capítulo 21

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Tava cansada pra caralho, vi o baile movimentado e subi pro camarote. Não encontrei a dona Fernanda nem a minha madrinha.

Apenas o Indio, com a cara fechada. Caminhei até ele e sentei ao seu lado pegando o copo de whisky da mesa.

Índio: Na paz? -me encarou e eu assentir -Tô vendo, cara emburrada aí pô.

Na verdade eu tava chateada com o Luan, e tava sozinha no baile, não gostava.

-Preciso fazer novas amizades, algumas largam as mãos. -falei alto o suficiente pra ele escutar sem precisar abaixar a cabeça

Índio: Satisfação pô. -estendeu a mão -Teu novo colega aí.

-Oi? -fiz a sonsa e encostei a cabeça em seu pescoço pra ele falar novamente

Pra minha surpresa ele colocou a mão no meu rosto e aproximou a boca no meu ouvido.

Índio: Tô fechado contigo. -repetiu rouco

Ele era o dono da porra toda, mas era humilde, e até agora está mostrando ser um amigo legal mermo.

-Isso mermo, gostei. -sorrir de lado

Índio: Vamo dar uma volta, sem neurose? -me encarou e levantou esticando a mão

Segurei levantando e ajustei meu vestido, saímos juntos do baile e eu entrei em seu carro preto com vidro preto fosco.

Típico de sequestro, tinha o perfume dele, e o banco era de couro.

Pensei antes de entrar, sabia que amanhã poderia sair nas páginas de fofocas. Mas quem não deve, não teme.

-Caraca, puro luxo. -olhei ao redor e ele acelerou o carro arrastando o pneu

Índio: Quer tomar um caldo? -encarei confusa

Quero.

-Caldo de cana? -perguntei e ele encarou óbvio

Índio: Então, qual caldo poderia ser além desse? -passou a marcha e eu analisei os anéis em seu dedo e a mão com as veias marcadas

-Tem vários, tu está falando com a maior experimentadora de caldos.

Índio: Boto fé. -estacionou o carro e descemos na baixada

Era justamente o quiosque que eu sempre passava, afinal , é em frente ao posto Santa Luz.

Chegamos distante um do outro, pouco papo, comi meu pastel e o caldo de cana, e depois fiquei parada esperando ele falar algo.

Índio: O que tu sabe sobre o teu coroa?

Ah, não sobre o meu pai.

-O nome, o vulgo, que ele é meu pai, e já foi super envolvido na ilegalidade. -olhei pra ele que parou um pouco me observando

Eu sinceramente me sinto no metáforando, sempre que converso com ele. Parece que sou uma criminosa e ele está desvendando isso.

Índio: Ele e o meu coroa eram conhecidos, pô. -pigarrou e cruzou os braços -Não imaginava que ele tinha uma cria.

-Pois é, ele teve. -virei o rosto -Mas nem sempre estive por aqui, passei uma cota na minha avó paterna. E morei aqui na baixada também.

Era fácil contar a minha vida completa pra um traficante, eu já nem sabia sobre a palavra limites.

Índio: Peguei a visão. -encarou o relógio -Qual tua fita com o Luan?

-Amizade.  -ele me olhou meio desconfiado -Com todo respeito, também não é da sua conta.

Índio: Claro que é. -apoiou o braço na mesa -O Luan tá desenrolando com minha irmã, preciso estar ciente, se não tem nenhuma surtada obcecada por ele.

-Tem, várias pelo morro. -olhei pro meu celular -Mas eu não ameaço risco, acho que é meio óbvio.

Índio: Papo reto, tu parece bem inocente, principalmente pra uma cria de favela. -analisou minha boca

-Cuidado, sou de alta periculosidade. -apontei pro posto atrás de nós dois -Se eu quiser, assim como salvo vida, posso tirar. Mas sou bastante humana pra fazer isso.

Índio: Também sou humano, pô. -olhou o celular -Só não gosto de ser tirado de otário.

-Quem tiraria um dono de morro, de otário? -encarei ele

Índio: Tu tá por fora mermo, precisa se atualizar. -sorriu de lado -Somos colegas certo?

-Essa fita mermo.

Índio: Então tu vai aprender, pelo menos defesa básica. -olhei pra ele sem entender

-Quer que a dona Fernanda, te odeie ainda mais?

Índio: Eu falei basica. -levantou um pouco a camisa amostrando a pistola -Não tô te chamando pra ser bandoleira da favela.

Eu, pegando em uma arma? Dentro de todas as leis "Lorena não pode fazer" que a dona Fernanda criou.

Por outro lado, pensei na noite passadas, se eu tivesse uma defesa teria evitado.

-Certo.  -estendi a mão por segundos e depois me senti uma otária

Ele encarou meu braço antes de levantar a mão e apertar a minha. Senti meu corpo se arrepiar todinho.

Índio: Se tu quiser, podemos aprender alguma fita que tu curte também.

-Claro.

Já tinha algumas coisas em mente. Se ele quer que eu me enturme com algo que ele gosta, também quero.

Estou definitivamente criando um laço com o dono da minha comunidade. E o pior, ele é legal comigo. Ele poderia ser aqueles dono arrogantes e babacas, mas não.

Encarei o celular e a mensagem da minha mãe.

+Mãe: Peste, tu tá dando?

+Mãe: Pelo menos , venha pra casa e não durma na casa de desconhecidos.

+Mãe: A chave tá debaixo do tapete.

(03:00)

FAVELA VIVE (REVISANDO) + (CONCLUÍDA) REPOSTANDOOnde histórias criam vida. Descubra agora