2- COISA MÁS COM VOCÊ

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Quando você entrou o ar saiu

E todas aquelas sombras ali se encheram de dúvidas

Eu não sei o que você fez comigo

Mas eu sei que isso é verdade

Eu quero fazer coisas realmente más com você

Jace Everett - Bad Things


—S-senhor... — disse num fio de voz —, senhor Eric Northman, por acaso o senhor sabe quem eu sou?

Ele apenas me olhava com a cara mais branca e sem expressões que já tinha visto. E eu me agarrei ao frágil fio de esperança que com todo aquele barulho ele não tivesse me escutado. Peguei fôlego e tentei mais uma vez:

— Senhor E-Eric Northman... — gaguejei e minha voz saiu um pouco mais alta e mais aguda. O discurso que estava na ponta da língua mais uma vez se perdeu no nervosismo. — Eu tenho uma proposta... é... O Senhor, já me viu alguma vez na sua vida?

E a emenda saiu pior que o soneto.

E diante do silêncio sepulcral do vampiro, eu parecia estúpida parada ali. Era óbvio que ele estava me ignorando. O que eu precisava fazer para ele me dar atenção? Eu deveria plantar bananeira, gritar ou xingá-lo, me jogar aos seus pés?

Uma parte estranha do meu cérebro, quase como se não fosse minha, borbulhava orgulho e uma leve irritação, e o foi esse orgulho que me manteve ereta como se eu fosse tão digna quanto alguém da realeza. Aproximei-me mais do trono e o encarei como se ele não pudesse arrancar minha cabeça num piscar de olhos e deixei a irritação falar:

— Eric, você sabe quem eu sou, não sabe?

Chamá-lo apenas pelo nome, com tanta firmeza, foi algo arriscado, mas deu certo. Ele ergueu as mãos entrelaçadas até a altura do rosto, roçando o queixo, boca e nariz no indicador em riste. Eu tentava controlar a respiração e também o suor que começava a escorrer pelas costas. Se o que as pessoas falavam sobre vampiros era verdade, todos ali, inclusive Eric, podiam sentir que eu fedia a medo.

— Oh, querida, por acaso, fiz coisas más com você?

Ele descansou as mãos no braço do trono, mostrando os caninos para logo recolhê-los deixando um sorriso cínico na cara. E só então entendi a insinuação. Engoli em seco, não conseguiria dizer que não me lembrava sem me sentir humilhada.

Neguei com a cabeça com a mesma intensidade que eu desejava não ter dormido com ele. Eu só tinha dezessete anos quando tudo aconteceu e esse cara, apesar de aparentar um pouco mais de vinte seis, talvez trinta, deveria ter, chutando no mínimo, uns cem anos.

E mais um silêncio opressivo se instalou.

Dava pra sentir todos os olhos sobre mim, me julgando assim como eu fiz, pensando que eu era muito corajosa ou muito burra. E numa rápida examinada em volta, não só confirmei a sensação como percebi a forma que a primeira vampirófila rejeitada me olhava.

Tinha tanta raiva e mágoa que parecia que estivesse roubando algo dela. Ao voltar a atenção para o vampiro, compreendi. Ela estava enciumada porque Eric me deu cinco minutos de atenção.

Com o cotovelo apoiado no braço do trono, ele descansava a cabeça na mão espalmada, olhando como se estivesse me vendo pela primeira vez. Como se visse minha alma. Era tão intenso seu olhar que o tempo foi suspenso, e minhas vísceras se desfizeram e refizeram como numa montanha russa. Só havia eu e ele no salão. E seus olhos frios, pareciam tão calorosos. E seu rosto de um branco pálido, parecia corado. Um nome veio à mente, e com ele, algo morno, mas ele fugiu quando o vampiro quebrou o encanto fingindo um bocejo. E logo em seguida ele balançou a mão me dispensando como se eu fosse um mosquitinho.

Respirei fundo lembrando do porquê estava ali.

—Eri.. Senhor, alguns anos atrás, quatro, pra ser mais específica v-vo.. O senhor não foi ... É... teve um incidente com drenadores próximo a Sainte Croix des Âmes?

—Não.

Mentiroso

Sempre soube que não era uma beldade, quem sempre passava e fazia os outros entortarem a cabeça era Cíntia, minha amiga do abrigo, mas eu tinha beleza. Minha boca era bem desenhada e carnuda, meu nariz pequeno e um pouco largo me dava um ar arrogante e delicado. Minha pele marrom era macia e brilhante. Também sabia que não tinha uma personalidade efervescente e sedutora a ponto de marcar alguém. Portanto, até aí, tudo bem ele não se lembrar de mim. Mas se tinha uma coisa da qual eu tinha certeza é que vampiro algum esqueceria o dia que foi capturado.

— O senhor tem certeza? —Minha voz tremeu de indignação.

—Sim, querida. Já disse que não.

E num piscar de olhos, o vampiro que estava na minha frente, não estava mais. 

Das cinzasOnde histórias criam vida. Descubra agora