5 - Todas as mentiras contadas na escola

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Sabe, eu realmente não sou uma mitomaníaca ou algo assim, mas vez ou outra eu falo algumas inverdades (não mentiras) por motivos pelos quais nem sei listar.

Como quando, uma vez na sala, estavam conversando sobre um filme bobo de romance que todo mundo parecia ter assistido. A galera estava há horas em uma discussão fervorosa se o casal tinha ou não que estar juntos, e aí resolveram me usar como critério de desempate, já que eu não me deixo levar facilmente por clichês, então seria uma juíza ideal, segundo eles.

Eu apenas disse que não tinha visto o filme e também não tinha interesse algum em assistir. E eles ficaram semanas tentando me convencer do contrário.

Até me ofereceram um salgado da Vera como barganha, acreditam? Mas me mantive forte aos meus princípios. Continuei dizendo que me opunha a essa ladainha de casais "apaixonados".

Cara, fala sério?! Se liga no enredo: um bombeiro salva uma mulher de um incêndio acidental ocasionado por uma fatia de pão esquecida no fogão. A moça está no banho, quando o fogo se alastra pela cozinha, e então o bombeiro invade a casa e a encontra no banheiro (sim, ela a vê somente de toalha). Não estou exagerando quando digo que entre um cara me ver nesse estado, e eu ser consumida pelo fogo. Eu vou de segunda opção. Sinto calafrios só em pensar na primeira.

Tipo, eu sei que meu futuro marido vai me ver assim. Mas esse não é um problema para a Eva do presente, então quanto mais eu puder adiar, eu irei. Não que eu também não possa ficar solteira pro resto da vida, como Seu Tadeu, que nunca teve esposa. Embora eu bem saiba que ele vive as investidas de Dona Maria, que mesmo se fazendo de difícil, sempre o convida para os almoços de domingo.

Mas não é sobre isso minha insatisfação. Sabe o que descobrem no final da trama?! Que a espertinha ocasionou o fogo propositalmente. Isso mesmo. A bonita viu o cara na cafeteria vestido com o uniforme de bombeiro, e achou que seria uma excelente ideia provocar um "primeiro encontro". É bizarro. As pessoas ficam mesmo malucas umas pelas outras. E a propósito, sim eu tinha mentido. Eu até dei uma olhada no filme. Assistir é uma palavra forte demais para a situação. Mas de qualquer forma, eu jamais confessaria.

E isso também se aplica a esse caso.

— É sua primeira vez no circo? — a novata perguntou, enquanto girava a catraca da entrada.

— Sim — menti. Eu já disse, não sou mentirosa. Mas algumas inverdades são necessárias.

— Poxa, se eu soubesse não teria te trazido.

— Por que não? — perguntei curiosa, seguindo seus passos.

— Porque essa não é a melhor primeira vez em um circo. — A garota virou para trás. — Você tem que me prometer, — ela levantava o dedo do mindinho — que vai vir aqui no sábado para assistir o espetáculo. Eu te garanto que vai ser o melhor que você já viu.

— Como se tivesse alguma concorrência. — Dei risada.

— Por isso mesmo! Vai ser a melhor primeira vez oficial que alguém poderia ter. Hoje vai ser apenas um tour, e no sábado a sua verdadeira experiência Épicus. Pode ser? — Ela levava o dedo para mais perto do meu em uma iminência de juramento.

— Eu não posso prometer isso — confessei.

Seu braço caiu rente ao corpo, e ela fez uma cara chateada. NÃO! Eu quero de volta aquele sorriso lindo. Não faz essa carinha por favor.

— É que... — Eu encarava os olhos antes imponentes, mas que agora mais se pareciam com os de um cachorrinho manhoso. — Ah... — Meu Deus, eu ainda vou processar os olhos dela. Como pode algo me provocar tantas atitudes impensadas? — Pode ser... — assenti receosa, cruzando meu mindinho ao dela.

Sáfico | Cartas de AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora