Marilúcia estava na cabine ao lado daquela em que aconteceu a morte de Luiza. A diretora permanecia ajoelhada em frente ao vaso sanitário, chorando e rezando. O cheiro predominante era de vômito, pois o corpo próximo ainda estava fresco e não tinha começado o processo de decomposição.
Se acalmou. A privada estava tão limpa que, pela água sanitária, era possível ver seu reflexo. Obra do faxineiro morto, Adhemar.
Subitamente, entre seus suspiros, a mulher pôde ouvir o camnhar de passos pesados: alguém entrou no banheiro.
— Quem está aí? — disse, de forma trêmula.
— Sou eu — Uma voz fria e grave respondeu.
— Ah! — Seu amargor se transformou em pavor, conforme empalideceu instantaneamente. — Por favor, Rodrigo, não me mate!
A porta da cabine se abriu. Como sempre, o homem estava numa postura rija com os olhos franzidos. Mas, agora, uma fúria muito mais evidente inflamava sua expressão, conforme seus lábios reverberaram:
— Eu não faria algo assim, Marilúcia. Não sou como você.
— Ah, que bom! — Suspirou de alívio, relaxando os joelhos sobre o piso. — Você vê, Rodrigo, eu estou tão aflita... Sinto muito por tudo, sei que foi horrível o que fiz, mas... será que não seria interessante se você visse pela minha perspectiva também? Aquele homem, bom, ele nem nos entendia. E aquela menina... Ela não esperava que ficaria tudo bem depois de ter dado aquele sermão, esperava?
— Olha, Marilúcia — Sua postura permanecia a mesma. — O que eu percebo nesse caso é que as duas pessoas que você assassinou eram negras.
— Ah, por favor, isso não tem nada a ver! — Tentou se levantar, mas escorregou no piso da cabine e caiu na mesma posição de antes. — Argh! Me ajude a levantar!
— Você sabe... Quando eu disse que não sou como você... Eu menti. Eu sou.
— Como assim?
Friamente, Rodrigo empurrou a cabeça de Marilúcia contra a privada. Um leve grito pôde ser iniciado, mas foi logo abafado pela água sanitária.
O professor firmou seu pulso, agachando-se calmamente. A diretora se debateu e lutou, seus braços desesperados flutuando pelo ambiente, mas seu corpo era tão fraco e frágil que nem foi necessário tanto esforço para barrá-la. Por um instante, toda a vida enrustida de Marilúcia pareceu desabrochar, de forma relapsa e súbita, como uma última imploração para que permanecesse existindo. Inútil.
Foi um processo premeditado desde seu início. Pareceu muito mais longo na prática do que na teoria — a todo momento, Rodrigo perdia um pouco mais da vontade de seguir em frente, enquanto suas mãos tremulavam sobre a vítima desesperada. Era como se um enorme peso, um fardo muito mais opressivo do que a massa da mulher, estivesse empurrando seu cérebro e puxando as suas mãos. No entanto, agora não mais podia parar. Precisava terminar o que havia começado.
Alguns minutos se passaram. A respiração do homem começou a ficar ofegante, conforme ele engoliu um pouco de saliva. Já a da mulher estava quase cessando, e sua boca não engolia nada além do oceano de água sanitária da privada. Rodrigo seguia constantemente preocupado, olhando para trás na esperança de que ninguém testemunhasse o assassinato. A infeliz porta da cabine estava aberta. E, a esse ponto, não havia como fechá-la. Por conta disso, permaneceu observando a fresta que a abertura mostrava. O simples fato de enxergar a sua vítima lhe atormentaria profundamente, mais do que ele podia aguentar para forçar o pescoço dela contra a porcelana.
Suspirou, tentando se acalmar. Por um momento, orientou todas as suas dissonâncias mentais, organizando-as num único pensamento de que, naquela situação, matar Marilúcia era o mais útil a se fazer. Obviamente, foi horrível ter enfiado a cabeça da mulher no vaso sanitário, assim como foi horrível, minutos antes, ter ouvido a confissão dela, ter presenciado o assassinato de Luiza, ter visto a diretora pondo o veneno de rato no prato e, mesmo podendo avisar, não ter feito nada. Sim, esse infortúnio fora certamente horrível. Se sentiria eternamente culpado com o amargor de poder ter evitado uma morte, mas se deixado levar por um pensamento utilitário. Porém, era o mais inteligente e o mais necessário a se fazer. Afinal, omitir-se significou ter uma concorrente a menos. E, agora, com o linchamento da assassina, eram duas.
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A Psicologia do Assassinato
Mystery / ThrillerNo ano de 2027, uma psicóloga macabra aprisiona dez pessoas dentro de uma escola, dando-os apenas uma ordem: matar uns aos outros sem dó nem piedade. Numa conjectura de medo e mentiras, cada um dos personagens se envolve em dilemas morais e facetas...