- Encontrou o que procurava, Vhenan?
Minha pele arrepia até os fios de cabelo da minha nuca.
- Não, mas encontrei outra coisa.
Ele caminha em minha direção, bem lentamente. Seus olhos fixos nos meus.
Meu primeiro instinto era tentar fugir, mas permaneço imóvel.
Ele para bem próximo a mim, tão próximo que sinto seu hálito quente.
- Não posso mais protelar minhas ações, Vhenan.
Imediatamente eu evito seu olhar, tentando esconder meus sentimentos. Ele segura meu queixo, o levanta para me encarar.
- O que a bruxa disse é verdade, Vhenan. Não há mais nada que você possa fazer.
Não consigo dizer nada. As palavras estão presas na minha garganta.
Ele solta meu queixo, seus olhos estão sombrios e sua expressão facial é séria.
- Me diga, Vhenan, como será?
Eu engulo seco, tento afastar meus pensamentos sombrios e pergunto.
- Como será... O quê?
A floresta se agita, uma ventania, árvores e folhas em um movimento violento, os lobos começam a correr, o grande lobo cinzento uiva.
Os olhos de Fen'Harel estão brilhando, em um tom de cinza sobrenatural. Meu corpo inteiro está tremendo. Eu sei.
- Eu estou pronto para te proteger, ma'lath, nunca irei te machucar. Mas o que vou fazer agora não poderá ser impedido ou revertido.
Eu agarro seu braço com força, já com lágrimas nos olhos.
- Não! Você disse que não seria no meu tempo! Você...
A ventania fica mais forte me dificultando a respirar, me obrigando ficar mais perto dele.
- Por favor, Solas! Preciso de mais tempo!
Ele não está olhando para mim. Parece em transe, como se eu não estivesse mais lá. Com os olhos fixos no céu esverdeado, ele gesticula como se estivesse desfiando a malha invisível do véu.
Eu sacudo seu braço com força, empurrando e gritando, tentando chamar sua atenção.
- Você não é assim! Pare! Me escuta!
Ele volta seu olhar para mim, seus olhos brilhando em prata.
- Thu ame ar, rahngirem? (Como eu sou, escrava dos homens?) - sua voz soa assustadora, ecoando, fazendo minha pele arrepiar.
Quase não tenho forças para falar, mesmo assim continuo:
- Ar ame tel'rahngirem! Ar ame giren'len ma vhenan! (Não sou escrava dos homens! Sou escrava do meu coração!)
Vejo um sorriso sútil em seus lábios, ele se abaixa e aproxima seu rosto do meu.
- I ahn mar vhenan dirth ma? (E o que seu coração diz?)
Esse é o ponto sem retorno, o momento que temi e esperei nesses últimos anos. Eu sabia que teria de decidir mas mesmo assim eu protelei.
Sei que estou errada, sei que devo proteger o meu lar mas... O que meu coração diz...
Baixo minha cabeça, dobro meus joelhos e me prostro diante do deus que escolhi seguir.
- Ma' sal'shira mar, Fen'Harel. Ar sul'ema ma vhenan, ma dar'missaan, ma'sal'shiral. ( Minha vida é sua, Fen'Harel. Te dou meu coração, minha espada e minha lealdade.)
Permaneço de joelhos, com a cabeça baixa, esperando. Não tenho certeza do que vai acontecer, mas nesse momento não sinto medo.
A ventania se acalma, os sons ao meu redor vão se tornando mais distantes. Sinto sua mão tocar o alto da minha cabeça.
- Levante-se, Vhenan. Venha, temos muito a fazer.
Eu olho para cima e o vejo com a mão estendida para mim, um sorriso genuíno. Eu seguro sua mão e me levanto, me perguntando se ele está me manipulando mais uma vez.
Mas, há muito, minha decisão foi tomada e não consigo lutar contra esse sentimento. Não mais.
Caminho ao seu lado, cabeça erguida, sentindo uma estranha sensação de calma e liberdade. Sinto o peso que carregava nos ombros desaparecendo.
Observo ele movendo lentamente a fina trama do véu, podendo ver através dele, o imaterial tão próximo, tão lindo e perigoso.
Olho para trás, as grandes muralhas do templo de Mythal parecem estar tão distantes, assim como toda a minha determinação. Deixei tudo para trás, pois sou escrava do meu próprio coração.
Sinto um toque no meu ombro.
- Não tenha medo, Vhenan.
Me viro e o encaro.
- Não tenho, ma'lath. Estou apenas me despedindo desse mundo que foi o meu lar.
Ele me olha com uma expressão curiosa.
- Não pense assim, Vhenan. Serei o seu lar à partir de agora.Desperto naquela manhã me sentindo vazia. O teto alto e luxuosamente decorado denunciando outro quarto, outra cama. Mas sozinha.
Me levanto e coloco o roupão de seda que está no cabide próximo a cama. Um belo tom de azul royal. O toque frio do tecido em minha pele me faz lembrar da realidade.
Saio do quarto e caminho pelo corredor, tentando me lembrar da noite anterior. Não me lembro.
'O que será que aconteceu?'
Do alto da escada vejo o grande salão. Está tudo tão silencioso.
'Estou sozinha?'
Vou até a cozinha e vejo uma bela mesa posta, frutas, café e pães. Nem penso e me sento para comer.
Sinto minha mente vazia desde ontem, não há foco nos meus pensamentos.
Bebo o café, meu olhar distante.
- Ah, achei que estivesse aqui, Vhenan...
Olho para ele com um sorriso. Me levanto e me curvo em reverencia.
- Não é necessário ser formal, Vhenan. Nada mudou.
- Solas, eu não me lembro de nada...
Ele sorri, me interrompendo.
- Um colapso assim que passamos pelo eluvian. Você parecia exausta então a carreguei até o quarto.
Seu sorriso me deixou um pouco desconfortável.
- E mudou minhas roupas enquanto eu estava inconsciente?
Ele corou e sacudiu a cabeça.
- Claro que não, Vhenan! Não sou um bárbaro e você sabe disso! Uma das criadas o fez.
Tombo minha cabeça para o lado.
- Por quê nunca vi... - me sinto uma idiota quando penso que se ele tivesse que cuidar de um palácio sozinho, recriar o império élfico seria moleza.
- Oh... Entendi... - escondo meu rosto atrás da caneca de café.
- Estou surpreso, Vhenan. Esperava mais resistência, talvez uma luta...
Me levanto rapidamente.
- Você sabia que eu não tinha a intenção de desistir, mas não sou capaz de me opor a você através da força.
Me sinto desanimada porque sei que ele tem razão. Nunca tive a real intenção de lutar.
- Meus sentimentos por você nunca mudarão, Vhenan. Mas entenda... - aquela pausa trás uma expressão triste em seu rosto. - Minha intenção nunca foi desistir. Vou reparar o meu erro.
Dou um longo suspiro, e seguro sua mão.
- Meu juramento foi verdadeiro, ma'lath. Tem minha vida e minha lealdade, e se isso significa que vou ver você queimar o mundo que amo, assim será.
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Sob o véu
FantasyBaseada no jogo Dragon Age Inquisition, o que significa que nenhum dos personagens e locais mencionados são de minha autoria. Pertencem ao estúdio Bioware e EA. Contada em primeira pessoa no ponto de vista da Lavellan, sobre os fatos que se dão após...