29- Isso não parece o céu

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— Olha o passeio na cidade! — O marcador anunciava. A música típica de São João marcando presença no fundo.

Os numerosos casais que participavam da quadrilha deram os braços.

— Preparar para o cumprimento — gritava o marcador. — Damas pra um lado, cavalheiros pro outro — ordenou.

E quando não tem cavalheiro?

Mencia deu uma risadinha, percebendo que eu fiquei parada, enquanto todos já se organizavam.

Ela andava de costas para um lado, apontando com a cabeça para eu ir para o oposto.

Ficamos uma de frente para a outra a uma distância de uns 10 passos. Mas parecia longe demais. Porque era Mencia Épicus olhando para mim. A uma distância de 10 passos.

— Dama cumprimenta cavalheiro! — Pedia o condutor da quadrilha.

De novo, e quando não tem cavalheiro?

As meninas se aproximavam da coluna em que Mencia e os garotos estavam. Mas eu fiquei ali, parada.

Ela gesticulou algo com as mãos, rindo.

— Cavalheiro cumprimenta dama!

Mencia Épicus se aproximava de mim. Com o galante, o sorriso e uma astúcia de dar inveja em Pavão, o Sedutor do Sertão.

Ela tirou o chapéu da cabeça com os olhos nos meus, e então abaixou-se. E se Silvana tivesse conhecido Mencia Épicus, Sinfrônio não teria tido nem casamento.

— Anarriê!

Voltávamos à posição inicial.

— Olha o passeio na cidade.

Braços dados.

— Voa borboleta!

Soltei a mão de Mencia, para segurar o garoto da frente. E então, outro. E outro.

Passei por garotos altos, baixos, gordos, malhados, magros, pretos, brancos, pardos. Os pares das garotas. Mas não o meu. Nenhum deles.

Pela última vez o marcador ordenou a troca.

E eu finalmente estava de volta aonde queria. Ao meu par. A ela.

— Olha o caminho da roça!

Andamos seguindo a grande roda.

— A ponte quebrou!

Trocamos a direção.

— É mentira.

De volta a direção inicial.

— Olha o pai da noiva!

Os cavalheiros se escondiam atrás das damas. Eu olhei para Mencia. E nós duas caímos na risada.

— Preparar para o túnel.

Meus dedos tocando os dela, formando uma cabaninha.

Os casais à nossa esquerda iam se enfiando pouco a pouco dentro do túnel, até chegar a nossa vez.

Sou suspeita pra falar, porque penso que a beleza de certas coisas se esconde no interior delas. E é por isso que a visão de dentro, de eu e Mencia Épicus correndo de mãos dadas debaixo do túnel de pessoas, cabem todos que são como nós. Os que precisam soltar as mãos no fim. E os que não. Pietros, Carolas, Mencias e Evas. Todos. E essa é a beleza de tudo.

A beleza em Mencia Épicus dançando colada em mim. Nas juras em versos roucos. Na imprudência das fungadas no pescoço.

A beleza do arrastar dos pés na companhia de Luiz Gonzaga.

Sáfico | Cartas de AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora