IV - Aprendizagens

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Mike sabia que o Brad e o Rob tinham razão, quando lhe diziam que usar aquela capa era uma forma infalível de atrair as atenções que eles não queriam ter, mas custava-lhe largar a peça de vestuário por tudo o que esta significava.

No entanto, no primeiro intervalo, Mike concordou com a crítica de Brad que lhe disse assim:

– Andamos com esquemas para que não saibam que estamos juntos, sentamo-nos em lugares longe uns dos outros nas aulas comuns, escolhemos áreas de estudo diferentes para nos cruzarmos o menos possível, temos cada um a sua turma... e depois tens a escola toda a comentar sobre o que vestes. Sabes a quantidade de piadinhas que já ouvi com a minha audição hiperdesenvolvida? Tive de bloquear o alcance dos meus ouvidos porque já estou a ficar enjoado. Não estamos a ser muito coerentes, pois não?

– Amanhã já não a trago – disse Mike cabisbaixo. Ele também tinha ouvido tudo o que Brad afirmava ter escutado. – Mas hoje... como é o primeiro dia...

– O Mike não usou a capa no primeiro dia na escola da cidade de onde fugimos para aqui e ele acha que foi por causa disso que não tivemos tanta sorte – explicou Rob. – Nunca vi um vampiro tão ritualista e supersticioso. Devia ser ao contrário. Os humanos é que têm superstições idiotas contra... contra criaturas como vocês.

– Olha que os humanos também não gostam de bruxos – disse Brad.

– Não sou um bruxo. Sou um feiticeiro.

– Para os humanos isso é a mesma coisa.

– Não é, não!

Mike afastara-se com o aviso para terminarem a discussão, depois de verificar que a conversa deles não tinha atraído olhares curiosos. Sentenciou que teriam de continuar a limitar os encontros. Brad disse que iria tentar encontrar o laboratório onde iria ter química e Rob lamentou-se que dali seguia para uma aula de teoria do desporto, uma seca completa, pois se se tinha inscrito para aquela área era para ter atividade física, não para tirar apontamentos sobre diversas modalidades desportivas.

Mike foi à procura da sala onde iria ter Francês, uma das disciplinas específicas do seu curso. Por algum motivo achavam que os alunos de artes tinham de ser poliglotas, pois também iria aprender Alemão e Japonês, que ele escolhera de um lote de seis outros idiomas.

À entrada do pavilhão parou. Despiu a capa, dobrou-a em pregas impecáveis e colocou-a no braço. Também estava a ficar farto, admitia, dos olhares embasbacados dos outros sobre ele. Queriam saber mais sobre aquela opção estilística, mas como o reconheciam como um dos alunos novos, não se aproximavam com o à vontade que a abordagem requeria e deixavam-se ficar a inventar teorias.

Acariciou o tecido por instantes e lembrou-se da razão de insistir em usar aquela capa que era um acessório no mínimo anacrónico e esquisito para um adolescente de dezasseis anos. Sim, podia ser um ritual ou uma superstição, como dissera Rob, mas também era... um símbolo dos inícios. Porque fora quando ele estava finalmente pronto para ser um vampiro normal que aquela capa lhe fora colocada sobre os ombros – nova, pesada e perfeita. Estava na mansão e acabava de concluir com êxito a sua aprendizagem.

A mansão era uma casa enorme e decrépita que se encontrava abandonada. O seu estado era tão deplorável que ninguém se aproximava da propriedade e o local era tido como assombrado, o que correspondia à verdade. A mansão era o lar de um lote de criaturas fantásticas que aí eram acolhidas para serem reinseridas na sociedade das pessoas ditas normais e para que conseguissem sobreviver sem denunciar o seu estatuto especial. Funcionava como uma academia, uma escola, um reformatório, o que se lhe quisesse chamar. Era gerida por um mordomo, um morto-vivo fruto de uma experiência falhada com pedaços de cadáveres, assim muito ao estilo da criatura do médico Frankenstein.

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