Noée Moisés
No dia seguinte Mr. Moore levantou-se antes do dia amanhecer, foi a cavalo a Whinbury e retornou antes que sua irmã tivesse preparado o café da manhã. O motivo de sua estada em Whinbury, ele não disse a ninguém e também Miss Hortense não fez perguntas. Não era costume de Mr. Moore comentar sobre suas saídas, negócios complicados, e, muitas vezes, ele guardava sombrios segredos em seu peito para não preocupar sua irmã.
Depois do café, ele se dirigiu ao escritório para ler as correspondências entregues pelo filho de Joe Scott, Harry. As notícias não eram nada boas, pelo contrário, pois quando Mr. Moore pousou a última carta, suas narinas dilatadas exprimiam certa cólera irônica e desafiadora. Embora ele não tenha dado margens para explosões, havia um olhar que parecia invocar o diabo para que este varresse os encargos e as preocupações para o inferno. No entanto, tendo escolhido uma pena, seus movimentos enquanto escrevia demonstravam furor (somente nos dedos, pois seu rosto estava plácido), escreveu uma porção de respostas e lacrou-as. Então saiu e atravessou o moinho. Na volta, ele sentou-se para ler o jornal.
O conteúdo parecia não ter grande interesse. Por mais de uma vez pousou o jornal nos joelhos, cruzou os braços, olhou para o fogo, virou a cabeça em direção à janela e, ocasionalmente, olhava para o relógio. Em suma, sua mente parecia preocupada. Talvez ele estivesse pensando na beleza do tempo, pois estava uma manhã suave e luminosa para a estação. Talvez ele desejasse gozá-la nos campos. A porta do seu escritório estava escancarada, portanto, a brisa e os raios do sol entravam livremente. Contudo, o visitante não trouxe consigo o perfume da primavera em suas asas, apenas um ocasional sopro de enxofre da espessa coluna de fuligem e fumaça que saíra da chaminé do moinho.
A aparição azul-escura (Joe Scott vinha da cuba de tingimento) apareceu momentaneamente na porta aberta e pronunciou as palavras: – Ele chegou, senhor – e desapareceu.
Mr. Moore não ergueu os olhos do papel. Um homem de estatura elevada, ombros largos e maciços, pernas compridas, envergando um terno de fustão e calçando meias de lã acinzentadas, entrou, foi recebido com um aceno de cabeça e convidado a se sentar. O visitante tirou o chapéu, guardou-o sob sua cadeira, enxugou a testa com um lenço de algodão manchado e colocou em um canto o bastão de oficial que tinha na mão. Feito isso, começou a articular um leve som com os lábios, embora desarticulado, mas provavelmente para se mostrar à vontade.
– Já tem o que é necessário, suponho – disse Mr. Moore.
– Sim, sim. Está tudo certo.
O homem voltou a assobiar e Mr. Moore, à leitura. Aparentemente o jornal tornara-se mais interessante. Não tardou, no entanto, para que ele voltasse para o seu armário, que estava ao alcance do seu longo braço, sem se levantar, e pegasse uma garrafa preta, a mesma com a qual Mr. Malone já travara conhecimento, um copo e uma jarra, colocasse-os sobre a mesa e dissesse ao seu convidado:
– Sirva-se. Tem água naquele pote lá no canto.
– Com todo o gosto. Tenho sempre sede pela manhã – disse o homem, levantando-se e fazendo conforme Mr. Moore lhe sugeriu.
– Mr. Moore não bebe nada? – perguntou ele, enquanto preparava a mistura com uma mão hábil. Depois, tomando um grande gole, deixou-se cair na cadeira, satisfeito. Mr. Moore, lacônico, respondeu com um movimento negativo de cabeça.
– Faz mal – continuou o visitante – não há nada melhor para enxotar o aborrecimento. Excelente marca holandesa! Manda trazer do estrangeiro com certeza. Creio que seria muito bom se bebesse um copo. Os rapazes que vêm aí vão fazê-lo falar durante muito tempo. Precisa ganhar forças.
– Viu esta manhã Mr. Sykes? – indagou Mr. Moore.
– Vi-o há um quarto de hora. Ele me disse que tinha a intenção de vir aqui e eu não ficaria admirado de vê-lo chegando com o velho Mr. Helstone. Eu reparei que este selava seu pônei quando passei na parte de trás do presbitério.