Acidente

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POV Caroline

Pense em ter uma filha e ela simplesmente ser levada de você. Todos os segundos desde que Helena foi sequestrada, apenas se passava pela minha cabeça que aquilo era alguma espécie de castigo. Castigo por no início da gravidez ter pensado em mil e uma maneiras de não ter a minha filha. Diria que isso é uma baita piada de mau gosto que o destino me apresentou.

Esses dias todos eu sabia que Rosa estava fazendo o impossível para trazer Helena de volta, eu até tentei ajudar, mas fui me afundando, perdendo as esperanças, era como se uma parte de mim tivesse morrido. Acho que nesse sofrimento sem minha filha, o luto pela Julia se fez presente. Eu ainda não tinha vivenciado o luto por estar mais preocupada em ser o apoio da minha namorada. Mas todos os sentimentos negativos vieram como uma avalanche.

Minhas amigas e minha família estavam fazendo de tudo para não me deixar desistir, mas eu via no olhar deles que eles também estavam perdendo as esperanças. Renata parou de levar meus sobrinhos para me visitar, pois eles sempre perguntavam pela prima. Minha mãe quase não falava mais nada perto de mim porque sempre começava a chorar. Meu pai resolveu voltar para casa porque segundo ele, havia perdido a neta e estava vendo a filha morrer aos poucos, depois de entender quem havia levado a Helena, ele não criou expectativas nenhumas. Ouvi uma conversa da minha mãe com Pri e Josy, Marcela havia ligado para ela dizendo que meu pai estava acabado, não largava um porta-retrato com a foto de Helena, estava sempre bêbado, não estava indo trabalhar, e mal se alimentava.

No começo, eu achei que meu pai apenas estava sendo um covarde, mas então percebi que ele só não queria que eu o visse daquele jeito, e nem queria me ver como estou. A Helena era a primeira neta dele, o xodó, quem mandava e desmandava nele. Eu sentia que havia perdido a minha filha, e ele sentia que havia perdido a filha e a neta de uma só vez.

Quando a Rosa me mandou aquele áudio, meu mundo terminou de desabar. Ali eu percebi que não só havia perdido minha filha, também estava perdendo minha namorada – eu ainda a considerava assim, mesmo com o pedido de tempo, ela não saiu do meu lado, e olha que eu merecia.

A espera estava me matando. E o pior é que eu apenas esperava um telefonema dizendo que tinha perdido Rosa. Mas quando o Machado entrou no meu apartamento e apontou a arma para as minhas amigas, ali eu não pensei em mais nada, não resisti, não tive medo, eu sabia o que ele queria, e eu já não tinha mais nada a perder. Se ele estava ali, o serviço já estava feito, nem Helena e nem Rosamaria voltariam para casa. Então eu desisti, que eu me junte a elas então, assim paro de sofrer e me culpar. Pode ser um pensamento egoísta, minha família iria sofrer, minhas amigas também, mas eu não.

Ao me despedir da Priscila, eu senti um pingo de esperança das minhas meninas estarem vivas, então pedi que ela cuidasse de Helena, pedi para que nossas amigas cuidassem da minha filha e da minha namorada.

Ainda no elevador do prédio, Machado começou sua tortura psicológica. Tive certeza que antes de morrer, iria sofrer mais ainda.

Carol: como você é capaz de machucar uma criança? – perguntei incrédula.

Machado: eu matei meu próprio filho – me assustei com sua frieza – acha mesmo que me importaria com a sua?

Carol: ela é só uma criança.

Machado: eu te avisei, você não me ouviu, isso é sua culpa também.

Ele me jogou no banco traseiro de um carro e saiu dirigindo como um louco. Aproveitei e coloquei o cinto de segurança, estava com medo de sofrer algum acidente e resolvi me precaver. Enquanto ele dirigia, ia falando algumas coisas e eu fui montando o quebra-cabeça.

Carol: então a tal inspetora Leda era sua capanga o tempo todo?

Machada: essa aí é só mais uma louca que cruzou meu caminho – falou com desdém – esposa do meu filho, sempre quis ter uma menina e não conseguia, foi assim que a convenci a participar de tudo, prometi que Helena seria a filha que ela tanto sonhou, dei um jeito de colocar Leda para trabalhar no colégio da sua filha, fiz a menina confiar nela.

Carol: vocês são doentes.

Machado: a culpa é da sua namorada que meteu o nariz onde não foi chamada – sentia ódio em sua voz – enfim, meu filho era um otário, foi só ameaçar a mamãezinha dele que ele aceitou fazer o que eu mandava.

Carol: mas e depois, Machado? – questionou – você me mata, se vinga, mas e depois? Você acha mesmo que ninguém vem atrás de você?

Machado: não se preocupe com o depois, querida – sorriu maléfico – você não estará aqui para ver.

Já havia aceitado meu fim. Percebi que estávamos pegando a estrada que liga BH ao estado de SP, algum plano ele tem, mas não vou gastar minha energia tentando descobrir, não irei mudar meu destino. Passei os próximos minutos relembrando dos momentos felizes, das pessoas que eu amo, dos momentos importantes, e principalmente, de cada momento com a minha filha. A culpa me corroía, há tempos não sentia isso tão fortemente. Em algum momento eu desejei não ter minha filha, e agora eu não a tenho mais. É minha culpa.

Tudo foi tão rápido. A derrapada, o grito de Machado, o barulho dos pneus na tentativa de frear o carro, e tudo rodando várias e várias vezes antes de um impacto me apagar. Achei que morreria de outra forma.









Curtinho, mas o anterior foi gigante, então relevem.

A foto foi escolhida porque escrevi esse capítulo na semana da despedida da Carol. Estou sofrendo, e quando esse capítulo for postado, Carol Gattaz não jogará mais pelo Minas oficialmente. É amigos, dez anos não são dez dias. Estou sofrendo.

(4/6)

Nossa Vida - RosattazOnde histórias criam vida. Descubra agora