Capítulo 2

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Na verdade, ela é um elemento desconhecido
Nascido no inferno ou enviado do céu
Mas de qualquer forma eu gosto disso
Ela não é ácida nem alcalina
Presa entre preto e branco
Não exatamente de dia ou de noite
Ela está perfeitamente desalinhada."
Sleep Token -Alkaline


DEAMHAN

   Durante toda a infância da minha pequena criança, eu estive ao seu lado. Eu mantinha alguns serviços de assassino de aluguel para poder ter dinheiro. Independente do mundo em que vivesse, de onde você viesse ou do tipo de ser vivo que você fosse, dinheiro sempre irá dizer o que você pode ou não fazer, e eu nunca gostei de ser dominado.

Mesmo se tornando uma criança tranquila, mesmo sendo uma pré-adolescente que não dava trabalho, Luna possuía algo dentro de si que eu não conseguia ver. Eu sentia sua infelicidade, e mesmo sabendo que não seria o suficiente, eu tentava sempre agrada-la com algo. Ela desenvolveu um amor por jardinagem, então eu me passei por um bilionário que fazia doações algumas vezes para levar o orfanato em excursões a parques, assim como museus, já que Luna se interessava por história também. Eu não sabia se minha criança era uma grande gênia ou só fofoqueira, ela gostava de saber sobre tudo. Até planetário ela inventou de querer ir. E eu nunca diria não a ela.

Eu não sabia se ela realmente acreditava, ou se fazia como um meio de distração, mas até os dezoito anos ela fazia cartas para o Papai Noel, isso é hilário e eu queria muito tirar sarro dela por causa disso, mas também era triste. Luna não reclamava, não pedia nada verbalmente, eu só sabia o que ela queria quando orava -o que parou por volta dos seus catorze anos-, ou quando escrevia as malditas cartas. Aos catorze ela se tornou auxiliar de Dulce, a senhora gentil queria dar um emprego a minha menina, então inventou esse cargo. Como auxiliar, um dos trabalhos de Luna era cuidar das crianças de até oito anos, o que ela amava, e qualquer um poderia ter certeza disso. Minha doce criança tinha muito jeito com os pirralhos. Em todo natal ela ajudava crianças a fazer pedidos, ajudava a escrever cartinhas e não deixava nenhum de fora, ajudava com o desenho, e ela mesma escrevia as cartas. O que talvez fosse uma inspiração para criar a sua própria.

Só que, ao completar dezoito anos, um ano após a saída dela da escola, Luna teve uma péssima ideia.

Faculdade.

Para quê eu não sei. Hoje em dia os humanos conseguiam dinheiro sem precisar ir a faculdade, mas minha pequena e tola criança gostaria de ser médica. Ou pelo menos era isso que ela queria que os outros pensassem. Luna era um enigma, mesmo para mim, que a vigiava o tempo todo. Sua mente se tornou cada dia mais um mistério.

Médica de humanos? Eu detestava a ideia, mas não tinha muito o que fazer sobre isso. Nunca consegui ler sua mente, nunca tive muito controle sobre ela, mesmo que dissesse ao contrário, eu sabia que não era assim. Eu era como um fantasma, e por mim tudo bem ser um fantasma se isso for tudo o que posso fazer por ela.

Após passar no vestibular, para a despedida de Luna, Dulce organizou uma festinha no orfanato para a "filha querida", que era como a velha chamava minha criança.

-Minha futura médica! -A irmã a abraçou forte com os olhos lacrimejando sem parar, e eu não consegui conter o revirar de olhos. Tudo bem, Luna era incrível, mas para que tanta choradeira? Pela Deusa, que mulher dramática. -Estou tão orgulhosa.

O choro escorreu sobre seu rosto branquelo rosado e eu apenas assistia entediado, encostado no batente da porta da entrada do orfanato, enquanto via Luna colocar as malas no carro do Uber. Luna não chorava na despedida, não se emocionava muito, e até parecia um pouco ansiosa para sair dali, mesmo que eu soubesse que amava Dulce, porém também sabia que ela estava ansiosa para viver algo seu.

DeamhanOnde histórias criam vida. Descubra agora