— Olha o passeio na cidade! — O marcador anunciava. A música típica de São João marcando presença no fundo.
Os numerosos casais que participavam da quadrilha deram os braços.
— Preparar para o cumprimento — gritava o marcador. — Damas pra um lado, cavalheiros pro outro — ordenou.
E quando não tem cavalheiro?
Mencia deu uma risadinha, percebendo que eu fiquei parada, enquanto todos já se organizavam.
Ela andava de costas para um lado, apontando com a cabeça para eu ir para o oposto.
Ficamos uma de frente para a outra a uma distância de uns 10 passos. Mas parecia longe demais. Porque era Mencia Épicus olhando para mim. A uma distância de 10 passos.
— Dama cumprimenta cavalheiro! — Pedia o condutor da quadrilha.
De novo, e quando não tem cavalheiro?
As meninas se aproximavam da coluna em que Mencia e os garotos estavam. Mas eu fiquei ali, parada.
Ela gesticulou algo com as mãos, rindo.
— Cavalheiro cumprimenta dama!
Mencia Épicus se aproximava de mim. Com o galante, o sorriso e uma astúcia de dar inveja em Pavão, o Sedutor do Sertão.
Ela tirou o chapéu da cabeça com os olhos nos meus, e então abaixou-se. E se Silvana tivesse conhecido Mencia Épicus, Sinfrônio não teria tido nem casamento.
— Anarriê!
Voltávamos à posição inicial.
— Olha o passeio na cidade.
Braços dados.
— Voa borboleta!
Soltei a mão de Mencia, para segurar o garoto da frente. E então, outro. E outro.
Passei por garotos altos, baixos, gordos, malhados, magros, pretos, brancos, pardos. Os pares das garotas. Mas não o meu. Nenhum deles.
Pela última vez o marcador ordenou a troca.
E eu finalmente estava de volta aonde queria. Ao meu par. A ela.
— Olha o caminho da roça!
Andamos seguindo a grande roda.
— A ponte quebrou!
Trocamos a direção.
— É mentira.
De volta a direção inicial.
— Olha o pai da noiva!
Os cavalheiros se escondiam atrás das damas. Eu olhei para Mencia. E nós duas caímos na risada.
— Preparar para o túnel.
Meus dedos tocando os dela, formando uma cabaninha.
Os casais à nossa esquerda iam se enfiando pouco a pouco dentro do túnel, até chegar a nossa vez.
Sou suspeita pra falar, porque penso que a beleza de certas coisas se esconde no interior delas. E é por isso que a visão de dentro, de eu e Mencia Épicus correndo de mãos dadas debaixo do túnel de pessoas, cabem todos que são como nós. Os que precisam soltar as mãos no fim. E os que não. Pietros, Carolas, Mencias e Evas. Todos. E essa é a beleza de tudo.
A beleza em Mencia Épicus dançando colada em mim. Nas juras em versos roucos. Na imprudência das fungadas no pescoço.
A beleza do arrastar dos pés na companhia de Luiz Gonzaga.
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Sáfico | Cartas de Amor
RomanceEva Sades vive em plena monotonia na cidade de Vicência - o lugar onde nada acontece. Até que, para sua supresa, após décadas longe de Vicência, o circo Épicus decide retornar a cidade, agitando todos os moradores, que cresceram aos contos dos espe...