22 - A verdade

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Se eu devo perecer pelo poder do fogo,
Ao menos deixe que seja o seu.
— Ovídio

A rua principal havia se transformado numa explosão de luz e cor. Quando Carlisle e eu entramos ali, a sensação foi de ser transportada para um mundo onde tudo era mais quente, forte e vibrante.

Haviam barracas coloridas por todo lado, bandeirinhas tremulavam acima de nós e a música e as vozes preenchia o ar, tornando-o abafado e denso mas de certa forma quase mágico. Todo ano aquilo não falhava em me divertir, como se fosse a primeira vez que estava vendo tudo. Como se algo em mim se renovasse junto daquela festa.

Mas ainda era difícil andar quando havia uma multidão indo de um lado para o outro, me empurrando para todos os lados ao mesmo tempo, então tive que puxar Carlisle para um espaço na calçada entre duas barracas para não atrapalharmos aquele tráfego.

— O que quer fazer? — tive que falar alto para me fazer ouvir sobre o barulho.

Ele estudava o lugar sobre minha cabeça, seus olhos vagando de um canto a outro com fascínio.

— Você é quem manda — ele também falou alto e riu. — Eu não conheço isso aqui, lembra?

Certo. Eu estava no comando. Era bom lembrar disso. Tinha que lembrar disso. E de não me desviar do real motivo de ter ido com Carlisle até ali. Era tentador apenas aproveitar a noite, mas não. Foco.

— Tudo bem — olhei por cima do ombro, mas dali não dava para ver o local que tinha em mente. — Vamos para o final da rua, tem um coreto perto da prefeitura. Lá tem música e mais espaço.

— Mostre o caminho, então.

Era mais fácil falar do que fazer.

A multidão que preenchia a rua significava que eu tinha que segurar a mão de Carlisle para evitar perdê-lo, mas talvez pela quantidade de pessoas ao nosso redor ou então pelo contato prolongado com ele, minhas palmas estavam suando. O que não contribuía para aliviar o calor. Ou o nervosismo. Ou nada, na verdade.

Eu tinha passado os últimos dias tentando não pensar no plano para evitar me acovardar. Se pensasse demais, iria achar estúpido, rir de mim mesma e desistir. Nenhuma dessas coisas podia acontecer. E eu tinha que estar realmente focada no que pretendia agora, então tinha que repassar tudo.

Sim, o final da rua era um bom lugar. Com pessoas, mas não muitas. Eu poderia ver um local exato uma vez que estivesse lá, onde não nos ouvissem. Fora de vista. Longe mas também perto… Para o caso de ser preciso gritar.

Afastei esse pensamento. Não. Nada de gritos. Gritos não seriam necessários. Ia dar tudo bem.

Mas o que eu diria? Não podia falar o que surgisse na hora. Eu iria acabar tagarelando ou fazendo piadas sobre alho e crucifixos. Não. Pense, pense, pense…

A rua parecia infinita, não dava para vislumbrar seu fim por cima de tantas cabeças, e ao mesmo tempo o espaço ao meu redor ia se fechando como se as pessoas se amontoassem sobre mim e onde estava Carlisle?

A mão dele continuava sobre a minha, firme, a única coisa da qual tinha certeza enquanto tentava navegar naquele mar de gente, mas olhei rápido para o lado e dos rostos que via, nenhum era o dele.

Minha garganta apertou. Aquela garra invisível a arranhou. Meus dedos pegajosos começaram a deslizar…

Algo me puxou, fazendo com que eu me chocasse contra uma superfície dura e cambaleasse para trás, mas logo fui envolta pela cintura, evitando por pouco cair de volta na multidão.

Ofeguei.

Minha cabeça confusa se ergueu, encontrando naquela profusão de luz e cores uma que eu conhecia muito bem.

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