Capítulo 16

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A Festa de Pentecostes

O fundo para assistência aos pobres prosperou. A iniciativa de Miss Keeldar, a dedicação dos três párocos e a ajuda eficaz, embora não ostentosa, das misses Ainley e Hall produziram uma soma que, judiciosamente empregada, serviu para dar grande alívio à miséria dos pobres desempregados.

Nas proximidades tudo parecia calmo. Havia quinze dias que ninguém mencionava nenhum atentado contra as fábricas ou as habitações dos industriais nas três paróquias. Miss Keeldar já julgava que o perigo previsto, de fato, já tinha passado. Estava convencida de que, com a aproximação do período de estiagem, os negócios melhorariam. Além disso, a guerra não podia durar para sempre, a paz viria um dia e que impulso isso daria aos negócios!

Este era o teor das observações que ela fazia ao seu inquilino, Mr. Moore, sempre que o encontrava em um local onde pudessem conversar. Sorrindo à sua maneira, ele também respondia que acreditava no fim da guerra para breve e que era nessa esperança que tinha depositado sua âncora e baseado suas especulações.

– Como sabe – continuou ele – a fábrica de Hollow vive neste momento apenas da perspectiva do futuro. Há tempos não vendo nada, pois não existe mercado para os meus produtos. Estou preparado para aproveitar a primeira oferta que aparecer. Há três meses isso não seria possível. Tinham-me esgotado o crédito e o capital. Bem sabe quem veio em meu auxílio, de quem recebi o empréstimo que me salvou. Um ano, ou seis meses, que seja, que sejam de paz e estarei a salvo. Porque, como a menina disse, a paz dará um enorme impulso ao comércio. Nisso tem razão, mas no que diz respeito ao restabelecimento da tranquilidade nas redondezas e no efeito do fundo permanente de beneficência, disso eu duvido. A esmola, até aqui, nunca tranquilizou as classes operárias, nunca lhes inspirou reconhecimento. A natureza humana é assim, nada a pode mudar. Nos dias de grande calor pode ter visto o céu ameaçar uma tempestade de dia, contudo, as nuvens se dissipam à tarde e o pôr do sol é calmo. No entanto, o perigo está lá, não passou, somente foi adiado e a tempestade acaba por rebentar tudo. Existem analogias entre a atmosfera física e a atmosfera social.

– Pois bem, senhor – era dessa forma que terminavam todas as conferências entre os dois. – Cuide de si. Se julga que lhe fiz algum bem, me recompense me prometendo cuidar da sua segurança e saúde.

– Prometo. Olharei por mim com todo cuidado. Desejo muito viver e não morrer. O futuro me aparece como um Éden e, quando mergulho o olhar nas profundezas do meu paraíso, distingo uma visão, a de que eu prefiro a dos serafins ou dos querubins a deslizar através de longínquas perspectivas.

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O mês de maio tinha apresentado uma quinzena bela, apesar de um período de chuva. Mas, na última semana, com a mudança da lua, o tempo aliviara. O sol ergueu-se radioso na manhã de Pentecostes. A reunião das escolas foi favorecida por um clima esplêndido.

A terça-feira de Pentecostes era o grande dia para o qual as duas imensas salas da escola de Briarfield foram lavadas, pintadas e decoradas com flores e arbustos. Nestas duas salas instalaram-se cerca de vinte mesas que podiam receber, cada uma, vinte pessoas. Colocaram em volta delas bancos e as cobriram com toalhas brancas. Estas mesas, é preciso esclarecer, não tinham sido postas para os duzentos alunos, mas somente para os benfeitores e os professores. As crianças tomariam a merenda ao ar livre. Às treze horas os grupos de crianças deviam chegar vindos das três paróquias. Às quatorze deviam ser passadas em revista. Até as dezesseis horas elas deveriam ter percorrido as paróquias e só depois elas viriam para a festa, e em seguida aconteceria na igreja a reunião em que haveria música e os discursos.

Este notável dia sempre tinha sido uma provação para Miss Caroline, pois era obrigada a se mostrar em público e ter que se encontrar com tudo o que havia de mais rico, respeitável e influente na vizinhança, sem outro apoio a não ser o que lhe prestava o gentil Mr. Hall. Obrigada a estar em evidência, a caminhar à frente de seu regimento, na qualidade de sobrinha do reverendo e de primeira professora da sua classe, era ainda obrigada a preparar o chá na primeira mesa para uma multidão de senhoras e senhores e, tudo isso, sem o auxílio de qualquer senhora. Ela, que era naturalmente tímida, tremia só de pensar na aproximação do Dia de Pentecostes.

Shirley (1843)Onde histórias criam vida. Descubra agora