Por fim, surge o repórter, com toda sua eloquência, de quem é nascido e criado no Polo Norte.
Fazendo uma força sobre humana para demonstrar com ares de quem está muito à vontade, sem bater os dentes ou gaguejar, distribuindo comprimentos – como candidato em pré-campanha, tentando um casamento cognitivo no mínimo irônico para não dizer bizarro – de bom dia, saídos do forno, para os âncoras na bancada e a toda a audiência – difícil dizer quantos se atreveram a tocar no controle remoto – por um instante pensei que diria o meu nome.
"Tivemos, bem como acertadamente disse a previsão do tempo, as menores temperaturas já registradas na madrugada neste período do ano, mínimas de -100∘".
Vá lá, não foi bem isso que o repórter disse, mas era o que eu entendi e sentia. – Continuou – "estamos aqui para mostrar este grande centro de acolhimento, é um espaço preparado carinhosamente para todas as pessoas que precisam de um lugar quente para fugir, para escapar, para se proteger de noites tão frias como esta que tivemos, este é um albergue coletivo, para abrigar pessoas que estejam em situação de rua, mendigos... moradores de rua, mendigos e também para moradores de rua e mendigos".
É certo que ele como repórter, tenha um repertório bem mais amplo em seu vocabulário, e poderia ter usado de outros substantivos para abarcar mais pessoas, mas estas duas palavras, era tudo o que eu ouvia; "mendigos e moradores de rua".
Opas! Mas espere, creio que deixei escapar algo. Me diga você - 'o sociólogo assistencialista de ideias' -; o que seria, o que viria a ser um albergue coletivo? E isto sim, fora dito em alto e bom som pelo repórter.
Depois desta afirmação não conseguia ouvir nada mais que palavras repetidas. Então saí para encarar a água fria do banheiro. Ao chegar lá e olhar para a manopla que já me olhava com um sorriso parvo, insinuante: "vem, vem! " Flertando com os meus medos, como se dissesse: "tem certeza disso? " Tudo o que eu tinha naquele momento eram dúvidas!
Que diabos seria um albergue coletivo?
Criei coragem e levei a mão na manopla, que rangeu um riso desdenhoso. – "Bem que te avisei" – Vomitando um filete de cristal, que mais parecia um punhal penetrando a epiderme, apelei para o chuveiro, que mesmo manhoso fez sua parte.
Mas afinal, o que raios é um albergue coletivo?
Joguei a mochila nas costas e como em um dia de verão, às 6:30 tomei meu caminho rumo ao meu passa tempo, logo veio a primeira voz de muitas e do mesmo, – "Caramba que frio é esse né" – Não saberia dizer se era pergunta, afirmação, desabafo, disse e se foi com o vento. Acabando com minha coragem e roubando meu espírito. "É..." – Respondi – após ouvir aquilo meu corpo se deu conta, tomei consciência de como era um erro ter saído da cama.
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Palavras Para Distrair a Insônia
Non-FictionEste pequeno cacifo, agora aberto e ofertado a vocês caros leitores, que peço, fiquem a vontade para tomá-lo como desejar. Conta com uma série de composições, "estórias", rabiscadas em guardanapos, no velho pardo papel de pão, algumas vezes em meu e...