Mise-en-scène AyA - Adapt [Finalizada]

Capítulo 2

ALFONSO

As portas do elevador apitam, depois se abrem com um zunido, e eu entro no escritório da VibeStudio em Midtown Manhattan pela primeira vez.

A decoração do lugar é moderna e espaçosa — paredes de vidro, poltronas de couro e um monte de plantas. O logotipo laranja e cinza da VibeStudio está por todo canto, ao lado de pôsteres de algumas das mais recentes produções originais da plataforma de streaming, como Os casos clandestinos do Detetive Yang, Showbiz, Festeiros e Os sonhadores. Janelas enormes dão para o extenso gramado do Bryant Park.

Fazia anos que eu não trabalhava para uma nova produtora. O estúdio em Miami onde eram filmadas minhas novelas já era tão familiar que eu quase não prestava mais atenção ao ambiente à minha volta. Apesar de os estúdios de filmagem da VibeStudio não serem ali, faço uma pausa para reparar no ambiente ao meu redor.

E para encorajar a mim mesmo.

Vê se atua direito, pendejo. Era isso que você queria.

O primeiro encontro com um novo elenco sempre me deixa nervoso, e o fato de que aquela produção em particular poderia significar tudo ou nada para minha carreira não ajudava para que me acalmasse. A VibeStudio era uma aposta e tanto para mim.

Uma pessoa da produção, que aguardava ali por perto, abre um sorriso amigável.

— Olá, sr. Herrera. Meu nome é Skye. Estou aqui para acompanhá-lo até a sala de conferências.

Skye tem o cabelo bem curtinho, uma pele de porcelana, usa um bóton que indicava sua preferência pelo uso de pronome de tratamento neutro e carrega um tablet debaixo do braço.

— Obrigado. — Eu afundo as mãos nos bolsos antes que começasse a roer as unhas. Eu precisava de algo em que me apoiar, alguma coisa para segurar. — Sabe onde posso conseguir um café?

— Vou levá-lo à sala verde primeiro — Skye diz, sinalizando para que eu seguisse seus passos. — O senhor pode relaxar um pouco lá antes da leitura.

Enquanto eu seguia Skye, repasso mentalmente as anotações sobre a série que o produtor havia enviado na noite anterior. Ainda que eu já tivesse lido aquilo incontáveis vezes, rememorá-las fazia com que eu me sentisse mais preparado e no controle da situação. Além disso, me dava algo em que pensar para que eu não ficasse remoendo o declínio de minha carreira de ator.

Carmen no comando contava a história da vida amorosa e das conquistas profissionais de Carmen Serrano, uma assessora de imprensa que trabalhava para uma empresa especializada em agendar eventos para celebridades de origem hispânica quando iam a Nova York. Eu tinha sido escalado para o papel de Lorenzo Vega, um cantor famoso. Na novela original, Lorenzo era um dos clientes de Carmen, mas os roteiristas tinham feito uma grande mudança: agora, Lorenzo seria o ex-marido de Carmen.

A dinâmica de um ex-marido era muito diferente da de um novo interesse amoroso. Teria que haver um nível de familiaridade imediata entre os personagens, uma certa bagagem emocional e uma tensão sexual subjacente. A série inteira girava em torno do desenvolvimento do romance entre Carmen e Lorenzo. E eu não apenas não tinha feito uma leitura para testar a química entre eles, como também nunca tinha visto minha parceira, Anahí Portilla. Claro, eu tinha interpretado dezenas de galãs românticos, mas conhecia bem a maioria dos atores da área de Miami e me sentia confortável com eles. Anahí era uma completa desconhecida para mim.

O sarrafo nunca tinha sido tão alto. Eu possuía uma boa fama no mundo das novelas latinas desde que estrelara La maldición del león dorado. E, até poucos meses antes, me sentia seguro nessa posição... até que peguei o papel de vilão em El fuego de amor. Ainda que tivesse sido uma mudança de ares bem-vinda em relação a meus típicos trabalhos como mocinho, os roteiristas me colocaram como parte de um triângulo amoroso e me mataram. Quer dizer, mataram o meu personagem. Mas o choque e a sensação de traição foram os mesmos. Na novela, eu havia perdido a vida e a mocinha para outro protagonista — Fernando Vargas, um ator chileno dez anos mais novo que eu.