29 | deusa afrodite é um maldito clichê

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— Não é ciúme. Eu só não entendi por que justo ela precisa ir com você.

— Eu já disse... a clínica onde meu pai está internado é fora da capital, mas os pais de Sofia moram perto, então eu sempre fico na casa deles e ela vai comigo, porque senão seria meio estranho... os pais dela não gostam muito de mim...

— É isso que estou dizendo... você poderia ficar em um hotel ou algo assim.

— Hotéis são caros... — Ela contrapõe, me observando enquanto junto todas as nossas coisas para irmos embora.

Não é o melhor desfecho para o pedido de namoro, descobrir que minha recém-namorada vai passar um fim de semana fora com a amiga com quem costumava... enfim.

De qualquer forma, ela vai passar esses dias fora para visitar seu pai, então estou especialmente tentando não ser muito incompreensiva ao mesmo tempo em que não consigo desapegar do incômodo.

— Eu poderia ir com você e pagar para nós duas — Sugiro, então.

— Você sabe que ainda é desconfortável para mim, So... — Ainda assim, ela se opõe.

Eu arrumo minha postura, de pé, e desvio o olhar por um instante por saber que não devo insistir mais. Diante do meu silêncio incomodado, Simone abraça o buquê contra suas roupas ainda úmidas e caminha até parar em minha frente. Sua mão livre segura a minha, então ela se inclina um pouco e beija minha bochecha antes de acariciar meus dedos com seu polegar.

— Eu não faria nada que pudesse te magoar, Soraya... você pode confiar em mim.

— Eu sei que posso, Simone. E eu confio. Mas ainda é tão desconfortável lembrar que já vi vocês duas juntas e... — Eu suspiro, percebendo que não é tão diferente da minha situação. Eu também já beijei e fiz muito mais com Carlos e, apesar de toda a contrariedade, nós somos amigos agora, sem qualquer interesse em retomar o que existia antes. Apesar de tudo, eu não tenho motivos para acreditar que Simone e Sofia não podem viver o mesmo que vivo com meu ex. — Esquece.

— Soraya, não fica chateada, por favor...

— Não, sério, tudo bem. — Eu a tranquilizo da melhor forma que posso. — Eu não vou fingir que estou radiante com a ideia, mas... ok. Não quero começar nosso namoro com uma crise que, sei lá, pode ser evitada.

Ela sorriu, a despeito da situação, e me beijou na bochecha mais uma vez num gesto que parece quase de agradecimento.

— Obrigada. Da próxima vez a gente pode ir junto... e você pode conhecer meu pai, se quiser... mas agora ainda é muito desconfortável. Desculpa...

— Relaxa. Eu passei por uma sequência de situações fora da minha zona de conforto nos últimos tempos. Não adianta forçar, nós duas sabemos que o resultado é desastroso... — Tento dizer com o máximo de calma que posso ter. No fim, completo com um dar de ombros desajeitado: — Mas eu gostaria de conhecer seu pai, quando você se sentir pronta...

Ela sorriu novamente, entrelaçou nossos dedos e mordiscou o próprio lábio antes de deixar uma risadinha adorável dar as caras. Então, perguntou:

— É muito cedo pra dizer que você é a melhor namorada do mundo?

— Nah. Aliás, você está meio atrasada para dizer isso. Eu esperava ouvir logo depois do pedido, porque, sério: foi sensacional.

Simone riu, dessa vez de verdade, e o som de sua risada é o suficiente para me acalmar um pouco mais. Um pouco. Não vou forçar a barra com minha própria consciência para me convencer de que vou lidar tranquilamente com o fato da minha namorada viajar com sua ex-sei-lá-o-que, mas realmente vou me esforçar, pelas circunstâncias.

AFRODITEOnde histórias criam vida. Descubra agora