nada irrelevante de que tenho sentimentos muito, muito complicados por minha melhor amiga. Sentimentos que me devoram quando estou sozinha à noite, quando a solidão e a escuridão me imploram para que confesse para ela o que sinto.

Mas, quando nos vemos no dia seguinte e ela conta uma história engraçada sobre ter sujado até o teto de vitamina em uma tentativa de fazer o café da manhã para Bruna, lembro a mim mesma que, se gosto mesmo dela — e gosto, mais do que tudo —, preciso permitir que seja feliz. E a felicidade dela é Bruna.

O que me leva à notícia que estou prestes a dar…

Rafaella já está acomodada no assento do motorista, digitando no celular, quando entro no carro depois do trabalho.

“Ei, que tal um karaokê hoje à noite?”, ela pergunta quando me acomodo no banco.

“Claro”, respondo, afivelando o cinto de segurança. “Quem vai?”

“Eu, você e Bruna, claro…”

Claro .

“E Marcela, com a namorada e a irmã. Ah, e uma garota do trabalho, Flay.” Enrugo a testa.

“Pensei que a gente detestasse Flay.”

Rafaella levanta um dedo. “A gente detestava Flay. Agora a gente só acha que Flay precisa de amigos.”

“Entendi. Bom, Flay está com sorte, porque eu sou uma ótima amiga.”

“Com certeza”, Rafaella concorda. “A não ser quando…”

Ponho a mão em sua boca para fazer com que fique quieta, então deixo os folhetos que estavam na minha mão em seu colo.
Rafaella olha para baixo.

“O que é tudo isso?”

“É uma brincadeira nova de que ouvi falar”, respondo. “Acho que chamam de ‘leia’.”

Ela me ignora, folheando tudo e logo percebendo do que se trata. Rafaella levanta os olhos.

“Pós em administração.”

Dou de ombros. “Decidi que está na hora de aceitar o fato de que adoro meu trabalho, e estou a fim de um desafio. Achei que poderia ser, tipo, minha volta por cima, já que levei a faculdade muito nas coxas. Quero me destacar agora.”

Apenas amigas?Onde histórias criam vida. Descubra agora