45- O AMOR MACHUCA, BABY

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Cheguei no meu prédio muito antes do cair da noite. Meu carro cheio de poeira parado no estacionamento era sinal do tempo que estive longe e que o apartamento ainda era meu. Subi as escadas correndo e tirei a chave reserva debaixo do capacho.

A casa estava abafada, suja e com comida estragada deixando o ar insalubre. Abri a janela, joguei lixo fora e tomei banho. E fiquei sentada esperando. Não sei bem o que esperava, mas fiquei lá ansiosa olhando para a porta.

Quando a noite caiu, aquele ruído em minha cabeça voltou. E não demorou muito para que Eric entrasse pela porta.

— Onde esteve? — ele disse, bastante irritado. E veio na minha direção me abraçar daquele jeito bruto e passional dele. — Não conseguia te sentir em lugar nenhum.

— Tá me apertando.

— O que aconteceu, por que não parece feliz em me ver depois de todo esse tempo?

— Você achou que eu fosse o Mogli ontem e quis me largar no meio de uma floresta e eu descobri que você vem mentindo. Então... desculpa não compartilhar da sua animação.

— Isso faz mais de seis meses.

— Pra você faz esse tempo todo, pra mim só passou horas. — Seu olhar me implorava por mais informação. — Eu estava no salão do tempo dos... sei lá o que eles são, a gnose, quer dizer, Kali me levou para lá.

Segurando meu ombro, ele se afastou. Os olhos dele percorriam meu rosto e corpo, me analisando.

— A polícia de Shreveport ficou na minha cola todo esse tempo. Cintia e Belinda não acreditavam em mim também e tive que deixá-las fazer os cartazes e divulgar seu desaparecimento. Te denunciaram para o conselho dos vampiros... tive que provar que você nunca participou de nenhum tipo de clube contra vampiros. Tudo isso enquanto lidava com meu bar fechado e todas as consequências dos atentados... e o pior era achar que estivesse morta.

Os sentimentos do vampiro eram sincero, mas os meus também eram. Não iria me desculpar, não foi minha culpa.

— A gente precisa conversar, mas não agora, agora tenho uma coisa em mente: acabar com a necromante, preciso de ajuda para matar ela.

Ele não bateu palmas nem fez nenhum gesto exagerado, mas pude sentir sua animação e orgulho transbordar. Talvez eu ganhasse um troféu de melhor namorada do mundo. Sentando na poltrona da frente, ele me perguntou:

— Como planeja fazer isso?

— Não sei, nunca planejei isso antes. Mas eu preciso achar ela primeiro. E acho que sei como.

Pulei a parte da história em que a necromante devorou o cerne da vida do Dragão Dourado, o coração para ser específica, e com isso absorveu muito, talvez mais da metade da essência do ser que foi parte minha. Só que ao fazer isso, partículas se dissiparam pelo mundo, criando novas vidas. Eric sabia o suficiente para chegar sozinho nessa conclusão, se é que ele já não soubesse.

Expliquei que tinha uma ou duas certezas sobre a necromante:

— Vi Acácia do quarto dela vasculhando toda a ilha a sua procura. Foi na época em que você foi preso e enforcado. Ela conseguiu te encontrar só pela aura... se Acácia que era preguiçosa e relapsa quantos aos poderes conseguiu essa façanha. A necromante também consegue. As duas dividem a mesma essência. Mas o alcance dela não é grande, lembro de ler algo assim naquele diário. O diário da necromante que você tem guardado...

O olhar que dei para Eric deixou claro que eu sabia o que aquilo significava. E continuei:

— A vida extraordinária que a necromante consumiu ressoa em algumas pessoas, pessoas que são de certa forma parte daquela vida. A aura brilha diferente... algumas mais outras menos em tons de dourado. E tem a canção... — Era realmente estranho Eric nunca ter ouvido o chamado, sendo ele quem era. — É assim que ela confirma as vítimas. É como os morcegos se localizando pelo som, lembra da primeira vez que a gente sentiu a presença dela? Não faço ideia de porquê ter conseguido resistir ao chamado, mas a questão é... se eu escuto, ela também pode me escutar.

Das cinzasOnde histórias criam vida. Descubra agora