As noites de lua cheia têm um significado bem único para os irmãos Léo e Lena: invadir o cemitério e roubar dos mortos que recentemente reviraram a terra. Correr do coveiro e vender as joias adquiridas tornou-se parte da rotina dos órfãos, que lutam...
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Durante a conversa dos dois lá fora, Lena e José Romeo discutiam sobre os principais acontecimentos do dia. Ele focado, ela distraída:
— José, já conheceste alguém com ucidíase? — Olhava para a enferma enrolada nos cobertores.
— Pessoalmente, não.
— Tens vontade?
— Claro que não! — Coçou-se. — Por que me colocaram ao lado dela, Leonora, por quê?! Santa agonia!
— Oie~! — Marini se aproximou dos dois. Já havia terminado seu jantar. — O que estão fazendo aí?
— Um resumo do relatório.
— Ah, bacana! Vocês se lembraram de anotar tudo?
— Creio que sim: — leu — "Animais desaparecidos, supercrescimento das plantas, roupas dos mercenários, a bota, crias-do-mangue."
— Hum... Eu só queria saber o significado disso tudo... Como tanta anomalia surgiu no manguezal tão de repente?!
— Tenho minhas teorias...
— Ah, é? Conta pra gente então! — Sentou-se ao lado de Lena.
— Bom, como devem saber, ninguém sabe explicar ao certo por que as anomalias acontecem ao redor do mundo. Elas simplesmente acontecem. Li uma vez um cientista dizer que elas ocorrem por influência dos astros.
— Isso explica por que essas tais "crias-do-mangue" não gostam muito do sol?
— Não sei; talvez. Viajar durante o dia parece ser a opção mais segura mesmo. Melhor prevenir que remediar.
— E o que a gente faz se encontrar um desses bichos do nada? — perguntou a miúda com medo em sua voz.
— Essas coisas nem devem existir, piquetuxa! — assegurou Marini. — Mas, se existirem, eu vou dar um jeito em todas elas. Já lutei contra coisas feias antes. Não se preocupe! — Estendeu o braço e a abraçou de ladinho.
— Se o que eu li for verdade — continuou José —, estamos com sorte. Uma pesquisa mostrou que anomalias são mais frequentes em noites de luas cheias. Estamos na nova.
— Ha, ha! Viu só, Leninha? Vamos ficar bem!
A garota não se sentiu tão relaxada assim com a informação. Tinha uma inquietude séria na ponta da língua:
— Mas e quanto à doença? Quero dizer, como a gente vai ajudar os doentes lá em Guaiatuba?
Os dois se calaram, como se gatos comessem suas línguas. Ela tinha razão. O objetivo da expedição era encontrar alguma forma de deter a ucidíase e acabar com o embargo de Argilosa. Havia algo monstruosamente terrível por trás de tudo isso. José tomou a frente e esclareceu:
— Tenho quase certeza de que, amanhã, o fáter nos levará à gruta onde Senhor Jericob encontrou os caranguejos. A resposta pode estar lá. Nunca se sabe, não?
