Uma sombra

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'Com a queda do véu uma nova onda da praga se espalha. O véu era a força que conteve a praga, também aprisionava Evanuris, o panteão dos elfos antigos.
Os Esquecidos, como eram chamados os inimigos desse panteão, era o grupo que Mythal e Fen'Harel faziam parte.
Fen'Harel era o embaixador dos Esquecidos por sua habilidade de comunicação e diplomacia. Ou manipulação.
Um novo chamado surge com isso os guardiões cinzentos, até então com sua localização desconhecida, reaparecem para combater esse mal que se espalha sobre Thedas novamente.
O exército de Tevinter defende sua fronteira ferozmente mas nada mais. Orlais está tendo dificuldades para conter a praga com os templários desorganizados desde a dissolução da inquisição. Mais um pecado meu.'

Do alto de uma grande árvore observo o sangrento conflito da vila de Courbeuf. Sinto uma enorme tristeza por não poder fazer nada além de observar. Um pequeno grupo de soldados completamente cercado.
Desvio o meu olhar e me preparo para partir quando noto um grupamento maior avançado em direção da vila. São os guardiões cinzentos. Meu sentimento de pesar diminui. Eu pulo de corro em direção a floresta, um sorriso vitorioso se abre nos meus lábios.
Corro acompanhada da minha alcateia, adentro uma caverna e aguardo a tempestade abrandar. Reflito sobre esses últimos meses. Desde que desisti de lutar me tornei uma observadora e mantive o registro, mais fiel possível, do que está acontecendo em Thedas. Ele não sabe, assim espero.
Descobri algo que, no meu intimo eu já sabia, mas que Fen'Harel guarda um segredo perigoso. Não sei o que é exatamente, mas segundo minhas pesquisas, não faz sentido ele ter criado, sozinho, o véu. O imaterial, a destruição da Cidade Dourada, o aprisionamento dos Evanuris... Mesmo sendo poderoso seria impossível para qualquer deus ancião fazer isso sozinho. Nem mesmo se Mythal o ajudasse, o que já foi provado que não.
A tempestade passa e eu volto para o meu caminho. O grande lobo cinza me acompanha para onde for, como um guardião. Eu o chamo de Gray. O meu guardião cinzento. Solas odeia.
Atravesso o eluvian saindo na encruzilhada, Gray não me segue até aqui.
Me sento em um canto próximo ao eluvian que leva até o palácio, sem vontade de voltar.
Esses últimos meses tem sido difíceis, ele quase não fala comigo. Não sou prisioneira, entro e saio quando desejo mas sinto um peso de toneladas em meu coração.
Acho que ele não confia em mim. Não o culpo, ele deve imaginar que todos são iguais, são como ele.
Recobro as forças e atravesso o eluvian, caminhando pelo corredor sentido meu quarto.
Tiro meu casaco pesado e o penduro. Tiro minha roupa, olho para o espelho e noto um grande hematoma na altura da costela, possivelmente do confronto com o Demônio da Inveja. Toco o local e me encolho com a dor.
- Ui!
Batidas na porta chamam minha atenção.
- Vhenan? Posso entrar?
Corro e puxo o robe.
- Sim, claro. - já vestida. Faço uma reverencia sútil.
- Deixe-me ver... - sem a menor cerimonia ele abre meu robe olhando a ferida.
-H-hey! Pare! O que está fazendo?! - dou um passo para trás e fecho o robe bruscamente.
Ele balança a cabeça e sorri.
- Ir abelas, Vhenan, fui rude.
- Tel'abelas! Só... Não faça mais isso... - me sinto envergonhada. Por quê?
Ele se sentou na beira da cama.
- Vai me contar o que aconteceu?
Me sento ao seu lado, não o encaro.
- Um grupo de refugiados estava cercado na floresta próximo ao vilarejo. Um demônio da inveja... Não pude deixar de ajuda-los.
Sinto o seu olhar ardendo em meu rosto mas não consigo olhar para ele.
- Você precisa parar de interferir, Vhenan. Minha paciência está acabando.
'Uma ameaça?' Olho direito em seus olhos, me sinto furiosa.
- O que você vai fazer, Fen'Harel?
Ele sorri.
- Quando me chama assim sei que disse algo errado. Por isso, me desculpe, ma'lath.
Rolo meus olhos, com vontade de lhe dar um soco. Preciso aprender a controlar esses pensamentos.
- Está irritada? Mas foi você quem jurou devoção. Só estou avisando que as coisas vão piorar e nada que... - ele para e se levanta. - Venha comigo.
Ele sai e eu o sigo, mais preocupada que curiosa.
Caminhamos para fora do palácio em silêncio. Andamos pelo jardim, sinto uma brisa morna tocando minha pele, mas o arrepio que me percorre não foi causado pela brisa.
Acessamos a área da cripta. Nunca tinha passado por aqui antes. Murais gigantes pintados no alto muro que circunda a propriedade.
Eu me distraio com as imagens que contam uma história. Fascinada, parece que contam o momento da queda da Cidade Dourada.
- Vhenan?
Sua voz me trouxe de volta a realidade.
- Como eu nunca vi isso antes?
Volto a segui-lo mas paro outra vez quando vejo uma figura gigantesca e assustadora pintada no painel. Já tinha visto várias outras referências do Lobo Temível antes mas nada tão assustador quanto àquela.
Fico ali observando os detalhes da pintura, uma criatura gigante de perfil, forma de lobo, bocarra escancarada, olhos vermelhos, 3 à vista, mas a figura negra cobria quase todo aquele painel.
Sinto sua mão em meu ombro.
- Vamos. Preciso que veja uma coisa.
Aceno com a cabeça e o sigo. Agora, com o coração ainda mais apertado.
Paramos em frente a uma estatua que parecia ser de Mythal.
- Ela foi a minha melhor amiga. Minha única amiga por muito tempo. Quando ela morreu eu fiquei devastado. Nunca mais pude confiar em alguém novamente.
Eu observo a estatua e ouço com atenção, mas essa inquietação crescente dentro de mim me faz ficar em estado de alerta.
- Até que conheci você, Vhenan. Você invadiu minha vida, cresceu dentro de mim de uma forma que... - ele parece estar procurando as palavras certas - Eu tentei evitar!
Nesse momento ele dá um passo para perto, segura minha mão fortemente. Fico surpresa pois em seu rosto, paira uma expressão aflita.
- Solas, eu... Você não precisa...
Ele aperta minha mão, seus olhos parecem vulneráveis. Seria manipulação?
- Você não sabe o quanto eu lutei, o quanto eu tentei não querer! Eu passei dez dias segurando sua mão. Não pela Ancora! Sua força, sua vontade de viver... - outra pausa, seus olhos brilham - Você falava, sabia?
Não sei o que pensar. Por quê ele está me dizendo isso agora? Por que ele parece tão... Inocente?
- Você chamava pela divina Justinia. As vezes chorava.
- Solas... Eu sinto muito mas eu não entendo...
Ele acaricia meu rosto suavemente, eu fecho meus olhos automaticamente, me sentindo fraca.
- Não sei porque você não confia em mim. Eu tentei te afastar, tentei me esconder de você. Você veio até mim, Vhenan. Eu quero te proteger, quero ter você comigo, mas...
Concordo com a cabeça e abro meus olhos.
- Estou aqui para você, Fen'Harel.

Sob o véuOnde histórias criam vida. Descubra agora