Capítulo I

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 "A mente humana é realmente um enigma", pensou o jovem Felipe Andrade na manhã de uma segunda-feira qualquer de maio de 2027. E, como quase todo outro garoto de 17 anos, ele estava na escola.

Suspirou. Sua caneta titubeava entre as margens brancas de seu caderno, cruzadas por finos paralelos negros. Suas anotações não passavam de reproduções tediosas do que a professora passava no quadro. Na realidade, era quase como se ela não existisse — sempre que podia, largava seu instrumento de forma discreta e, com determinação, olhava para a direita. Do outro lado da sala, escorado em uma parede assim como Andrade, outro jovem se sentava, tão retraído e quieto como ele. Era Victor Loch, um garoto que ainda não tinha 17 anos completos, interagindo com seu ambiente de forma tão desinteressada quanto Felipe.

Suspirou. E, a esse suspiro, Felipe assistiu calmamente. Conseguiu quase tatear o ar entrando pelas narinas, perpassando os pulmões e, por fim, saltando pela boca. Era como ver a água mais pura fluir livremente pela Fontana di Trevi. Se sentia perdidamente encantado por Victor.

Ergueu seu braço por um breve momento, conforme sentia um desejo incontrolável de tocar os cachos emaranhados do outro garoto. No entanto, o toque foi puramente simbólico. Tão simbólico quanto sua paixão.

Suspirou. E então, os suspiros pararam de vez. Felipe estava sendo chamado para o consultório da psicóloga do colégio. Deixou seus pertences presos à classe e, fatigado, andou até o corredor, sua roupa desengomando um pouco mais a cada passo. Antes de sair, virou a cabeça para o lado, podendo ver Victor uma última vez. Ele o olhou de volta.

. . .

— ...E você realmente não consegue falar com ele? — perguntou Anna, a psicóloga escolar. Era uma mulher na beira dos seus 50 anos, trajando em si os cabelos embaraçados de uma pessoa desgastada por horas intensivas de trabalho. — Por que não?

— Acho que tenho dificuldade de falar com qualquer pessoa — respondeu o jovem. — Uma paixão tão... distante, como a que eu sinto por ele... Minha timidez não me deixa.

— Entendo. Talvez, se você conseguisse falar com ele, poderia ter a grande afronta que procura.

— Talvez — Olhou para os dois lados. — Mas não é sobre isso que eu queria falar.

— É sobre o quê, então?

— Eu... Eu... — gaguejava. Lágrimas saíram de seus olhos, inicialmente somente como gotas estancadas, gradualmente fluindo para torrentes impetuosas. — Eu acabei me cortando. De novo. E dessa vez foi muito feio.

Uma breve pausa se seguiu. Anna permaneceu com os olhos fixos em Andrade, que desviava a vista enquanto enxugava as lágrimas na manga de sua camisa social branca.

— O que você sente quando se corta? — a psicóloga enfim proferiu.

— Acho que não é sobre o que eu sinto. É sobre o que eu não sinto.

— E o que você não sente quando se corta, então?

— Angústia. Meu irmão mais velho, Oscar, tinha o mesmo problema na minha idade. É uma vontade desesperada de fugir de uma situação caótica. E eu sou rodeado por situações caóticas o tempo todo, desde muito novo. Eu já contei sobre como foi difícil, quando meu pai batia constantemente na minha mãe, quando o Oscar tava no auge da depressão e...

O som irritante do sino zumbiu por todos os andares. Felipe fechou os olhos, deixando que as lágrimas fluíssem livremente. Estava ansioso. Queria ver Victor novamente.

— Nos encontramos semana que vem — Anna balbuciou, levantando um leve sorriso.

Nesse instante, Andrade se direcionou para o corredor. Conseguia ver a porta de sua sala de perto. No entanto, não conseguiu chegar até lá, conforme sentiu uma mão apertar seu braço. O cheiro enjoativo de morangos denunciou: era a coordenadora da escola, Priscila.

— Felipe — ela começou, um sorriso artificialmente branqueado reluzindo em seu rosto. —, você está bem?

— Ah, sim... Por que a pergunta?

— Nada, nada. Só queria saber. Você sabe, se você tiver algum problema com seus colegas ou com a aula, eu sempre vou estar disponível.

— Tudo bem... eu acho. — Estava confuso.

— Você é um dos nossos melhores alunos, tira as melhores notas, e com certeza vai estar em destaque durante a graduação. Não quero que um jovem com um futuro tão promissor quanto o seu se sinta afetado por uma tristeza tão boba. Não desista, isso logo vai passar.

Engoliu um pouco de saliva. Não esperava ouvir aquelas mesmas palavras de novo, pela milésima vez. Estava cansado de ouvi-las, na realidade, de todas as bocas possíveis. Mas não é como se isso importasse mais.

— Obrigado, Priscila — disse, desbotando um sorriso falso no rosto, antes de voltar para a sala de aula.

Sentou-se calmamente em seu assento, não podendo escapar a atenção contra a ilustre figura que tanto lhe hipnotizara nos últimos dias. Por vezes, gostava de fantasiar uma dimensão em que estava confortável o suficiente para falar com ele, sem nada temer.

— Bom dia, turma — Uma voz grave interrompeu os pensamentos de Felipe. Era Rodrigo, um dos professores mais jovens do colégio, e também um dos mais queridos.

Por mais que possuísse uma estranha aura sombria em seus óculos quadrados e cabelos negros, sua simpatia era única e desigual. Conseguia tanto falar assuntos instigantes com as meninas quanto simpatizar com os assuntos superficiais dos meninos. Era, basicamente, o professor perfeito que todo aluno gostaria de ter. Ensinava filosofia e projeto de vida.

Felipe sorriu. Seria uma boa aula.

A Psicologia do AssassinatoOnde histórias criam vida. Descubra agora