15 - A casa verde limão

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Mencia parou a bike no pátio repleto de trailers e kombis. As crianças corriam entre as tendas instaladas, quase levando junto os panos secando nas cordas dos varais e os circenses que por elas passavam. 

Parecia uma grande família, conversando entre risadas e puxões de orelhas nos mais novos, que em um minuto se penduravam ou derrubavam algo. Eu sei que eu odeio circos, mas essa parte era... bonita. Bem bonita. 

Mas ainda mais bonito que tudo isso, era o motorhome azul petróleo de Mencia Épicus. Sério, muito irado! Ela tem um lugar só pra ela.

E confesso que embora eu estivesse extremamente curiosa para adentrar o mundo de Mencia, eu recusei o convite para entrar.

Só de pensar em estar em um lugar onde tudo é dela, cheira a ela e já passou pelas mãos dela, me fazia recuar (e muito). Por isso, achei mais prudente (e seguro) esperar na porta com a bicicleta no passeio.

Hoje meu pobre coração já tinha resistido a muitas emoções, e essa seria uma das quais eu não sei se conseguiria lidar.

"Entrar na casa de Mencia Épicus é mais difícil que o diretor te obrigando a acusar um dos seus amigos amanhã?" Talvez.

Mas só porque eu já tinha em mente como resolveria essa situação.

— Tá preparada? — Mencia perguntou, assim que surgiu na porta do motorhome.

Ela tirou a camisa suada e a apoiou em cima do ombro antes de se sentar na escada.

— Sim — respondi, fingindo costume em ver aquelas clavículas marcadas. A linha no meio do abdome que ia até a costura do top. O osso do quadril saltado.

— Senta aqui — pediu, chegando um pouco pro lado para dar espaço para mim na escada de metal, que ligava o chão até a porta do veículo.

Ela colocou a caixa de papelão com a vitrola sobre minha coxa. E eu não resisti o impulso imediato de abri-la.

— Ei. — Mencia segurava minha mão. — Você não vai me dar nada como agradecimento, não? — perguntou ela.

— Claro, quanto você quer? — indaguei já abrindo minha bolsa para pegar uns trocados perdidos.

— Não tô falando disso, né? — Ela deu um toque na minha cabeça, como se tivesse certificando se eu realmente tinha um cérebro.

— Ah, desculpa. — Dei um sorriso sem graça. — O você quer, então?

— Uma resposta, né?

— Resposta?

— Sim, por que que você foi embora no meio do espetáculo no sábado? Por que você não apareceu no bar? E qual é entre você e Carola?! — A garota parecia um fuzil me acertando com um turbilhão de perguntas.

— Eu que te pergunto, qual é entre você e Carola? — perguntei em um tom talvez meio ácido.

— Do que você tá falando?

— Ué, não era você que estava beijando ela?

Mencia ficou uns bons segundos me encarando. O vento soprava forte contra os cachos dela, que mesmo assim continuavam perfeitos. Que saco! Por que tudo tem que ser tão perfeito sobre ela? Quer dizer, menos o fato dela ter ficado com Carola. Isso não tem nada de perfeito.

— Eva, você está com ciúmes?

Olha, em qualquer outra ocasião eu com certeza xingaria esse ataque de tosses que eu tive. Mas nesta, em específico, pelo menos me rendeu um tempo pra pensar no que eu iria falar.

Sáfico | Cartas de AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora