Bianca

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Os pais de Rafaella adoram passar o fim de semana no litoral do Oregon. Fazem isso algumas vezes por ano desde que Rafaella era pequena. Sempre alugam a mesma casa, fazem os mesmos programas, comem nos mesmos restaurantes. É meio que um evento da família Kalimann. Já fui junto algumas vezes, mas na época da faculdade. Como aconteceu com os jantares, eu meio que fui me afastando quando as coisas entre Bruna e Rafaella ficaram sérias. Mas agora, quando Rafaella me pergunta se quero ir com eles passar o fim de semana fora depois de nossa tentativa fracassada de fazer sexo com outras pessoas, aproveito a chance sem pensar duas vezes.  Principalmente porque estou louca para sair um pouco de Portland.

As coisas no trabalho estão uma loucura depois da promoção. Ando meio cansada dos bares daqui, e às vezes nem sei como preencher o tempo livre. Estou sentindo certa inquietação, uma espécie de mudança no horizonte, e não sei muito bem como lidar com isso. Preciso de um tempo.

“Então… Bianca.”

A mãe de Rafaella pega uma cenoura da tábua e dá uma mordida. Fui designada para cortar os legumes. Ela se apoia no balcão da cozinha e fica me observando.
Continuo cortando a cenoura em rodelas caprichadas sem nem olhar para ela, torcendo para que não me pergunte quais são minhas intenções com sua filha.

Rafaella disse que não contou para os pais sobre nossas aventuras sexuais, mas Sandra sempre me pareceu o tipo de mãe que sabe de tudo.

“Ouvi dizer que lhe devo os parabéns”, ela comenta.

A faca estremece na minha mão. Não pode estar falando sobre…

“Pela promoção”, Sandra continua, pegando outra cenoura.

Ah. Isso. “Obrigada.”

Ela dá risada. “Ah, qual é? Pelo jeito como você fala, parece que é um castigo.” Encolho os ombros.

“É que… não é nada de mais.”

“Bom, Rafaella parece achar muito importante. Ficou falando a respeito por quase meia hora quando ligou.”

Olho pela janela para onde Rafaella e o pai dela estão preparando o churrasco. O inverno está chegando, de modo que o tempo está frio e nublado. Rafaella está linda com meu moletom cinza da faculdade, que fica enorme nela, as mangas ultrapassando seus dedos em vários centímetros, o capuz vestido. (n/a: só em fic mesmo viu? KKKK)

“Seus pais devem estar muito felizes”, continua a sra. Kalimann. Olho para a tábua e pego um pepino. “Bianca…” A voz dela tem aquele tom de advertência maternal. “Você contou pros seus pais, não?”

“Na verdade, não”, murmuro.

“Por quê? Pais adoram receber esse tipo de notícia.”

Pais como você, talvez. E não é que meus pais não gostem de receber boas notícias dos filhos; só que não acho que a mudança do cargo de gerente de produto para gerente de produto sênior faça algum sentido para eles, muito menos que seja motivo para me parabenizar. Não quando meu irmão acabou de virar sócio de um escritório de advocacia importante e minha irmã anunciou que vai fazer um ph.D. em Yale agora que conseguiu seu diploma de direito em Harvard.

A sra. Kalimann parece sentir que não quero falar sobre meus pais — ou minha promoção — e muda de assunto. Fico grata.

“Como ela está?”

“Quem, Rafaella?”, pergunto.

Ela revira os olhos, bem-humorada. “Quem mais?”

Corta. Corta. Corta . Fatio o pepino com todo o cuidado. “Por que está perguntando pra mim?”

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