Capítulo 03- Janelas da alma

1.5K 123 23
                                    

- Em todas as coisas que você poderia me perguntar, sobre como me senti ao voltar, sobre como estou com isso, você está preocupada se olhei pra, minha professora? Eu sou um ser humano, e ela é bonita sim, eu não nego, se você quer ficar com raiva de mim por falar a verdade que seja, já estou cansada desse enrola, enrola, esperando você se decidir se eu sou ou não importante para você. Eu vou embora Louise. - Eu desabafo.

xxxxxxxxxxxxxx

Caramba eu realmente tinha explodido com Louise, mas ao mesmo tempo em que me sentia mal pela forma que falei, algumas vezes era necessário ser dura com as pessoas, um choque de realidade em quem parece viver no mundo da lua. Eu não sabia o que ela queria de mim, tão pouco ela me dava indícios do que era, eu sabia apenas que havia sentimento de ambas as partes, eu tinha certeza do que sentia. Eu a amava, amava mesmo, mas ela não parecia saber definir o que ela sentia, ou demonstrar.

A hora passa rápido demais, já está na hora de ir novamente, tomar banho, merendar, ajeitar a bolsa, pegar o ônibus, duas horas de viagem, duas horas de pensamentos, duas horas de solidão, enfim a faculdade, mais três horas flutuando fingindo existir sentada em uma cadeira, pegar o ônibus, duas horas de volta, madrugada em casa.

Valentina P.V.O.

Anoiteceu em um piscar de olhos e lá estava eu me encaminhando para uma reunião na faculdade em que lecionava. Este ano queriam me colocar como coordenadora de Enfermagem, mas não sei se consigo conciliar tantas coisas.

Esbarro com uma pessoinha no estacionamento e ela se estanca no chão, Luiza. Que raios esse estacionamento tinha, que tentava fazer com que eu matasse a menina sem querer.

-Me desculpe, eu não a vi. - Digo estendendo a mão para a garota que evita levantar a vista e me encarar. O que ela tinha? Fico intrigada, querendo saber mais daqueles olhos que me pareciam tristes.

- Não foi nada Mr. Reis- levantando e se agachando para pegar sua mochila, me agacho junto a ela para lhe ajudar e olhar em seus olhos.

-Valentina, fora da sala de aula você pode me chamar de Valentina. - Finalmente ela olha em meu rosto, mas não em meus olhos. Não que ela consiga esconder por trás da beleza daquela imensidão escura, que são seus olhos, havia dor ali, e aquilo me incomodava.

Ela não me respondeu, apenas continuou pegando suas coisas do chão.

- O que há de errado Luiza? Você não me parece bem. - Vejo a garota morder os lábios ponderando o que vai falar em seguida.

- Não há nada, Senhora Reis, estou com cólica. - Não sinto verdade em nenhuma palavra que sai de sua boca, mas presumo que a mesma não quer falar a respeito, devo respeitar. Porém quando ela se levanta e eu repito o mesmo ato, seus olhos negros finalmente encontram o meu, sinto a dor evidente com mais clareza.

"Os olhos são

Janela de nossas almas."

Deixo escapar sem querer de meus lábios e sua expressão fica um misto de vergonha, com timidez, com surpresa. Nossos olhares ainda não se desencontraram eu não sei porque, mas senti uma súbita vontade de conversar, de insistir um pouco mais para que ela falasse o que havia, uma necessidade de dar conforto. E porquê?

Eu não sou assim, eu não costumo ser assim. Sou totalmente profissional, nunca misturei trabalho com a vida pessoal, e aquela garota era minha aluna, e eu estava ali querendo saber mais sobre a vida daquela garota, porque eu sentia dentro de mim uma vontade absurda de cuidar de seja lá o que ela estiver passando.

Me afasto. É melhor assim, e Luiza fica inerte, paralisada, após o que eu disse.

Sigo em direção ao meu destino. Pensando em tudo e sem saber descrever nada. Suspiro aliviada ao ver um rosto conhecido. Rodrigo. Meu melhor amigo.

Rodrigo sabe de tudo da minha vida, é meu melhor amigo desde o colegial, ingressamos juntas na faculdade, nós formamos juntos. Em todos os momentos da minha vida ele esteve lá por mim. Não havia nada em mim que ele não soubesse descrever ou perceber, e não havia nada nele que eu não soubesse, fora de nossas normalidades, nos conhecíamos como a palma de nossas mãos, talvez até mais.

-O que foi Lo? Viu um fantasma? Está mais pálida que o normal gasparzinho. - Ele me provoca, mas só o faz porque estamos a sós na sala da coordenação, graças ao evento passado, e o meu atraso antes do que houve entre mim e Luiza, a reunião já havia acabado e restando apenas Rodrigo. - Porque não veio a reunião? Todos sentiram sua falta.

- Eu me atrasei, não sei explicar, aconteceu algo bem estranho. Não sei definir - digo com sinceridade enquanto meu melhor amigo me fita.

- Que aconteceu algo eu percebi, você está bem estranha, quando sentir que deve falar, eu estou aqui, ok? Café após a aula? - Me pergunta.

- Não pode ser Whisky? - Digo já sabendo sua resposta, então já seguro a gargalhada.

-VALENTINA! Você não toma jeito? - Me repreende assim que as palavras saem de minha boca e não me controlo e riu.

Tudo era mais leve com meu melhor amigo do lado, ter alguém com que você pode contar era maravilhoso.

-Vai comigo me apresentar a turma que vamos lecionar e que você é madrinha? – Ele ainda parecia me analisar.

- Vou. Já está na hora? - Isso significa que iria ver Luiza, de novo. Porque aquilo me causava um frio estranho na barriga? Meu Deus, eu pareço uma adolescente.

Alguns minutos se passaram e eu em meu transe e âmbito existencial nem percebi que já estava na hora de ir. Hoje era minha folga, mas fiz questão de aproveitar a reunião para apresentar Rodrigo a turma a qual eu era madrinha. Antes soubesse o que aconteceria no gramado e não teria tido essa ideia.

Eu e Rodrigo nos encaminhamos para a sala de aula.

Luiza P.O.V

Acho que o que eu não senti ontem sobre o peso das aulas terem voltado, senti hoje. Uma tristeza me abateu sem tamanho algum durante toda a viagem de vinda para a faculdade, algumas lágrimas rolaram no percurso, era de fato inevitável não pensar.

-Priscila, ela simplesmente ficou me encarando e era como se eu estivesse lá, ela tentasse me desvendar. - Desabafo pra Priscila, antes do professor Rodrigo chegar. Agradeço aos céus por hoje não ser aula de Valentina, acho que ficaria bastante constrangida caso fosse.

- Você não acha que isso é coisa da sua cabeça? Afinal, por que você dá toda essa volta para entrar no campus, entrando lá pela outra entrada sem precisar passar pelos carros, quando pode entrar pelo outro portão? Sabe que é perigoso, não sabe? - Priscila me fita, esperando minha resposta, o que eu apenas decidi responder a primeira pergunta.

- Não, eu juro para você que na... - a porta se abre e vejo uma Valentina Reis entrar radiante e prepotente.

Merda de novo, Valentina.

Até o Para Sempre - ValuOnde histórias criam vida. Descubra agora