Um Olhar Diferente* ⒅

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(Aquieta minh'alma)

Esta história, aos moldes de nossa atual economia, fala, por assim dizer, sobre o estilo de vida de uma família, que poderíamos dizer de classe média baixa. Se bem que, a linha entre uma coisa e outra, baixa, média, alta, tornou-se tão tênue, que sinceramente, acho difícil afirmar o que seja, classe "a, b ou c". Creio que seja mais visível graficamente e de mais fácil entendimento, se afirmarmos coisas do tipo, rico e pobres, milionários e o resto. Ou se apenas afirmasse, se tratar de uma família mediana. Na dúvida, peça uma média, afinal, quem nunca.

O caso é que, necessariamente, não nos interessa o status-quo financeiro da família por questões apenas econômicas. Mas, para que se perceba, que socialmente, os modos e maneiras, atitudes e educação, eram de uma família, consciente. Residiam em um bom bairro - seja lá o que isto signifique - ou seja aquilo que você considere ser um bom bairro.

Gente havia de todo o tipo, e eles, a minoria, bastante pios. Levavam uma vida, que não seja lá de se invejar, mas desejada.

Era constituída - encabeçada - por um progenitor probo, homem fiel, proprietário de um pequeno negócio herdado, o qual fazia grande gosto, manter em essência igual como lhe foi passado, salve algumas pequenas mudanças, uma melhoria na iluminação, uma pequena adega com alguns bons vinhos, cuja a taça não fosse abaixo de 15$ e ultrapasse os 50$, e uma cafeteira, com capacidade de passar mais que dois cafés por vez, e agora em vez de um, haviam mais dois jogos de mesa e cadeiras, para duas pessoas cada, e claro, um notebook que permite cadastrar os clientes no excel e reproduzir música pelo ambiente. E talvez, a maior das mudanças, seja ter se deixado convencer, por amigos, clientes e principalmente por sua esposa, dedicar toda uma parede a editoras, títulos e autores novos.

Um negócio de família de mais de oito décadas, onde só trabalha gente da família. Mesmo com os altos e baixos da economia, por sua notória e já reconhecida reputação, era bastante e bem frequentado o lugar - e quando digo "bem", quero dizer "bons, verdadeiros e apaixonados consumidores" - lhes dando uma boa renda, permitindo o luxo de serem ditos consumidores ou capitalistas. O seu desejo era simples, manter-se à frente do negócio, até que um dia, os filhos tomassem gosto, assim como ele ou quem sabe, da mesma forma que fora feito a ele, transferir para o primogênito. - e esta talvez fosse, sua maior questão existencial.

A matriarca, esposa, mãe e dona de casa, parecia ter todos estes predicados como um dom, fazendo destes títulos todos uma profissão. Sempre feliz em meio aos afazeres, cantarolando uma canção que a conduzia às nostalgias da juventude e eternos sonhos de debutantes. Mas, sem jamais perder o foco, tinha os pés sempre firmes no chão. Era sem sombras de dúvida, a esposa desejada, mais que isso, amada, admirada e respeitada, pelo esposo e por todos da família.

Ao contrário do que alguns querem crer, ela andava ao lado do marido, junto com o esposo. Nunca discutiam, se desentendiam ou brigavam, no máximo, divergiam, para depois chegar a um senso comum, bom para ambos, para todos da família.

As obrigações, preocupações, funções, alegrias e prazeres, da boa vida, tanto do lar quanto da próspera empresa de família, era dividida por ambos. Também havia um casal de filhos.

Ambos, indiscutivelmente bem-criados, tiveram as mesmas oportunidades e de igual forma aproveitaram, absorveram o que lhes foi ofertado.

Estudos, educação, conselhos.

Yangel, um rapagão, feições harmoniosas, bem feito de corpo, voz empostada, de uma educação sem igual, lembrava para um bom referencial, alguns dos meninos do rock, dos anos áureos, das décadas de 70, 80. Com apenas 16 anos, ou melhor, no auge deles, parecia ter o mundo aos seus pés, e isto parecia não o preocupar, já que tinha uma base familiar tão sólida, que parecia nada poderia abalar. Estava prestes a finalizar os estudos fundamentais, pretendia ingressar no estudo superior, mas não tinha pressa e tão pouco medo do futuro e o que esperar, já que tinha total ciência das intenções de seu pai, sabia que não tinha que se preocupar com carreira ou mesmo sair em busca do alto sustento.

Tudo isso, sem qualquer drama ou perda de identidade, para todos, era natural que seguisse nos negócios da família.

Como já dito, estas coisas todas eram diariamente, de forma leve e tranquila, conversadas na mesa, entre uma refeição e outra - tudo mesmo - e como todos ou alguns, Yangel, tem o seu lado humano e suas dores e cicatrizes. Mas, as dele, por assim dizer, foram atenuadas, por muito amor, mesmo por vezes o levando a ficar, por curto tempo, um pouco pensativo, sobre sua vida, mas exatamente de como se deu o seu nascimento. Yangel, é sobrinho de sangue de seus pais, que o adotaram logo após o nascimento, logo após sua mãe genitora, irmã de sua mãe adotiva, ter morrido no parto. E mesmo sendo o assunto de grande pesar, graças aos seus "pais adotivos" e a base familiar estabelecida ao seu redor, a vida segue, com paz e tranquilidade.

Também, havia a Yiana, alguns poderiam pensar ser a caçula da família, mas ela tinha a mesma idade de Yangel. As igualdades ou coincidências não paravam por aí entre eles, nascidos no mesmo dia, é possível dizer, afirmar que tenham nascido na mesma hora, suas mães irmãs, conviveram todo o ciclo pré-natal juntas, os planos e sonhos eram os mesmos para ambas, nem ao menos quiseram saber o sexo antes do nascimento.

Certamente algo genético, Yiana em nada se diferenciava de Yangel, uma moça belíssima, educada, assim como seu irmão, tinha todos os valores, aprendizados e conhecimentos. Yiana, também estava prestes a se formar, no seu íntimo tinha desejos de seguir carreira, e se dedicar à pequena empresa da família de forma diferente, era o seu desejo ter exposto nas prateleiras da loja do seu pai o seu trabalho e assim ser uma fornecedora e não uma revendedora. Desejo que seus pais não se opunham, muito pelo contrário, apoiavam, pois sabiam, ela tinha talento.




foto: @Donaceminha


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