Passei o resto do dia deitada no meu quarto, revivendo as últimas 24 horas. Como as coisas podem mudar em tão pouco tempo? Eu realmente não consigo entender, mas talvez esse seja o ponto, afinal. Talvez o destino esteja se encarregando de fazer o que eu não tive coragem: afastar ele de mim. Desde o começo eu sabia que esse era o caminho certo, ou pelo menos, parte de mim sabia. A outra parte, a inconsequente, acreditava que essa parceria poderia ser boa para ambos, que me aproximar dele não tornaria minha missão aqui mais complicada. Mesmo depois da história da ex, louca a ponto de entrar para a gangue rival... eu deveria ter me afastado por conta própria. Agora já foi, não vou ficar com o orgulho ferido por ter sido dispensada por ele, não quando eu já planejava fazer o mesmo. 'Planejava' talvez seja uma expressão muito forte, vamos dizer 'pensava na possibilidade de'. Que merda. Minha mente se calou quando meu celular tocou.
- Sim, Capitão - Atendi com a voz firme.
- Velório amanhã, 15h30, Cemitério Público de Freedrige.
E desligou. Uma coisa para ocupar minha mente, pelo menos. Pensei em avisar Moonse por mensagem, mas me parecia frio demais, e eu não vou chegar perto de arriscar a vida de mais um adolescente aqui. O tempo estava mais nublado hoje, combinando com o clima na vizinhança. Coloquei um casaco e fui em direção a casa da jovem. Era apenas um quarteirão de distância. Ela estava sentada nos degraus da pequena varanda, junto com dois amigos que reconheci ser do grupo deles.
- Oi, pessoal. - Falei em tom calmo ao me aproximar.
- Oi, Bianca. - Moon respondeu olhando pro chão enquanto abraçava os próprios joelhos.
- Oi, ainda não fomos apresentados, mas sou Ruby. - Disse o rapaz baixinho estendendo a mão para me cumprimentar - Sou... era, primo da Olivia.
- Oi, Ruby. Eu sinto muito mesmo pela sua perda. - Ele deu de ombros e limpou uma lágrima.
- Climinha triste aqui, né. Eu sou o Jamal, muito bom finalmente te conhecer Sra. Lopes. - Disse o jovem magro e alto enquanto estendia a mão para o que eu achei que seria um cumprimento normal, mas no fim ele beijou o dorso da minha mão.
- Bom te conhecer também, Jamal. O luto é um processo doloroso, mas importante de ser vivido. E eu realmente sinto muito que vocês tenham que passar por isso dessa forma, mas fico feliz em ver que vocês têm um ao outro. - Tentei falar de forma calma, mas ver o rosto dessas crianças dessa forma estava me deixando arrasada.
- Queria que o Cesar estivesse aqui. - Moon falou baixinho, atraindo alguns olhares curiosos dos amigos. - Ele é nosso amigo também, faz parte desse grupo, era namorado dela! - retrucou um pouco exaltada demais, especialmente na palavra final.
- É, faz sentido. Será que ele já sabe? - Questionou Ruby.
- Spooky deve ter contado já. - A jovem respondeu.
- A notícia já é ruim, vinda dele então, uau. - Refletiu Jamal. - Ainda bem que foi por mensagem.
- Bom, meninos, eu vim aqui para avisar vocês que o velório será amanhã, no cemitério público, às 15h30. Eu não conheço muita gente por aqui, então peço que vocês espalhem a notícia para os amigos. Vai ser uma boa oportunidade para vocês se despedirem dela, não deixem de ir. - Falei sorrindo.
- Velório... é oficial então... - Moon pensou em voz alta, encarando o nada.
- Vou pensar em um discurso digno para ela. - Ruby prometeu.
- Que roupa se usa no velório? - Questionou Jamal, atraindo olhares furiosos dos amigos.
- A que você se sentir mais confortável, meu bem. - Respondi sorrindo. - Se precisarem conversar, desabafar, contem comigo. Preciso ir agora, se cuidem!
Eles acenaram para mim e saí caminhando de volta para casa, o tempo anunciava uma chuva daquelas. Estava na esquina de casa quando por puro instinto olhei em direção a casa dos Santos. Ele estava lá, sentado no sofá de sempre, me encarando. Abaixei a cabeça e ia continuar a breve caminhada até minha casa quando meu celular vibrou, era Alejandro.
VOCÊ ESTÁ LENDO
♱ ENTRE A CRUZ E A ARMA ♱
Não FicçãoEla sabia no que estava se envolvendo, havia se preparado para isso e aceitava as consequências por um objetivo maior. Mas nenhum treinamento a preparou para o amor. "- Volta aqui, me deixe explicar! - E não ouse voltar para o meu bairro, vadia."