Capítulo 13

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Nunca fui muito de tomar atenção no entorno, então quando Gael não estava mais presente era tarde demais. "Érica..." os pensamentos foram distantes. Há quanto tempo não nos víamos. Analisei sob a ótica da pele. Sorri tímida por tomar noção, outra vez, das nossas similaridades.

— Há quanto tempo não nos vemos... — Tentei puxar assunto. A voz fez eco no corredor alto e vazio.

— Dez anos. — Fria, me respondeu como a militar que era.

— Verdade. — Admito ter ficada sem jeito e as falas transmitiam isso. — Agora, te vendo aqui, nem entendo o motivo disso ter ocorrido.

— Não? — A risada pausada dela atravessou as costas. — O Fritz não achou agradável ter uma linhagem pobre em convívio com a parte rica da família. Retirou de mim e da mamãe o direito da casa da vovó. Além de um mandado judicial de distanciamento de cem metros.

Era verdade. Éramos primas, mas o meu pai odiava a irmã da minha mãe. Mesmo assim... Guardava tanto carinho das nossas recordações infantis. Nossos momentos de brincadeira. Em algum momento, ao qual não sei, nossas brincadeiras ficaram mais rasas. As risadas mais tímidas. Os olhares menos sinceros.

Nossa família nos fez ficar desconhecidas uma para outra. Voltamos a nos rever durante a adolescência quando minha tia tentou reivindicar a liderança da família Cruz através de combates. Ainda recordo de parte da carnificina que foi aquele momento. Só que vê-la derrotada na minha frente. Transbordando raiva no olhar. Odiando-me no trincar dos dentes.

Me fez pensar, logo em seguida, que devia ter perdido a luta.

— Eu não sabia que você estava na polícia-

— Vamos parar de palavras nostálgicas, tudo bem? — Érica me cortou, e virou-se para mim. Atrás dela, a paisagem dos corredores havia se expandido. Um campo de batalha. Gramado ao ar livre. — Não sou mais tua prima. Agora, sou teu sargento.

Abaixei o queixo, e aceitei as ordens. Fingi não ter sido machucada pela última frase. — S-Sim, senhora.

— Alguma ideia do "porquê" Pavlov te direcionou para vir comigo? — Érica alongava o corpo.

— Pelos laços sanguíneos?

Érica riu. Perdeu a postura militar no mesmo instante que terminei a fala. Deixou meu semblante mais frustrado do que antes. Estava envergonhada. Pior, sentia ser uma chacota para ela. Não só para ela. Tinha essa sensação desde o desastre da missão da Porta do Inferno.

— Ele não é um homem passional. — Ela respondeu. — Vocês não são desqualificados para serem magos da B.M.O.E. Só que possuem traves psicológicas que lhes impedem de serem melhores. — pausou. — Ela tem medo de ser quem é, ou de valorizar quem deveria ser. '' Havia engrossado a voz para similar a Pavlov. — Foi o que ele me disse.

— Mas eu dei meu melhor! — Contestei. Mal percebi o aumento no tom de voz.

— Eu vi os vídeos do bar. — O olhar semicerrado me chicoteava — Você foi pífia.

Érica abriu os braços. — Me ataque.

Não tive reação. Na verdade, dei dois passos para trás. Não tinha coragem de atacá-la e pouco tinha compreendido do pedido. Ela continuava ali, parada. A ação conseguiu me trazer vergonha, receio...

Érica trincou os dentes. — Vamos! Sua covarde filha da puta! Ataca! — berrou.

— Você nem está protegida. Para que vou fazer isso!? — Os questionamentos saiam da boca com tremular.

— Incrível.

Érica correu para cima de mim. Num instante, usou da mana para impulsionar o corpo de modo a aproximar-se muito rápido. Jogou o cotovelo em meu rosto.

Deuses de Sangue [VENCEDOR WATTYS 2022]Onde histórias criam vida. Descubra agora