Capítulo 1: Em meio à Noite

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— Queria poder enxergar melhor no escuro

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— Queria poder enxergar melhor no escuro... — reclamou a garota.

— Fica quieta, Lena! — repreendeu o jovem. — O coveiro vai ouvir a gente se tu continuar reclamando assim!

Sob a luz platinada das luas cheias, os dois rompiam o silêncio do cemitério em plena madrugada, dispensando totalmente o uso de um lampião. Estes larápios eram irmãos, parceiros de crime. Enquanto Lena vigiava o perímetro, se esforçando para manter o bico calado, Léo, o líder da operação, se concentrava em destrancar o cadeado do mausoléu com os grampos de cabelo de sua irmã. Tarefa, a qual, só o levara uma questão de segundos, exaltada pelo som inconfundível daquele clique satisfatório e prazeroso.

Com um sorriso perverso e uma coragem de dar inveja, o moleque abriu o portão de ferro e entrou no sepulcro à procura de seu mais novo inquilino. Aqueles defuntos não eram os de qualquer um. Somente os membros da elite, apaixonados pela ideia da "beleza do pós-morte", conseguiam dar tal fim a seus falecidos. O finado em questão era um dos mais ricos da cidade.

A pré-adolescente, lá fora, tremia de nervoso. Ainda era nova no negócio. Seu irmão queria ensiná-la a se virar, torná-la mais independente caso algo ruim acontecesse com ele. Entre o portão, ela lutava contra sua cabeleira crespa e o vento. Reclamava, incomodada, tentando se afastar das inúmeras baratas, mas a atenção de seu comparsa estava voltada a outra coisa.

Com o resplendor do luar espreitando pela pequena janela do mausoléu, Léo deixou que sua vista se acostumasse à escuridão. Guiado pelo brilho polido da lápide, encontrou a cripta de sua vítima lá embaixo, à altura de seus pés.

O ladrão gostava de seus alvos envolvidos pelo tradicional abraço maternal da terra; tinha pouca familiaridade com túmulos revestidos como esse. Da última vez que topou com um, voltou de mãos vazias. Naquela noite, entretanto, ele tinha um plano, o qual envolvia usar a marreta que roubara de uma loja de ferramentas.

Tentou com jeitinho. Não conseguiu. Teria que usar a força bruta, porém, ele não era forte. Respirou fundo. Sabia que faria barulho, mas não se perdoaria se voltasse para casa derrotado. Liberando golpes bem calculados, quebrou o azulejo e a camada de cimento, até que, enfim, deparou-se com o caixão de madeira importada.

Segundos de concentração e de silêncio se passaram até que Léo conseguira destrancar o caixão. Não roubaria o corpo em si, mas sim *do* corpo. Pessoas da alta-classe tinham o péssimo hábito de enterrar suas riquezas consigo. Joias, colares e relógios, tudo era levado para a vala. Para ele, seria como desembrulhar um chiquérrimo presente de aniversário.

O vento fresco da colina soprava. Lena, mais descabelada do que nunca, estava com o coração acelerado. Sentia medo do cenário a sua volta:

— Léo? Já terminou?!

— Calma! — repreendeu ele, com a voz ecoada.

Léo retomou o fôlego. Em seguida, desamarrou a bandana de sua testa e a envolveu em sua boca e nariz, improvisando uma máscara para aguentar o fedor amargo do miasma e da morte.

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