Capítulo 20

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(AGORA)

Desligo o carro e ponho o banco para trás, esticando a perna sobre o volante. A única luz acesa dentro de casa é a da cozinha. É quase meia-noite. Com certeza, Patrick está dormindo porque trabalha amanhã.

Essa manhã, quando acordei, esperava ver Patrick ainda do lado de fora do quarto, batendo à porta, implorando perdão. Fiquei irritada por ele ter saído para trabalhar. Nosso casamento está desmoronando, ele confessou ter outra mulher, me enfiei em nosso quarto a noite toda... mas ele acordou, se vestiu e seguiu para o trabalho.

Ele deve trabalhar com julie. Provavelmente, quis avisá-la de que eu sabia de tudo, caso eu perca a linha e apareça no escritório para arrebentar a cara dela.

Eu não faria isso. Não estou zangada com Julie. Não é ela que tem um compromisso comigo. Ela não me deve lealdade, ou eu a ela. Estou irritada com a única pessoa que se encaixa nessa descrição, e essa pessoa é meu marido.
A cortina da sala de estar se mexe. Considero me abaixar, mas sei, por experiência própria, como a entrada da garagem fica visível de nossa sala. Patrick consegue me ver, então não vale a pena me esconder. A porta da frente se abre.

Ele sai de casa e começa a caminhar em direção ao carro.
Está vestindo o pijama de frio que lhe dei no Natal do ano passado. Nos pés, usa meias de pares diferentes. Uma preta, outra branca. Sempre achei que aquele era um traço contraditório de sua personalidade. Ele é muito organizado e previsível em várias coisas, mas, por alguma razão, nunca se importa se suas meias combinam.

Para Patrick, meias são uma necessidade prática, não uma questão de moda.
Olho para fora da janela conforme ele abre a porta do lado do passageiro e entra no carro. Quando fecha a porta, parece sugar todo o meu ar. Sinto um aperto no peito, e meus pulmões se comportam como se alguém os tivesse perfurado com uma faca. Abaixo o vidro para poder respirar.

Ele tem um cheiro bom. Odeio que, não importa o quanto tenha magoado meu coração, o restante de mim jamais recebe o memorando de que deve rejeitá-lo. Se um cientista descobrisse uma forma de alinhar coração e cérebro, não haveria tanta agonia no mundo.

Espero que comece com as desculpas. As justificativas. Possivelmente, até mesmo a culpa. Ele toma fôlego.

— Por que nunca compramos um cachorro?.

Patrick está sentado no banco de passageiro, o corpo meio virado para mim e a cabeça apoiada no encosto. Me encara com bastante seriedade, apesar da pergunta inacreditável que acaba de deixar seus lábios. O cabelo está úmido, como se tivesse saído do chuveiro agora. Os olhos estão vermelhos. Não sei se pela noite maldormida ou porque esteve chorando, mas tudo o que quer saber é por que nunca tivemos um cachorro?

— Você está de brincadeira comigo, Patrick?—

— Sinto muito — desculpa-se ele, balançando a cabeça. — Foi só um pensamento que me ocorreu. Não sabia se havia um motivo.

Seu primeiro Sinto muito desde que admitiu estar tendo um caso, e é uma desculpa sem relação à própria infidelidade. Não é de seu feitio. Ter um caso não é de seu feitio. Sinto como se não conhecesse o homem sentado ao meu lado.

— Quem é você agora? O que fez com meu marido?—

Ele olha para a frente e se reclina no assento, cobrindo os olhos com o braço.

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