Rushedge - Um Confessional
Todos diziam que já era tempo de Mr. Moore retornar para Yorkshire. Todos de Briarfield estranhavam sua estranha ausência e os habitantes de Whinbury e de Nunnely trouxeram sua cota separada de espanto. Indagavam os motivos de sua ausência demorada, mas o certo é que havia, pelo menos, quarenta razões plausíveis para tentar explicar aquela inexplicável circunstância. Não eram os negócios que o prendiam; havia muito que concluíra os que o tinham levado a partir; tinham sido descobertos e presos os quatro chefes do motim; ele assistira ao processo, ouvira ler a sentença que os condenava à deportação e ele mesmo os vira partir.
Isto era sabido em Briarfield. O Stilbro Courier tinha dado todos os pormenores com amplificações. Correu, portanto, o rumor de que Mr. Moore não ousava voltar para Yorkshire, pois receava por sua vida que estava ameaçada pela vingança.
– Farei com que ele saiba disto – disse Mr. Yorke, na ocasião em que o seu contramestre lhe contou o que o povo dizia. – Se isso não o fizer regressar rapidamente, nada o fará.
Essa notícia, ou qualquer outro motivo, conseguiu enfim o fazer regressar. Preveniu Joe Scott do dia em que chegaria mandando levar-lhe o cavalo. Joe Scott informou a Mr. Yorke, que decidiu ir ao encontro do viajante.
Era dia de mercado e Mr. Moore chegou a tempo de ocupar o seu lugar de sempre para o jantar no hotel. Em parte, por ser estrangeiro e também como homem de qualidade e de ação, os fabricantes o receberam com certa deferência. Alguns que em público não teriam se atrevido a recebê-lo, com medo da vingança popular, aconselhavam-no em particular como o seu campeão. Depois de os vinhos terem circulado, a amabilidade poderia ter-se transformado em entusiasmo se não fosse a impassibilidade de Mr. Moore mantê-la num grau moderado.
Mr. Yorke, presidente perpétuo desses jantares, presenciava a atitude de seu amigo com extrema satisfação. Era para ele um divertido espetáculo ver Robert Moore, recostado na cadeira, calmo e quase arrogante, ao passo que os donos das fábricas elogiavam as suas proezas, misturando, muitos deles, as lisonjas com desagradáveis investidas contra a classe operária. O seu coração dilatava-se com a agradável convicção de que Mr. Moore se sentia humilhado por aqueles grosseiros elogios.
Mr. Yorke não resistiu e lhe perguntou o que o amigo achava de seus bajuladores.
– Mas que pena, meu rapaz, não ter mandado enforcar aqueles quatro pobres diabos! Se tivesse praticado esse alto feito, a aristocracia do distrito teria desatrelado os cavalos da sua carruagem e o teriam puxado até Stilbro como um triunfante.
Mr. Moore não tardou a deixar a sala onde estavam os fabricantes, Mr. Yorke o seguiu e saíram juntos de Stilbro.
Era cedo para o regresso, embora o dia estivesse adiantado. O último raio de sol já dourava as franjas das nuvens e a noite de outubro começava a estender sua sombra sobre os pântanos.
Mr. Yorke, a quem não desagradava o regresso de Mr. Moore, fez, em grande parte, as despesas da conversa. Referiu-se rapidamente, mas com ironia, ao julgamento e à sentença. Em seguida, passou às intrigas da terra e atacou Mr. Moore em seu próprio terreno:
– Bob, parece-me que foi vencido e é muito bem feito. A fortuna apaixonou-se por você, destinou-lhe o primeiro prêmio da Cornucópia: vinte mil libras esterlinas, bastava que você estendesse a mão para pegar. E o que fez o senhor? Pediu um cavalo e foi caçar para as bandas de Warwickshire. A sua bem-amada fortuna mostrou-se indulgente. Esperou como a estátua da paciência que o senhor acabasse a caçada, pois julgava ela que o senhor havia de voltar e mostrar-se bom rapaz. Ainda poderia ganhar o grande prêmio, mas ficou indizivelmente surpreendida, e eu também, quando viu que, em vez de regressar a galope para lhe colocar aos pés os louros alcançados, tomara friamente a diligência para Londres. O que foi fazer lá o diabo é que sabe! Nada, penso eu, senão se aborrecer. O seu rosto nunca teve a brancura dos lírios, mas agora está da cor da azeitona. Já não está mais tão bonito como era, meu rapaz!