Lena
Lena sentia um aperto terrível no peito e uma grande vontade chorar. Tinha criado coragem para ir até ali conversar com a mulher a sua frente, porém não tinha pensado no que dizer ou como começar a abordar o assunto que queria. Só fez o que sua mente e coração disseram que era o certo, mas agora já não tinha mais certeza.
Olhando a loira, percebeu sua cara de confusão. Além disso, ela parecia não estar gostando nada de sua presença, era como se pressentisse qual seria o assunto que seria abordado. Isso seria possível? Se perguntou.
Segundos depois, se deu conta que elas estavam se olhando demais e nada estava sendo dito.
— E-eu esqueci de me apresentar, sou Lena Luthor — estendeu sua mão.
— Eu sei quem você é.
— Sabe? — franziu o cenho.
— Sim. Eu e mais da metade da nação. Se duvidar, mais da metade do mundo. Como não reconhecer um membro da família Luthor se eles estão com seus rostos estampados em toda parte?
— Ah!
Não tinha pensado que seria reconhecida tão rapidamente. Por mais que prezasse a discrição, era inevitável não ter sua foto em algum canto.
— Sou Kara — apertou a mão da morena rapidamente. — O que eu teria pra conversar com você? Sei que sua família gosta de desapropriar terras pra criar grandes coisas no lugar, mas não sabia que você tratava disso pessoalmente. Eu nem se quer sabia que pensavam fazer algo assim nessa região. E já vou deixando bem claro: eu não vou sair da minha casa. Não me interessa o quanto queira me pagar. Se essa é a conversa que queria ter comigo, já acabamos por aqui.
Estava perceptível o desconforto da loira. Ela mantinha a expressão séria, os braços cruzados e um tom de voz nada agradável.
Mesmo sem o assunto principal ter começado, a tensão que havia entre as duas era quase palpável.
— Não estou aqui pra isso. E a Luthor-Corp não faz mais esse tipo de coisa.
— Se está dizendo... — deu ombros. — No que posso te ajudar então? Você chega aqui na minha porta, diz que quer conversar comigo, mas até agora não me disse o que é. Não faço ideia do que você possa querer conversar comigo.
— Me desculpe aparecer do nada e te causar essa confusão — coçou a sobrancelha direita. — É que não existe um jeito fácil de te dizer o que eu preciso dizer. Não sei como começar a falar, na verdade.
— Começa pelo começo.
Deveria falar o que queria falar no meio daquela varanda? Ou seria melhor marcar um encontro, voltar outro dia ou se dar um tempo para pensar melhor? O que deveria fazer agora que estava ali?
Brincando com os próprios dedos tentando se livrar do nervosismo que irradiava seu corpo, abaixou o olhar por alguns segundos. Estava prestes a desistir de fazer o que foi fazer, seria mais prudente pensar numa abordagem melhor e menos confusa. Mas então as palavras que estava a sufocando, simplesmente escaparam de sua boca.
— Eu sou mãe da sua filha — murmurou.
— O que?!
— Eu sou a mãe biológica da sua filha — repetiu. — É sobre isso que eu tenho que conversar com você. É por isso que estou aqui. Eu preciso conversar com você sobre ela.
— Você não é mãe da minha filha — aumentou um pouco o tom de voz se sentindo irritada e amedrontada. — A única mãe que ela tem sou eu.
— Ela nasceu de mim.
— Não me interessa de quem ela nasceu, se foi de você ou de qualquer outra pessoa. Ela é minha filha. Só minha.
— Por favor, só me escuta.
— Não — sacudiu a cabeça negando. — Não vou te escutar.
— É importante falarmos sobre isso. Eu quero conhecer a minha filha, é por isso que estou aqui.
Suas palavras estavam sendo faladas rapidamente e saiam trêmulas por causa de seu nervosismo. Nunca esteve tão nervosa quanto estava.
— Não fala que ela é sua filha — disse entre os dentes.
— Ela é! Se não fosse, eu não estaria aqui tentando conversar com você — também aumentou o tom de voz. — Nós podemos...
— Sai daqui! — esbravejou aprontando em direção a rua. — Sai daqui e não se atreva a voltar.
— Nós precisamos falar sobre ela. Eu sou a mãe biológica dela. Eu quero saber sobre a minha filha. Eu quero recuperar o tempo perdido.
— Não há tempo nenhum pra você recuperar. Nada sobre a minha filha te interessa. Pensasse em conversar sobre ela ou querer conhecê-la antes de deixá-la jogada na porta dos outros. Como você pode? — olhou Lena com indignação e certo nojo. — Como pode fazer isso com aquele bebê que tinha acabado de chegar ao mundo? Um bebê que não fazia ideia de nada, que tudo o que precisava era de alguém para cuidá-lo. Entregar um filho para adoção é um direito legal, eu jamais julgaria uma mulher por fazer isso, mas largá-lo na porta de alguém sem nem saber se a pessoa é boa ou ruim, ou se ele iria sobreviver por ter sido deixado a míngua, é revoltante. Eu a crio desde que a achei jogada nesse quintal como se fosse um animal. Eu venho cuidando dela desde a que a peguei nos braços porque a amei assim que a vi e não fui capaz de deixá-la. Qualquer uma que chegue aqui, assim como você está fazendo, e diga que é mãe dela, é uma mentirosa, pois a mãe dela sou eu. Somente eu.
— Me deixa falar o que aconteceu — pediu com os olhos já marejados. — Eu só quero conversar com você para resolvermos isso.
— Não! Não quero ouvir nada que venha de você — deu mais um passo pra frente ficando bem próxima de Lena. — Sai daqui e não ouse mais voltar. Eu sei que você tem dinheiro pra contratar quantos advogados quiser e tentar tirá-la de mim. Mas saiba que pela a minha filha, minha e não sua, eu vou até o inferno se for preciso. Você não sabe o que eu sou capaz de fazer pra ela continuar do meu lado.
— Você também não sabe do que sou capaz pra ter ela comigo — falou logo em seguida se arrependendo.
— Você nunca vai chegar perto dela, Luthor. Eu não vou deixar que isso aconteça. Pega de volta o caminho por onde você veio e some. Esquece a minha filha, pois ela nunca vai saber quem é você.
Kara ia se afastar, mas segurou seu braço para impedi-la. O olhar que recebeu foi quase mortal. Por causa do desespero que já dominava cada célula de seu corpo, estava agindo e falando por completo impulso. Aquela situação saiu do controle assim que tocou a campainha daquela casa. Ainda assim, não estava arrependida por sua tentativa de ser ouvida.
Só queria ter a chance de ser ouvida.
— Senhorita Danvers — a soltou. — Kara, nós não precisamos fazer as coisas desse jeito. Vamos conversar, por favor. Eu tenho muito a dizer.
— Guarda as suas palavras só pra você. Espero não ter o desprazer de te encontrar nunca mais. Passar bem, Luthor.
Sentindo os olhos azuis cheios de raiva em cima de si, viu a loira abrir a porta e entrar. Iria fazer mais uma tentativa de falar com ela, mas antes disso, a porta foi fechada com força em sua cara.
Com um nó na garganta e querendo muito chorar, encarou a porta por mais alguns instantes na esperança de que Kara retornasse para poder ouvi-la. Nada disso aconteceu.
Quando acordou de manhã, tinha olhado mais uma vez o conteúdo do envelope com algumas poucas informações sobre Kara e sua filha que Lex a havia entregue. Juntamente com essas informações, tinha uma única foto de Lara brincando num parquinho. A noite inteira encarou aquela foto se perguntando quantas vezes tinha perdido o sorriso alegre da filha enquanto ela brincava. Foi por causa dessa foto que criou coragem para aparecer na casa de Kara Danvers sem mais e nem menos. Só não imaginava que as coisas aconteceriam daquela forma. Na verdade, não imaginou bem as consequências de seus atos, apenas agiu.
Após uma lágrima descer por seu rosto, teve certeza que estava na hora de ir embora. Não iria adiantar nada ficar parada naquela varanda esperando a loira voltar. Ela não voltaria. Para a sua infelicidade, não fazia — ainda — ideia de como tentar uma nova aproximação. Talvez o melhor fosse deixar alguns dias passarem e então tentar conversar com ela novamente.
Um pouco despedaçada por dentro, caminhou até seu carro. Assim que entrou, não conseguiu conter as lágrimas que vieram como uma enxurrada devastadora. Apenas duas vezes na vida chorou tão desesperadamente e as duas vezes tinham a ver com a sua garotinha.
Era até difícil de acreditar que sua filha esteve bem na sua frente. Ela era uma menina linda e, aparentemente, cheia de saúde e obediente. Foi até chocante vê-la tão de perto e saber como ela realmente era, pois antes só podia contar com a sua mente para criar a imagem de uma menina de cinco anos.
Durante várias noites que passou em claro, criou cenários sobre esse reencontro. Ficava imaginando o que faria quando a visse, o que falaria, como se sentiria quando pudesse pegá-la em seus braços e dizer o quanto sonhou com aquele momento e quanto a amava. Nada. Nada do que imaginou um dia aconteceu, tudo de bom que pensou aconteceu ao contrário.
A expectativa era mesmo uma grande filha da puta. Criou tantas e agora estava devastada.
Depois das palavras de Kara que a atingiram como uma faca em seu peito, não sabia se tão cedo iria poder abraçar a pequena criança ou, até mesmo, se um dia ela saberia de sua existência, mas tudo o que queria era estar junto de sua filha. Queria fazer parte da sua vida, saber tudo sobre ela, a conhecer como uma mãe conhece um filho. Queria ser a mãe de Lori, quer dizer, de Lara.
Uma coisa ela e Kara tinham em comum em relação à Lara, seriam capazes de qualquer coisa pela menina. Por isso não desistiria de tentar falar com a loira. Não desistiria da sua filha mesmo que ouvisse coisas que a doesse como as que tinha acabado de ouvir. Agora que tinha encontrado Lara, ela era a sua prioridade e não importava o que teria que aguentar para tê-la em sua vida.
Secando as lágrimas, suspirou pesadamente enquanto ligava o carro para ir embora. Seu dia estava completamente acabado.
Ao saber que sua filha vivia em Wrigthsville Beach, ao invés de se hospedar em Seagate, alugou de última hora um quarto em uma pousada perto da praia. Desse modo, ficaria também mais perto da casa de Kara.
Mesmo que decidisse comprar o hospital e resolvesse tudo que tivesse que resolver em poucos dias, continuaria na cidade. Não iria embora até ser ouvida por Kara Danvers.
Chegando na pousada, se encaminhou para seu quarto se jogando na cama. Logo a imagem de Lara invadiu seus pensamentos e foi inevitável não sorrir. Era a criança mais linda que já tinha visto em toda a sua vida.
Encarando o teto, vários pensamentos rodavam sua mente. Todos tinham a ver com Kara e Lara. Quando se deu conta, estava pedindo aos céus que em algum momento a loira aceitasse ter uma conversa com ela e que após essa conversa as coisas mudassem entre as duas.
Imergida no turbilhão de emoções que invadiam seu coração, se assustou com o toque de seu celular que estava na mesinha de cabeceira. Tinha decidido tão de última hora ir no endereço que o detetive que Lex contratou havia passado, que só levou seus óculos escuros e as chaves do carro.
Bufando, pegou o celular e atendeu ao perceber que ele continuaria tocando incansavelmente.
— Alô?
— Keke! Graças a Deus você atendeu. Estou te ligando faz tempo. Você não avisou a mim ou a mamãe que havia chegado, não nos disse nada. Estamos preocupados.
— Eu estou bem, Lex — fungou. Queria voltar a chorar. — Diga a mamãe que estou bem.
— Sua voz me diz outra coisa. O que aconteceu? Você saiu ontem daqui de casa feliz, porque agora está com essa voz de choro?
— Eu vi a minha filha, Lex. Eu a vi e ela me viu.
— Como foi esse encontro? — perguntou animado.
— Horrível — limpou uma lágrima solitária. — A mãe dela, a Kara Danvers, não quis conversar comigo e me disse coisas horríveis.
— Eu sinto muito, Lena. Mas essa situação não deve ser fácil pra ela também. Na hora do nervosismo, a gente fala coisas horríveis.
— Eu a entendo. Eu sei que não deve ter sido fácil ela ouvir o que ouviu. Mas a situação também não é fácil pra mim da posição em que estou. Na verdade, a minha posição é bem horrível há anos. Eu só queria que ela me ouvisse e me entendesse, não que me julgasse como me julgou e gritasse comigo. Eu só queria poder abraçar minha filha assim que visse, mesmo que ela não soubesse que sou a mãe dela.
— O que você pretende fazer depois disso tudo?
— Não sei. Não sei como me aproximar, não só da Lara, mas também da mãe dela. Principalmente da mãe dela — pensou um pouco. — Tudo o que sei é que não posso parar de tentar falar com a Kara. Eu vim atrás da minha felicidade, só saio daqui quando eu tiver certeza que a consegui.
— Você precisa que eu vá para aí ficar com você? Não gosto de saber que você está numa cidade desconhecida e passando por essa situação sozinha. Não gosto de te ver chorando e nem te ouvir chorando através do telefone. Ao menos eu estando aí, podemos tentar achar uma solução.
Deu um pequeno sorriso com o comentário do irmão. — Você já fez muito só por tê-la achado. Toda vez que eu estava perdendo as esperanças, você me fazia acreditar que eu a encontraria. Agora que a encontrei graças a vice, eu tenho que fazer isso sozinha. Preciso fazer isso sozinha.
— Eu estou orgulhoso de você, mas você sabe que não precisa lidar com isso sozinha. Não precisa ser assim, Keke.
— Eu sei — se sentou na cama soltando com força o ar dos pulmões. — Mas isso eu preciso lidar. Eu tenho que mostrar pra minha filha que a quero do meu lado e só eu posso fazer isso. Eu só preciso pensar melhor no que fazer. Hoje eu agi por impulso, fui movida pela emoção e nem meu lado racional se opôs a essa impulsividade. Eu só cuspi em cima dela o que eu queria e deu no que deu. Eu preciso encontrar uma maneira de falar com Kara Danvers sem ela me olhar com ódio ou despejar sua raiva em cima de mim.
— Dê alguns dias à ela. Talvez ela pense melhor sobre a conversa, ou melhor, a discussão que tiveram, e te dê a chance de falar o que você realmente quer.
— Eu estou contando com isso e é o que me resta a fazer.
— Você vai ficar bem?
— Vou. Eu só... Está sendo muita coisa pra processar em vinte e quatro horas, sabe? Estou feliz por tê-la visto e triste pelas coisas serem complicadas.
— Sei. Apenas se lembre que sempre estarei aqui para o que você precisar.
— Eu sei.
— Agora me diga como é a minha sobrinha. Aposto que ela puxou a beleza do tio dela.
Por uma hora inteira, Lena falou sobre cada coisa que reparou em Lara durante os poucos instantes que pode olhá-la. Ela contava tudo com extrema animação, saudosismo e com o coração repleto de amor pela pequenina. Tudo o que mais queria era poder mostrar a ela esse amor.
Quando terminou de falar com Lex, não conseguiu fazer outra coisa se não pensar em seus próximos passos. Seria cuidadosa, mas venceria Kara Danvers pelo cansaço.
******
Às nove da manhã de segunda-feira, Lena entrava pela porta da frente do Hospital Geral de Seagate. Em mãos, tinha uma caderneta para anotações e uma pasta com informações sobre todo o hospital.
Enquanto andava em direção ao balcão de informações, várias pessoas a olhavam e cochichavam, mas não se importou nenhum pouco com isso, estava ali com um propósito e iria dar o seu melhor. Mesmo que não costumasse fazer o que iria fazer, estava tentando ouvir o que Lex a disse. Ela era capaz e não iria deixar o fantasma de Lionel Luthor sussurrar em seu ouvido dizendo que não.
Com passos firmes, seus saltos batiam contra o piso anunciando a sua chegada. Por mais que estivesse consumida pelo nervosismo e ainda estivesse com resquícios da mistura de sentimentos do dia anterior, tentava manter a expressão neutra. Tinha que ser profissional e não queria demonstrar insegurança, embora estivesse bastante insegura.
— Bom dia! — desejou a uma moça que estava no balcão de informações.
— Bom dia! Em que posso ajudar?
— Eu tenho hora marcada com a diretora Grant. Gostaria de saber onde fica a sala dela.
— Ah, claro! Senhorita Luthor, não é? — perguntou, mas já sabia quem ela era.
— Isso mesmo.
— Ela me disse que você procuraria por ela — deu um sorriso gentil. — Pra chegar na sala dela é só seguir pelo corredor direito. Ao final dele, fica os elevadores. A sala da diretora Grant fica no quinto andar. Assim que sair do elevador, é só seguir a esquerda.
— Muito obrigada.
Como o indicado, seguiu pelo corredor direito. Enquanto caminhava, aproveitava para observar tudo e fazer algumas notas mentais.
Pelo que estava vendo, a estrutura hospital era bem do jeito que sua pesquisas indicavam. Era limpo e organizado. Quando encontrasse a diretora Grant e ela apresentasse o hospital, teria que confirmar se essa organização seguia para todos os setores e entre todos os funcionários.
Quase no fim do corredor, deu uma olhada em seu celular para verificar que horas eram. Não queria se atrasar para aquele encontro importante. Bem nesse momento, foi puxada pelo braço para dentro de uma sala mal iluminada. O puxão quase a fez derrubar sua caderneta, pasta e celular.
Iria brigar com quem tinha feito aquilo com ela, mas ao olhar o culpado, ou melhor, culpada, sentiu seu corpo estremecer.
— Eu disse pra você sumir, Luthor.
Muito próxima de si, Kara ainda segurava seu braço — não com força — a olhava com a mesma raiva do dia anterior e mantinha os lábios em uma linha reta demonstrando seu desgosto por sua presença.
A última coisa que esperava era reencontrar a mãe da sua filha tão rápido. Podia ser apenas uma coincidência, mas quando varreu seus olhos pela loira, percebeu que ela usava um jaleco.
Ótimo! Isso significava que se esbarrariam com frequência dentro daquele hospital.
******Quando pensei nessa história, não pensava em fazer muito mistério sobre Lara ser filha da Lena. A história é sobre como Lena e Kara vão lidar essa situação. E já deixo avisado que será um slow burn.
De todo jeito, espero que continuem lendo.
:)
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Come A Little Closer
Fanfiction[Concluída] Kara Danvers é uma médica que leva uma vida bastante sossegada numa cidade litorânea na Carolina do Norte. Sua vida começa a mudar quando ela encontra um bebê abandonado na sua porta. Um tempo depois, uma nova reviravolta acontece quando...