Levantei e fui me arrumar para o trabalho. Coloquei um vestido leve, mantendo minha promessa de usar looks adequados ao clima. Comi um café da manhã rápido e saí de casa, não queria correr o risco de perder mais um dia. Enquanto andava pela rua reparei como estava tudo estranhamente tranquilo. Não havia ninguém sentado no quintal dos Santos, a casa até parecia vazia na verdade. Lembrei do dia anterior e me perguntei se ele estava cumprindo a promessa de vingar a morte de seu amigo. Isso não é da minha conta. Foquei em chegar inteira na escola, mesmo derretendo como uma estátua de cera no deserto. Fui direto para a minha sala, não queria encontrar a diretora e ter que explicar minha ausência no dia anterior. Arrumei minhas coisas na mesa e logo ouvi alguém batendo na porta.
- Licença, Sra. Lopes, posso falar com você? - Perguntou o jovem com o rosto enfiado na pequena fresta que abriu da porta.
- Claro, estou aqui pra isso, entre. - Sorri para ele. - Fique a vontade, sobre o que quer conversar?
Era o jovem que estava no banco de trás do Oscar uns dias atrás, o irmão dele. Era fascinante a semelhança e diferença entre eles. O adolescente parecia tenso agora, não conseguia olhar diretamente para mim, ficava oscilando entre minha mesa e os próprios joelhos.
- Eu não sei bem. - Sorriu nervoso. - Eu estou preocupado... Com todos nós. - Me encarou por alguns segundos. - Tem tanta coisa acontecendo ao mesmo tempo que sinto estar sufocando.
- Por que não começa me dizendo seu nome? - Pedi delicadamente.
- Ah, claro, desculpe. Meu nome é César Diaz. - Deu um sorriso breve.
- Prazer te conhecer oficialmente, César. Agora me conte, que coisas são essas que estão te tirando a paz?
- Não sei nem por onde começar... - Dei de ombros, mostrando que a ordem era irrelevante. - Bom, meu irmão... - Ele tossiu nervoso e me olhou rapidamente. - quer que eu inicie na gangue. Logo. Eu não quero fazer parte disso, mas não tenho escolha. Sou um Santo de sangue, irmão mais novo do che... do Oscar, tenho que entrar também.
- Entendo a pressão que deve estar sentindo agora, alguma vez um Santo de sangue se recusou a fazer parte da gangue? - Questionei.
- Alguns já foram expulsos após entrar, mas foram literalmente expulsos... da gangue e do bairro.
- Como eu te disse, arquitetura é uma profissão boa em todo o mundo. Acho que não seria um problema você ser expulso do bairro. - Ele sorriu tímido por eu reconhecer que era ele nas mensagens, mas sorri o confortando. - Você tem amigos fora da gangue? Com quem poderia contar nesse momento, e até saírem daqui juntos.
- Tenho alguns amigos, sim. Na verdade, tenho até uma namorada. - Afundou o rosto nas próprias mãos. - Esse é o outro problema, Sra. Lopes. Eu gosto dela, mas acho que amo outra.
- E o que te impede de ficar com a que você ama?
- Tudo. - Respondeu rápido demais. - Quer dizer, eu e ela somos amigos há tantos anos. Nós ficamos antes das férias, mas nunca mais tocamos no assunto nem contamos pros nossos amigos. - Ele suspirou. - Eu queria ficar com ela, mas ela acha que os amigos jamais nos perdoariam por ter mantido esse segredo.
- Se eles realmente são seus amigos, vão entender o porquê de terem escondido e vão apoiar vocês. Não perca um amor por medo da reação dos outros, querido. - Respirei fundo observando a expressão de tristeza dele. - Você tem algum parente em outra cidade?
- Hm, sim. Tenho um primo que mora na Flórida. Por que? - Me olhou confuso.
- Acho que passar um final de semana longe daqui vai te fazer bem. Quer ir sexta de tarde ou de noite? - Abri meu notebook.
- Eu não tenho como pagar pelas passagens... - Eu o encarei. - Sexta de tarde, então.
Comprei as passagens de ida e volta para o final de semana e entreguei elas impressas para o jovem, que parecia tão confuso e feliz ao mesmo tempo. Ele me agradeceu diversas vezes antes de ir embora. Sei que fiz a escolha certa.
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♱ ENTRE A CRUZ E A ARMA ♱
No FicciónEla sabia no que estava se envolvendo, havia se preparado para isso e aceitava as consequências por um objetivo maior. Mas nenhum treinamento a preparou para o amor. "- Volta aqui, me deixe explicar! - E não ouse voltar para o meu bairro, vadia."