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15 de Novembro de 2010.

                                         

Pela primeira vez em três anos Louis se via livre daquele maldito reformatório onde sentiu o pior lado de todos que estavam a sua volta - vendo como de fato a vida funcionava - foram noites de tortura, fome, surras até entender que não havia como sair sem ser afetado ou aquele lugar te destruía ou você se adaptava a ele. Não havia espaço para ser fraco, todo o terror que havia passado ali serviria de algo, mas mesmo com tudo isso para se ocupar mentalmente ainda via sua mente vagando para o lugar que de fato lhe assombrava, para as pessoas daquela cidade e ainda se pegava pensando - no que elas diriam dele agora.

Tomlinson havia sido uma criança revoltada, crescido sem seus pais, sentia no sangue a perseguição por causa de sua classe e de como o julgamento estava fardado a persegui-lo, tendo que se virar sozinho muito jovem na sociedade, sem ajuda, descobriu por consequência que uma das principais leis da vida era - "Você nunca chegará ao fundo do poço, sempre há como cair mais." - então com o tempo parou de se importar com o que diriam ou diziam dele, estava na hora de sair da sua bolha que por mais tenebrosa que fosse ainda era o único lugar que conhecia como casa, a única visão possível que tinha de um lar e mesmo todos ali o colocando contra mundos era sua única perspectiva do que era ter uma família.

Desta vez estava determinado a deixar tudo que viveu no passado, deixar aquela cidade, aquelas pessoas e isso não seria a coisa mais absurda que faria pois sabia que de fato nunca teve nada, não era sua casa, não eram suas pessoas, nada era real, tudo era como estar em uma grande caixa de papel. Estava ali fardado a ser o que era e o que o fizeram ser. Agora tinha uma vida livre estava liberto de qualquer amarra que um dia já puseram-o e mesmo com um nome já marcado e uma alma manchado poderia sair por aí fazendo tudo que quisesse, não precisaria mais se submeter ao destino que haviam escolhido para si, estava na hora de sair para ver o mar e as coisas que via na televisão então suspirando fundo e tomando coragem para ir - de escolha própria, escolheu a solidão.

Pegando apenas sua mochila com algumas trocas de roupa e um dinheiro que conseguiu vendendo o que lhe restava saiu com rumo à rodoviária, esperava comprar uma passagem para qualquer lugar e que fosse uma sem volta. Caminhava com fome por ruas frias e escuras com um visual claramente barato; usava uma camisa preta cuja a estampa do Aerosmith se encontrava desbotada ao ponto de ser quase inexistente, bermudas gastas e o cabelo com um corte desacertado não muito longo nem curto suas pontas eram de tamanhos diferentes devido ao corte estranho que fazia em si mesmo com qualquer tesoura que encontrasse pela frente. Também tinha um boné vermelho cobrindo a cabeça este tinha o símbolo da nike em uma cor esverdeada, já nos pés uma havaiana branca encardida. Facilmente seria confundido com um morador de rua, e agora - de fato era.

— Me vê uma pra.. Salvador! - Disse apesar de sua péssima situação animado em ter sobrevivido três anos preso naquele inferno e agora via finalmente que aguardava a impressão do que seria sua passagem de saída daquele lugar. — Aqui. - Respondeu a moça lhe entregando seu passe para a liberdade.

Pegando a passagem sem de fato acreditar, olhou para os arredores vendo uma máquina de café expresso, colocou-se a contar suas últimas moedas e pegou um café puro indo se sentar em um banco qualquer perto de seu vagão.

Não haviam muitas coisas para se fazer de interessante, mas uma coisa faria o tempo passar, observar. Tinha para si que parar para ver cada vida se passando ao seu redor trazia um sentimento de não ser único - não somos protagonistas de nenhuma história, estamos condenados a vivenciar um pouco de todas as outras - foi quando observou um pouco ao seu lado uma grávida que carregava um menino no colo, estava com o semblante triste e parecia não ter muito dinheiro, parecia ter sido largada daquele jeito, seria facilmente uma mãe solteira, ela estava na vala para ir para São Paulo. Ja do outro lado conseguia ver crianças correndo com pacotes de pipoca, já haviam discutido milhares de vezes sobre quem seria o herói ou o vilão da brincadeira, comiam e se divertiam ao mesmo tempo que para elas nada importava de verdade não deveriam saber se quer que estavam indo para Belo Horizonte.

Seu ônibus demoraria no mínimo 5 horas para chegar, por isso resolveu gastar seu resto de tempo vendo a televisão no canal local que falava em como o ministro iria ajudar a todos a sair daquela situação de pobreza com promessas tentadoras, mas no fim enganosas.

— Babaquice, são todos bandidos. - Louis franziu a testa sem saber de onde surgia aquela voz até ver um senhor se aproximar — Pois é meu filho, tudo vendido, bandido, carniças. - O jovem sorriu confuso na tentativa de não parecer mal educado.

— Quanto ódio, o que eles fizeram? - Indagou o menor ja imaginando o tipo de palestra que viria. — Você é jovem, um dia vai perceber e aí vai sentir o mesmo que eu. - Louis cerrou os olhos observando as vestes do velho ao seu lado que estava com um palito marrom e cheirava a mato fresco deduziu que seria um boiadeiro ou coisa do gênero quando viu seu chapéu em sua mão. — Vai para onde? - Perguntou o jovem.

Olhando para sua própria passagem o velho deu um sorriso leve antes de responder;
— Estou indo pra Brasília, nesse país lugar melhor não há, eu tô indo visitar o meu filho.

E foi onde a conversa misteriosamente morreu, Louis fez perguntas sobre o filho do senhor e tentou continuar o assunto, mas o homem simplesmente não o respondia, apenas deitou a cabeça e começou a roncar bem ao seu lado.

— Velho louco eu em se fudê.

E agora o que restava era esperar amanhecer para partir. Embora suas tentativas de pegar no sono serem todas falhas, não conseguia mesmo com todo esforço, mesmo imaginando uma história em sua cabeça era incapaz de vencer a ansiedade e foi graças a ela - ou não - que por sorte daquele velho cujo o rapaz não devia nada, viu que o ônibus para Brasília iria partir.

— O vovô acorda bora, você vai perder a viagem. - O senhor ao acordar afobado com os tapinhas em sua cara olhou para o rapaz. — Meu Deus obrigado, vá no meu lugar. - disse se levantando com certa dificuldade e com sonolência. — Que? Tá doidão? Monta logo no ônibus ou o senhor vai ficar aqui. - Mas o velho insistiu. — Sobe no ônibus, vá ver o meu filho por mim eu fico aqui no seu lugar. - Louis já estava perdendo a paciência não fazia o menor sentido, então colocou a mão no ombro do homem e disse com mais firmeza que da última vez. — Sobe nesse ônibus. Agora.

Embora estivesse esperando a reação correta e que o senhor de idade fosse até lá e embarcasse de uma vez cedendo a pressão l, não foi o que recebeu quando foi pego de surpresa sentindo seu corpo sair do chão como luva e ser arremessado para dentro do ônibus como se fosse uma criança birrenta sendo mandada para a escola.

— Abre está porra, o senhor tá louco, eu nem sei quem é a merda do seu filho. - dizia o menor gritando a todo custo, todos ali eram capazes de sentir o ódio em sua voz que só aumentava cada vez que via a tranquilidade do velho ao lado de fora apenas sorrindo e abanando a mão enquanto o via socar o vidro com o ônibus já em movimento, era tarde demais para pararem e ele sabia disto.

— Você vai achar ele. - gritou do lado de fora.

E aquelas seriam as últimas palavras que Louis escutaria daquele homem pelo resto de sua vida.

Respirando fundo deu um último soco na porta sentindo suas mãos doerem com as batidas decidiu então se sentar em algum lugar vago com janela, ele poderia descer na terceira cidade, mas já estava ali havia perdido sua passagem para salvador não tinha um tostão se quer para comprar outra, o que restava era mudar sua rota e aceitar que estava embarcando rumo ao planalto central por culpa daquele que nem se quer sabia o nome

Faroeste Caboclo L.SOnde histórias criam vida. Descubra agora