38. Praia.

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Sentei no banco de carona e observei Oscar parado se certificando que Alejandro havia ido embora, ainda com a arma em punho. Após a SUV sair cantando pneu, ele guardou a arma na cintura e veio caminhando até seu carro, então se sentou no banco do motorista.

- Oi. - Falei.

- Oi. - Respondeu cauteloso - Podemos conversar?

- Depois dessa cena heróica, acho que te devo uma. - Respondi ironicamente.

Ele sorriu e começou a dirigir, mas não era o caminho para nossa casa. Respirei fundo e decidi confiar. Após alguns minutos reconheci o percurso, estávamos indo para a praia.

- Desculpa. - Ele finalmente quebrou o silêncio.

- Está se desculpando pelo que, exatamente? - Questionei desinteressada.

- Por ter te dado as costas. Você tinha acabado de ver uma jovem morrer dentro da sua casa, sua primeira semana em um país novo... você disse que não queria me perder. E ainda assim eu te deixei, no pior momento. - Ele parecia tenso.

- Hm, está desculpado. - Ele me olhou desconfiado.

- Fácil assim? Não é possível. - Disse com o rosto confuso.

- Eu não tô com cabeça para discussão, Oscar. Você pediu desculpas, beleza, ótimo, voltamos a ser melhores amigos para sempre, uhu, que alegria! - Respondi com uma emoção forçada.

- O que aconteceu ontem? - Perguntou sério após me avaliar por alguns segundos.

- Muita coisa aconteceu desde que você me deixou, Oscar. - Respondi de olhos fechados.

- Não é possível, foram apenas dois dias. - Ele riu.

- Ah, você acha? Tá legal então, vamos analisar. Um aluno foi sequestrado por alguém que eu não faço ideia de quem seja, e esse alguém queria na verdade me matar, e advinha? Eu também não faço ideia do porque. Um cara que achei que seria meu par ideal na verdade é um psicótico que criou na mente dele que somos um casal e agora não me deixa em paz. Uma outra aluna tem um pai viciado que já tentou agredi-la diversas vezes, e eu estou de mãos atadas pois não posso fazer nada até ela tomar as próprias decisões. Tudo isso enquanto ontem foi o velório da jovem que morreu na minha cama. E tudo isso enquanto a única pessoa com quem eu conversava nessa maldita cidade simplesmente virou as costas pra mim! - Eu estava ofegante após despejar todas informações. - Então, me desculpe Oscar se eu não estiver de bom humor, tá legal?

Ele ficou em silêncio, com o rosto inexpressivo.

- Chegamos. - Disse parando o carro no acostamento da estrada, perto da trilha que levava até a praia.

- Hoje não está calor o suficiente para um banho de mar. - Reclamei de braços cruzados.

- Verdade, mas está ótimo para ficarmos enrolados no cobertor só apreciando a paisagem. - Respondeu pegando um cobertor gigante do banco de trás.

Ele deu um sorriso convencido e saiu do carro, se enrolando no cobertor e sentando no capô. Ok, admito que foi uma boa ideia realmente. Saí do carro e me sentei ao lado dele, pegando parte do cobertor para me aquecer do vento frio que vinha do mar. Olhei para o horizonte, refletindo sobre a vida.

- Você precisa de mais amigos aqui... - Comentou segurando a risada.

- Cala a boca, por favor. - Respondi dando um risada abafada

- Tô zoando, mas falando sério agora, me conte direito esse rolo do sequestro.

Eu contei exatamente o que aconteceu, mudando apenas a parte de eu ter uma arma, é claro. Falei que chamei a polícia quando percebi que era uma emboscada.

- Você foi esperta. - Assentiu dando uma puxada em seu baseado.

- Nossa, obrigada, vai me dar um biscoito e um tapinha na cabeça também?

- Acho que tenho um pacote de biscoito no carro, se quiser. - Respondeu rindo - Desculpa, você é esperta. Eu só queria estar lá com você.

- Não preciso de você para me defender, Spooky. - Disse o apelido dele de forma irônica.

- Eu sou mais legal que os policiais. - Deu de ombros - E não me chame assim. - Olhei confusa para ele. - Esse nome é só para quem deve me temer, não é o seu caso. - Me encarou.

- Que bom, você precisaria se esforçar muito mais se quisesse me botar medo. - Disse aliviada.

- Sempre abusando da liberdade que te dou... - Ele negou com a cabeça, inconformado. - Mas fala aí, como era o sequestrador, afinal?

- Ele era magro, alto... Ah, deixa eu te mostrar. Eu não sou boa em descrever pessoas, então pedi pros policiais deixarem eu tirar foto do sujeito, veja. - Entreguei o celular com a foto do rapaz aberta.

- Merda. - Falou tossindo a fumaça do baseado. - Eu conheço ele, ao menos conhecia. - Me devolveu o celular.

- Sério? Conhecia de onde? O que ele fazia?

- É uma história complicada, mas ele morava no nosso bairro, queria entrar pros Santos mesmo não tendo nenhum parentesco com algum mexicano. O chefe anterior não permitiu, é claro, não faria sentido ele entrar. - Ele fitou o horizonte - Esse jovem, chamado Malcon, não reagiu bem ao ser negado. Mas nunca mais tivemos notícias dele, achávamos que ele tinha ido para outra cidade.

♱ ENTRE A CRUZ E A ARMA ♱Onde histórias criam vida. Descubra agora