41- SINTO NADA

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Do tempo que fiquei na casa do Eric, por causa do acidente de carro e que parecia fazer meses mas eram só dias, eu nunca estive no seu escritório. Sempre esteve fechado e naquele dia estava aberto. E foi lá que esperei por ele.

Os móveis e as cores seguiam a mesma ordem do resto da casa. Ali pedras bonitas também eram expostas junto a vasos de cerâmicas. Havia uma quadro, uma gravura emoldurada para ser sincera, de um barco viking. Ela parecia tão antiga E estava bem atrás de sua cadeira e mesa mogno escuro. E em cima da mesa, havia muitos livros abertos; folheei alguns, tirei outros da estante lateral, passei os olhos, os devolvi, e voltei a olhar os livros em cima da mesa.

Curiosa, puxei uma das gavetas e sem resistência ela se abriu e um caderno de couro escuro com folhas bastante amareladas me chamou atenção. A letra era muito feia, quase um garrancho, uma mistura de grego comum com outras que nem fazia ideia de qual era, mas o pouco que entendi puder perceber que era um diário. E obviamente, quis ler.

Quem escreveu parecia, no começo, com raiva, " Nunca mais terei mestre ou senhor" "matei todos e usei seus corpos" ou "enterrei seus corpos", não consegui entender muito bem. E depois, relatava sobre um ser místico, dourado e único, um ser poderoso e que de alguma forma pereceu na mão do autor do diário. " Conquistei seu amor e confiança, o fiz me deseja... revelar seus segredos" E eu via nascer uma nova obsessão, páginas e páginas sobre os poderes, longevidade concedida ao matá-lo, sobre a necessidade de encontrar a outra parte, o consorte, daquele ser. " o cerne da vida deve ser consumido ainda em vida"

Sentada na cadeira do escritório, tentava fazer remendos com as informações que conseguia quando Eric chegou e veio direto na minha direção tirando o livro da minha mão e me puxando para um abraço. E todo o ressentimento que nutri durante o dia por ele, se foi. Era infinitamente bom estar em seus braços.

— Achei que não me perdoaria, amada. Que não entenderia meus motivos.

— É o que você é, não, é?

— Venha. — Colocou-me no chão. — Vamos consertar esse pescoço, escuto ele ranger a distância.

Eu definitivamente era uma pessoa pequena, mas a pessoa, ser, que vi parada na sala, era menor. Medindo um 1,40 no máximo, ombros largos e voz grossa. Pele branca enrugada, cabelos loiros cor e aspecto de palha, vestindo um jaleco e segurando uma maleta, ordenou:

— Beba isso e deite-se na mesa.

Ela me entregou um frasco pequeno com um líquido transparente. Olhei dela para o Eric

— Drª Ludwig é uma médica especial, apesar dela não me amar, ela ama meu dinheiro e vai nos ajudar. Não é mesmo Drª Ludwig?

— Não tenho a noite toda, vampiro. Manda sua humana beber logo o anestésico.

Aquilo tinha um gosto terrível, mas logo eu me senti tão bem. Tão leve e feliz. E Eric me deitou em sua mesa de centro, e não sentia nada, nem meus pensamentos direto.

— Era para ela ter apagado — continuou—, mas parece que ela está bem acordada e numa realidade diferente. — A voz dela parecia vir de um lugar muito longe, e era tão engraçada que quis rir. — Segura ela, vampiro, ou posso matá-la aqui.

Com suas mãos enormes, Eric segurou minha cabeça virada em sua direção. Ele estava agachado e não tirava os olhos dos meus.

— Vai acabar rápido, confia em mim.

—Eu realmente confio em você, infer...— Ele colocou o dedo sobre meu lábio interrompendo meu xingamento. E de novo aquela incerteza me atravessou misturada com carinho. Por que raios ele se sentia mais preocupado do que eu?

Das cinzasOnde histórias criam vida. Descubra agora