Capítulo IV

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 Verônica estava ofegante. Suas roupas estavam amassadas, seus cabelos estavam embaraçados e sua maquiagem se espalhava pelo seu rosto, em grandes borras. Já havia dividido caminhos com Serena, e definitivamente não queria que ninguém a visse daquela forma — especialmente Diogo.

Foi até o corredor principal. Era possível ver as luzes emergenciais do refeitório de longe. Ali, Felipe abriu a gaveta de talheres, pegou uma faca e saiu. Foi ao banheiro masculino.

Verônica poderia, possivelmente, se importar com as circunstâncias estranhas daquele acontecimento. Porém, não conseguia pensar em quase nada senão o ricochete sonoro em seu cérebro: a voz doce e meiga de Serena, as lembranças, o prazer, a formosura... E, então, o fim. As palavras exatas, ditas em forma de sussurro, ainda ecoavam: "Agora vai comer uma fruta, por favor, por mim. Você tá tonta de fome".

Respirou fundo. E, ainda imersa em seu transe, foi até a gaveta aberta e olhou para os lados, certificando-se de que ninguém a veria. Assim que pôde confiar em sua visão, pegou, como o garoto que acabara de passar, uma faca. Era interessante como todas as facas da gaveta eram desnecessariamente longas e afiadas, e quase não haviam outros talheres. Provavelmente, isso não era só uma desagradável coincidência.

Apanhou uma lâmina qualquer, pelo cabo amadeirado. Era possível ver seu reflexo pela seção prateada do objeto. Dessa vez, não conseguia sentir nojo de si mesma. Ao invés disso, múltiplas sensações a dominavam, criando uma impressão inexplicável e, ultimamente, neutra da própria imagem.

Com a mão livre, pegou uma maçã aleatória, que estava unida a muitas outras em um compartimento da mesa de buffet. O fruto escolhido, por razões de segurança, estava enfiado na última camada da caixa. Trazendo-o para perto de si, conseguiu ver a si mesma, novamente, através da casca lustrosa do alimento. No entanto, seu rosto estava muito mais distorcido e difícil de observar.

Suas mãos tremularam. Não queria comer. Não se sentia confortável. Os únicos pensamentos que lhe invadiam a cabeça eram as incertezas de uma fobia amargurada, acumulada há muito tempo em um de seus pontos mais profundos da mente. Portanto, teve de acalmar a si mesma. "É só uma maçã", pensou. "Não pode fazer mal. E, além do mais, Serena me pediu".

Expirou, levando todas as suas mágoas embora com seu suspiro. Finalmente, pôde se centrar em seu estado neurótico de consciência. E, em conluio com sua paz interna, enquanto ouvia ainda mais a voz voluptuosa de sua musa refestelando em sua cabeça, fatiou com cuidado uma pequena lasca da maçã e colocou na boca.

Não demorou muito até que finalizasse a mastigação, mas o ato de comer certamente aliviou-a. Dentro de alguns segundos, a calma que já havia sido conquistada se multiplicou, e uma paz de espírito transfundiu uma confiança aguda. A garota logo arqueou suas sobrancelhas, finas e bem definidas, e olhou gloriosamente para a maçã, dando uma mordida direta na casca.

— Verônica! — Uma voz ecoou, dos corredores.

Um choque instantâneo tomou-a, uma vez que seu desejo imediato era não ser vista por ninguém. Contudo, logo que pôde interpretar a origem da voz, neutralizou seu susto: era Serena.

— Serena! Não me assusta assim! Eu achei que fosse outra pessoa!

Lopes logo gargalhou. Essa foi a primeira vez que Verônica ouviu-a gargalhar.

— Sua risada é linda — complementou, uma expressão de felicidade espantando o medo irracional que antes sentiu. O brilho hipnótico da paixão era evidente em suas pupilas dilatadas.

Com discrição, sua parceira parou de rir e se aproximou. Seu rosto estava lavado, o cabelo estava arrumado e as roupas não pareciam tão amassadas. Enquanto enrolava uma mecha do cabelo da outra garota em seu dedo, balbuciou:

A Psicologia do AssassinatoOnde histórias criam vida. Descubra agora