Fieldhead
Ainda assim Miss Helstone recusou-se mansamente a se sucumbir. No seu jovem coração havia uma grande força nativa e ela soube utilizá-la. Tanto os homens como as mulheres nunca combatem mais rijamente do que quando lutam sozinhos, sem testemunhas, sem conselheiros, sem confidentes, sem terem ninguém para encorajá-los, dar-lhes conselhos ou lamentar por eles.
A jovem Miss Helstone estava nessa situação. Os seus sofrimentos eram o seu único aguilhão e, sendo reais e afiados, despertaram seu espírito profundamente e sua coragem. Decidida a ter vitória sobre uma dor mortal, ela fez o seu melhor para abafá-la. Nunca tinha estado tão ocupada, tão estudiosa e, acima de tudo, tão ativa. Saía com todo tipo de tempo e dava longas caminhadas em lugares solitários.
Dia após dia ela voltava para casa à noite, pálida, todavia sem parecer fatigada, pois, logo que ela tinha tirado o chapéu e o xale, em vez de descansar, começava a andar pelo seu quarto e só se sentava quando estava literalmente desfalecendo. Ela dizia que fazia isso para cansar-se bem, pois assim ela poderia dormir tranquilamente à noite. Mas, se esse era seu objetivo, era inatingível, pois à noite, quando os outros dormiam, ela revolvia-se na cama parecendo se esquecer da necessidade de se buscar repouso. Muitas vezes, infeliz, ela punha-se a chorar sob a opressão de um intolerável desespero que a abatia, feria sua força e a reduzia ao desamparo infantil.
Quando assim prostrada, tentações assaltavam-na: ouvia as sugestões da fraqueza, que a aconselhava a escrever para Robert Moore, dizendo o quanto estava infeliz porque ela fora proibida de vê-lo, assim como para Miss Hortense; que ela temia perder a sua amizade (não o seu amor) e que ele a esquecesse completamente, e pedindo-lhe que se lembrasse dela e lhe escrevesse algumas vezes. Chegou a escrever uma ou duas cartas nesse gênero, mas ela nunca as mandou; a vergonha e o bom senso a proibiram.
Mas a vida atingiu um ponto em que parecia não poder suportar por mais tempo. Ela deveria encontrar uma mudança, fosse ela qual fosse, sob pena de ver fraquejar seu coração e mente. Ela desejava deixar Briarfield e se refugiar em algum lugar muito distante. Ela ansiava por algo mais, uma profunda, secreta e irresistível necessidade de descobrir quem era sua mãe e conhecê-la. Esse desejo era reforçado diariamente, mas com ele veio a dúvida, um pavor: se a conhecesse, será que ela iria amá-la? Não havia motivo para hesitação, mas a apreensão tinha sua causa. Nunca em sua vida tinha ouvido falar de sua mãe com louvor. Quando alguém falava dela, era sempre com frieza, e seu tio parecia considerar a cunhada com uma espécie de tácita antipatia. Uma velha criada, que tinha vivido com Mrs. James Helstone por um curto período de tempo depois de seu casamento, quando ela se referia à sua ex-ama, falava com fria reserva. Eram expressões de gelo para o coração de uma filha, pois elas sugeriam que, talvez, fosse melhor nunca saber de seus pais.
Entretanto, um projeto, cuja execução parecia provável que lhe trouxesse uma esperança de alívio, era o de se criar uma posição, de se tornar uma governanta. Um pequeno incidente deu a ela condições de levar seus planos ao conhecimento de seu tio.
Suas longas caminhadas tinham sempre como fim, como disse, lugares solitários; mas para qualquer lado que ela se dirigisse, fosse para a orla árida do pântano de Stilbro, fosse para os ensolarados pastos de Nunnely, a volta para casa era sempre pelo caminho de Hollow. Ela raramente descia ao fundo do vale, mas aparecia sobre a elevação tão regularmente como as estrelas despontam por cima da montanha. Seu lugar de repouso era um banco embaixo de um velho espinheiro. Dali ela podia ver a bem conhecida janela do escritório do moinho, cuja luz brilhava como uma estrela lá longe. Sua missão era observar este raio de luz; sua recompensa, distingui-la; às vezes brilhante, às vezes fraca através da névoa, noutras se quebrando entre as linhas oblíquas da chuva, pois esta vinha sempre, fosse qual fosse a época do ano.