Domingo, seis da tarde e alguns quebrados. Soube do horário por acidente. Um pai queria levar sua filha para casa pois já estava tarde, então alertou-a sobre as horas. Talvez tivessem algum compromisso, mas acredito ser pela temperatura. Esta caía bruscamente após o Sol sumir atrás da colina. E era outono, ainda. Perguntei-me o que a próxima estação nos reservava. Invernos rigorosos tomaram conta da cidade nos anos anteriores. O banco frio, à beira do rio, sustentava meu esqueleto e me dava um vislumbre do que poderia vir. Talvez, algum incômodo ao tocar superfícies frias pela manhã, ou um vento gelado ao abrir a janela. Um café que passaria despercebido e esfriaria mais rápido, um chuveiro incapaz de me esquentar.
Senti cansaço. Não físico. Na alma. Por algum motivo, o frio acalmava meus ânimos. Mas isso não me relaxava. Era como se me fosse permitido sentar e observar meus problemas através de uma visão panorâmica. Olhar a bagunça e não poder fazer nada. Apreciar a desordem e dar proporção à ela.
O emocional vem à tona. Cicatrizes profundas doem. Me lembram que estão ali. Me sinto um daqueles velhos que sentem as articulações doerem quando a temperatura cai, porém, nesse caso, é meu âmago que se abala.
Tudo isso passava pela minha mente, enquanto o rio seguia curso. Turbulento, mas, ao mesmo tempo, completamente estático. As ondinhas e quebras que se formavam nos mesmos lugares, o som fluído. Folhas e galhos que desciam ao sabor das águas.
E se isso não remetesse à nós? Um turbilhão a escoar em nosso peito e mente, num caos ordenado. Nossas cicatrizes muito bem desenhadas, mas em constante movimento, já que sempre aparece algo para avivá-las e trazê-las à tona.
Os últimos raios de Sol abandonaram o céu. Escuridão se instalou. Estrelas surgiram, Vênus anunciava sua presença, seu brilho ofuscava qualquer mínimo detalhe que tentasse chamar a atenção.
Resolvi me recolher. De fato, estava tarde e frio. Parei de tentar entender o curso que o rio formava dentro de mim. Mas, não sem antes dar um sorrisinho torto, quando percebi que tu provocou singelas ondulações em meu peito quando apareceu em minha vida.
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Essa toca que chamo de quarto
RandomE à noite, o único som que se ouve é o do teclado sendo judiado.