II - A história dos irmãos

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Mike, Brad e Rob eram três irmãos que partilhavam o apelido Park, mas apenas para efeitos de identidade e de estatística. Eles, na realidade, não eram irmãos, nem se chamavam Park. Mesmo os nomes próprios eram uma invenção necessária para que não desconfiassem da sua natureza, pois os seus verdadeiros nomes, com apelidos incluídos, se tinham perdido no tempo e jaziam incógnitos sob os mistérios do passado.

Os três irmãos Park, e continuando a identificá-los desta maneira para que a explicação tenha um ponto de partida comum, eram criaturas fantásticas. Dois deles eram vampiros, Mike e Brad, e o terceiro era um feiticeiro, o Rob.

Como tinha começado a sua história?

O início fora igual a histórias semelhantes – com tragédia, perda, lágrimas e uma metamorfose indesejada que acabou por ser crucial para a sobrevivência e para a continuação. Cada um deles acordara para aquela existência em momentos diferentes, mas o destino levou-os a que se juntassem para que, como um grupo, conseguissem enfrentar os desafios.

Rob fora abandonado numa floresta quando era uma criança de apenas dois anos. Os pais não tinham como alimentá-lo e deixaram-no para trás, para que fosse recolhido por alguma alma caridosa, ou, na pior das hipóteses, fosse devorado por lobos. Aconteceu a primeira hipótese – Rob acabou por ser encontrado por uma velha que o levou para a sua cabana.

A velha era uma bruxa que se encantou com os modos educados e mansos do menino. Como não havia nenhum bilhete com ele, nem sequer uma qualquer indicação nos farrapos que lhe serviam de roupa, a velha chamou o menino de Gregory. Criou-o com um sentimento misto de ternura e de interesse. Não se afeiçoou muito a ele, usava-o para que lhe fosse fazer recados à aldeia ou para apanhar ervas e raízes na floresta, mas também não conseguia tratá-lo mal. Dava-lhe um lugar acolhedor para dormir junto ao fogão e consentia em partilhar os restos das suas refeições.

O menino foi crescendo. Tornou-se forte, alto e bonito. A velha bruxa, que por meio de um feitiço lhe atrasara os efeitos do envelhecimento, foi se tornando invejosa da juventude do rapaz. Como ele confiava nela e como via-a a trabalhar nas suas mezinhas e mistérios, não desconfiou ou protestou quando a bruxa lhe começou a pedir que fizesse, semanalmente, às sextas-feiras, uma dádiva de sangue. Só umas gotas, depois passou a ser um fio, por fim já era uma malga cheia que o deixava tonto, apesar dos seus saudáveis quinze anos.

Numa dessas noites, Gregory recusou-se a dar o seu sangue à velha, que o usava para aprimorar um feitiço que a iria tornar jovem e bela como o rapaz era. A velha ficou furiosa com a recusa. Agarrou no seu punhal talhado em obsidiana, com punho de marfim, e espetou-o no coração do rapaz que caiu fulminado. Recolheu todo o sangue que quis e levou dois dias e duas noites a trabalhar exaustivamente no seu feitiço.

Mas o que a velha desconhecia era que o rapaz estudava os seus livros mágicos em segredo e tinha encantado o punhal. Fizera-o por brincadeira e por rebeldia. Mal sabia ele que haveria de lhe salvar a vida. Com o punhal encantado cravado no seu peito, a sua alma não se escapou do corpo e o rapaz abriu os olhos ao fim de três dias. A velha exausta da jornada, porque tinha trabalhado sem parar no seu feitiço, dormia sentada na cadeira, dobrada sobre a mesa.

O rapaz levantou-se do chão onde tinha caído. Arrancou o punhal do peito. Já não havia mais sangue para correr, nem dor que pudesse sentir. Bebeu a poção que a velha cozinhava no pequeno caldeirão e tornou-se imortal. Tornou-se também num feiticeiro. Amaldiçoou a velha que nunca mais despertou – ficou naquela posição, sentada na cadeira, dobrada sobre a mesa, por toda a eternidade, num sonho sem fim em que era, finalmente, uma mulher bonita que saltitava por entre as neblinas da floresta. Mais tarde converteu-se em raiz, depois em árvore, e nunca deixou de sonhar.

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