Chego em meia hora

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O trabalho estava uma correria, precisávamos renovar todos os exames dos jogadores, por causa das janelas de compra e transferência que estavam prestes a se abrir, eles precisavam estar com as fichas de saúde atualizadas, tanto para análise da própria diretoria do time quanto para uma possível venda ou empréstimo. A equipe estava ainda mais silenciosa que o normal, todos concentrados em suas funções e ignorando um ao outro.

Na hora do almoço eu estava com uma enxaqueca terrível, não sabia de onde havia vindo, mas estava me matando. Me arrastei até o refeitório e peguei pouca comida, o que Jude estranhou quando me sentei ao lado dele.

- Tá doente? - Perguntou imediatamente.

- Estou com uma enxaqueca horrível. - Respondi. - Acabou tirando a minha fome.

- Porquê não vai na enfermaria? - Ele pôs a mão na minha testa porque é sempre o primeiro impulso que alguém tem quando alguém adoece.

- Só preciso de uma aspirina. - Fiz pouco caso. - Vou tomar quando voltar pra minha sala.

- Tá bom. - Ele assentiu, mas passou o tempo todo me observando como se eu estivesse prestes a bater as botas.

O almoço foi tranquilo, depois de me verem acompanhada de Vincent na festa, os rapazes pararam com as cantadas sutis e me tratavam normalmente.

- Chefe, preciso da sua assinatura em alguns papéis. - Sebastian apareceu do nada no corredor.

- Porquê você não foi almoçar? - Questionei.

- Estava terminando de redigir essas paradas. - Ele chacoalhou uma pasta transparente.

- Me dá aqui. - Ele me entregou. - Vai comer alguma coisa, te entrego tudo assinado.

- Você é um amor. - Ele sorriu. - Volto a te perturbar mais tarde.

Apenas assenti enquanto ele se afastava na direção do refeitório. Catei um comprimido para dor de cabeça na bolsa e engoli, rezando pra que funcionasse, eu não costumava sentir enxaquecas, mas, quando acontecia, costumava durar um dia inteiro. Li e assinei os documentos que Sebastian havia me entregado e redigi os meus próprios, de avaliação da equipe e do trabalho dos jogadores. No entanto, minha cabeça começou a latejar e eu perdi a paciência com tudo que estava fazendo, arrumei minhas coisas, peguei os documentos que precisava devolver à Sebastian e saí.

Sabia que ele estava no campo, acompanhando o treino da tarde, então fui até lá. Os rapazes estavam  treinando passes enquanto Ancelotti praticamente pairava sobre eles, como uma coruja, aparentemente feliz com o que estava vendo.

- Sebas. - Chamei quando me aproximei o suficiente

- Ellie. - Ele tirou a atenção do treino. - Algum problema?

- Minha dor de cabeça piorou, estou indo pra casa. - Avisei. - Só vim te entregar os documentos.

- Você quer que eu te leve em casa? - Levantou, preocupado.

- Não precisa. - Lhe entreguei a pasta. - Vou ficar bem, só preciso ficar no escuro por algumas horas.

- Tem certeza? - Insistiu.

- Ellie? - Jude se aproximou correndo. - O que houve?

- Nada demais. - Ele parou ao meu lado. - Vou pra casa mais cedo hoje, por causa da enxaqueca.

- O remédio não adiantou? - Neguei. - Deveria ir ao médico.

- É normal, só preciso de um remédio mais forte. - Fiz pouco caso. - Eu tenho em casa.

- Eu vou pra lá assim que sair daqui. - Avisou.

- Tá bom. - Sorri, me sentindo bem com a preocupação deles comigo. - Tchau, rapazes.

- Avisa quando chegar em casa, tá? - Sebastian pediu. - Melhoras.

- Eu aviso sim. - Lhe dei um abraço de leve. - Obrigada.

- Se não melhorar até eu chegar, nós vamos ao médico. - Jude me abraçou também e deixou um beijo na minha cabeça.

Passei na farmácia antes de ir para casa e comprei um remédio próprio para enxaquecas, além de alguns chás calmantes. Preciso criar o costume de usar meus óculos de grau o tempo inteiro, o oftalmologista já avisou que não usar poderia acarretar em dores de cabeça, mas eu sou esquecida demais e acabo não usando.

Já em casa, engoli o comprimido e pus água pra ferver para o chá, enquanto isso fui tomar um banho quente e vesti um conjunto de moletom confortável. Schördringer passou a me seguir por onde ando, então fiz tudo sob a supervisão dele. Coloquei o chá em uma xícara e fui para a sala, fechei as cortinas e liguei a televisão, pondo finalmente o óculos no rosto. Passei algumas horas entretida e mal percebi que a dor aliviou, ainda não havia passado completamente, mas eu já conseguia olhar para a tela do celular sem sentir dor nos olhos. Já estava quase na hora do jantar e Jude ainda não havia chegado, foi quando Vincent me ligou.

- Oi Vin. - Atendi um pouco animada. - Tudo bem?

- Oi Ellie. - Ele cumprimentou de volta. - Estou bem. - Assenti mesmo que ele não pudesse ver. - Estava pensando em fazermos alguma coisa hoje.

- Hoje? - Desanimei e ele percebeu.

- Algum problema? - Perguntou antes que eu pudesse explicar. - Já tem compromisso?

- Não. - Respondi. - Estou com enxaqueca.

- Caramba. - Exclamou. - Bem, nesse caso, estou indo aí. - Avisou. - Levo o jantar.

- Sério? - Pensei que ele simplesmente iria marcar para outro dia.

- Claro. - Respondeu simples. - Precisa que eu leve algum remédio?

- Eu já comprei, obrigada. - Ele murmurou alguma afirmação do outro lado da linha.

- Chego em meia hora. - Disse por fim.

Eu não recusei que ele viesse porque preciso abrir o jogo com ele sobre o quão complicada minha vida amorosa é. Me arrependi de ter deixado ele se aproximar, de ter dado esperanças, não que ele esteja apaixonado por mim ou coisa assim, mas eu não sou idiota, sei muito bem por qual motivo ele pediu meu número de telefone.

Schördringer desceu do sofá e foi brincar com uma das inúmeras bolinhas que comprei pra ele e que estavam espalhadas por todos os cantos da casa. Aproveitei pra dar um jeito na minha cara, que estava péssima, lavei o rosto, passei um corretivo nas olheiras e um lip balm.

O interfone tocou e eu liberei a entrada de Vincent, digitando o código do elevador do painel do apartamento. Schördringer percebeu a presença de alguém que ele ainda não conhecia alguns segundos antes, correu pra se esconder dentro da casinha a praticamente sumiu no escuro. Eu amava quando ele fazia isso. Fui abrir a porta quando ouvi o elevador se abrir e dei de cara com Jude e Vincent com sacolas de comida na mão.

- Oi rapazes. - Sorri para os dois.

- Nos encontramos lá em baixo. - Jude sorriu e já saiu entrando. - Você melhorou?

- Sim. - Respondi. - Entra, Vin.

- Oi linda. - Ele se aproximou e me deu um abraço. - Eu trouxe lasanha.

- Eu trouxe arroz de lula e batata frita. - Jude avisou, já estava com Schördringer no colo.

- Bem, vamos comer os dois. - Deixei que Vincent entrasse e fechei a porta.

- Você adotou um gato? - Vincent riu. - Que bonitinho.

- Não é? - Jude balançou o filhote.

- Qual o nome dele? - Ele se aproximou devagar e Schördringer não teve muita reação.

- Meia noite. - Jude respondeu antes de mim.

- Não é não. - Retruquei. - O nome dele é Schördringer, porque eu o achei em uma caixa.

- Nome complicado. - Ele fez uma careta.

- Eu falei a mesma coisa. - Jude se aproveitou.

- Vamos comer. - Ignorei os dois e fui para cozinha buscar a louça.

Yuánfèn - Erling HaalandOnde histórias criam vida. Descubra agora