Capítulo 10

137 10 0
                                    

ALFONSO

Vera está esperando por mim quando eu chego ao set para o ensaio particular cedinho na manhã seguinte.

As cenas seriam filmadas numa cozinha profissional que normalmente era usada para a gravação de talk shows, mas que havia sido redecorada para parecer a cozinha do andar térreo da casa dos Serranos em Spanish Harlem. A produção tinha revestido as superfícies com madeira escura e adornado o local com lâmpadas amarelas e potes de cobre, além de pendurar panelas no teto. Três paredes haviam sido construídas ao redor dos elementos da cozinha — uma pia de um lado, um fogão de outro, uma escada falsa no fundo e uma ilha com topo de madeira no centro.

Como ainda estávamos só ensaiando, eu estava de calça jeans e com a camiseta que coloquei depois de sair de meu treino na academia às cinco da manhã.

Anahí chegou logo depois de mim, parecendo radiante num macaquinho florido. Ela não era alta, mas parecia ser só pernas, e eu precisei me concentrar para não fica olhando feito um tarado enquanto ela desfilava para lá e para cá naquele shortinho.

— Bom dia — ela diz, abrindo um sorriso sonolento. Droga, ela é adorável.

Buenos días — respondo, e então me lembro de falar em inglês. — Cansada?

Ela faz que sim.

— Ainda não tomei café. Eu não queria... você sabe, tomar café antes de beijar alguém. É meio nojento.

Eu não consegui evitar um sorriso, pois tinha pensado a mesma coisa naquela manhã. Escovei os dentes, passei fio dental e então usei o enxaguante bucal três vezes depois de tomar café.

Ilba e Marquita chegam logo depois. Seria apenas nós cinco no set para o ensaio, a pedido de Vera.

Nós nos sentamos em cadeiras dobráveis enquanto Vera repassa os pontos que havíamos discutido no dia anterior em relação a comunicação e consentimento.

— Vocês dois chegaram a pensar em algum tipo de ritual? — Vera pergunta, direcionando seu olhar intenso e brilhante para mim e Anahí.

Carajo, eu nem tinha pensado naquilo, mas Anahí levanta a mão meio insegura, como se estivessem na escola.

— Tive uma ideia — ela diz com a voz vacilante quando seu olhar cruzo com o meu. — E se a gente fizesse... um "bate aqui"? Depois que Ilba gritasse "corta". Vocês sabem, para sair do personagem.

Eu recordo os oito anos fazendo o mesmo gesto com Tomás a cada vez que meu menino alcançava um objetivo: andar, amarrar o cadarço, aprender a somar, manobrar o skate e conseguir ficar de pé nele. Eu não conseguia me lembrar do nome daquela manobra, mas Tomás tinha ficado tão orgulhoso por não ter caído depois de realizá-la pela primeira vez que nós trocamos um bate aqui duplo, usando as duas mãos. Tomás chamou de ultra-bate-aqui.

Todas estavam esperando a minha resposta, então eu concordo.

— Ok. Claro, um bate aqui. — respondo, por fim.

Com Anahí aquele seria um gesto inofensivo, o som e o movimento das palmas das mãos servindo para nos lembrar de quebrar a estranheza natural de um beijo diante das câmeras.

Porque era estranho, não importava quantas vezes eu fizesse aquilo.

A última mulher que eu tinha beijado em cena fora uma atriz de novela experiente em El fuego de amor. Na verdade, nós já havíamos feito outro trabalho juntos, uns seis anos antes, quando também havíamos nos beijado. Nós dois fizemos piadas sobre aquele momento, brincando sobre como estávamos muito mais velhos naquele momento. Mas eu não tinha aquela intimidade com Anahí. Tudo o que tinha era aquela sensação de eletricidade correndo por minhas veias quando ela estava por perto.

Mise-en-scène AyA - Adapt [Finalizada]Onde histórias criam vida. Descubra agora